Nº 2603 - Dezembro de 2018
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Crónica Bibliográfica da publicação

“General Loureiro dos Santos: Biografia

O que tem de ser tem muita força”

Luísa Meireles – Temas e Debates Editora

 

Começo esta recensão com as palavras com que pensava terminar, ou seja, dando os parabéns à Luísa Meireles pela publicação desta excelente obra, que apresenta ao grande público a vida de um grande Homem. O seu tributo ao General Loureiro dos Santos é oportuno, é merecido, é sentido e é muito valioso.

Luísa Meireles escreveu com alma e sentimento esta biografia e daí a vida do General Loureiro dos Santos se ter entrosado tão bem com a história recente de Portugal, numa obra simultaneamente literária e histórica. De uma linguagem simples e com um estilo personalizado, apoia-se em entrevistas com amigos e camaradas do General Loureiro dos Santos, sem deixar de fazer uma rigorosa pesquisa e investigação, traduzida ao longo do texto, mas também nas notas finais de cada capítulo, muitas delas com dados inéditos e particularmente valiosos.

Este livro, editado pela Temas e Debates e Circulo de Leitores, constitui uma leitura da história recente de Portugal, centrada na vida e no percurso de um dos seus protagonistas mais notáveis. Efetivamente, o General Loureiro dos Santos tem um percurso de vida ímpar, desde a entrada na Escola do Exército (1953 – curso do General Ramalho Eanes e do General Espírito Santo, entre outros ilustres Camaradas), em que se destaca a comissão em Angola, a descolonização de Cabo Verde, a participação no processo do 25 de Novembro, o desempenho das funções de ministro da Defesa Nacional e, mais tarde, de Chefe do Estado-Maior do Exército (CEME), altura em que se demitiu por uma questão de consciência e em defesa do que entendia serem os direitos e os interesses dos seus subordinados.

O livro de 441 páginas, que teve o patrocínio do Exército Português e da Câmara Municipal de Sabrosa, começa com um “Prefácio”, escrito com o coração, na pena do General António Ramalho Eanes. Honra, Sacrifício, Nobreza de Espírito, Humildade Intelectual e Integridade Moral são atributos que associa ao seu “irmão de escolha”, que caracteriza como um renovador reformista. Ramalho Eanes cita inclusivamente o Professor Marcelo Rebelo de Sousa, que em 1979 se referiu ao General Loureiro dos Santos como “um dos Homens mais cultos e determinados das Forças Armadas Portuguesas”.

Segue-se a “Nota” da Luísa Meireles, que agradece em especial à Luísa Amaral, que colaborou na pesquisa e investigação, resume em poucas palavras a sua admiração pelo biografado: “levei muito mais tempo do que queria a escrever esta história de um homem que, fui percebendo, esteve sempre à frente do seu tempo”.

A obra inclui ainda quinze capítulos, que traduzem a vida e obra do General Loureiro dos Santos. Curiosamente, o primeiro capítulo começa em maio de 1992, nos dias quentes que anteciparam a demissão do então CEME, causada por um problema de consciência decorrente da aprovação da conhecida Lei dos Coronéis, depois de muitas batalhas e combates ao longo de meses, para proteger o valor da justiça nacional, os seus camaradas de armas e a instituição Exército.

Razão: «dever de fazer».

Motivo oficial: «de ordem pessoal».

Luísa Meireles passa depois a relatar, em jeito de romance, a vida do jovem Zeca ou Zé Alberto, nascido e 28 de agosto de 1936 e registado a 2 de setembro pelo pai (a data oficial registada pelo Cabo Santos para não pagar multa). O excelente aluno Zé Alberto viria a estudar na cidade do Porto, onde vivia com os tios, próximo da rotunda da Boavista. Como refere Luísa Meireles “acabou por concluir o liceu, em 1953, com a média de 18, a mais elevada nesse ano em todo o País, o que lhe valeu um diploma e um prémio pecuniário”. Entrou depois na Escola do Exército, onde demonstrou “características de inteligência, memória, vontade e ambição” e se tornou no primeiro Espada de Toledo (prémio para o primeiro classificado da então Escola do Exército e, desde 1959, da atual Academia Militar). Após a entrada do alferes Loureiro dos Santos no quadro permanente, Luísa demonstra muito bem como a mulher e os filhos convivem com uma vida militar intensa no período da guerra colonial, desde o Comandante da Bataria AA N.º 386 em Angola, ao Chefe do Estado-Maior do Comando da Zona Militar de Cabo Verde, local onde se encontrava aquando do 25 de Abril de 1974. O período que se seguiu é demasiado intenso, da radicalização à política dura, onde emergem as características sólidas de um teórico visionário e de um senhor ministro, tudo contado com muito rigor e sustentado por várias entrevistas, que justificam uma leitura cuidada onde se podem encontrar alguns contributos importantes para a história deste período complexo da História de Portugal.

Luísa Meireles descreve depois, com muito sentimento, a demissão de CEME, mas também o período de nojo e depois o de professor, comentador e escritor, curiosamente a altura em que o General Loureiro dos Santos ficou mais conhecido dos portugueses em geral. É um período difícil, tanto em termos pessoais (em termos de saúde), como familiares (do marido, do pai e do avô), mas que a Luísa descreve com especial sensibilidade.

O livro inclui ainda, um “Posfácio” da autoria do Coronel Rodrigo Sousa e Castro (que trata o General Loureiro dos Santos como um dos mais notáveis militares da geração da década de 50), vários apêndices (como a importante ata da reunião do Conselho Superior de Defesa Nacional, de 18 de maio de 1992), uma biografia extensa e um útil índice onomástico.

Não esperam certamente que conte mais sobre o livro, pois agora é a vossa vez de o lerem e de aprenderem com o General Loureiro dos Santos, através da pena da Luísa Meireles, que nos confessa inclusivamente um dos lemas de vida do biografado: “O que aprendi é para passar aos outros”. Para os que pretendam continuar a acompanhar ou a homenagear o General Loureiro dos Santos, aconselho uma visita ao “Espaço Vida e Obra General Loureiro dos Santos”, ao qual o próprio doou o seu valioso espólio, de índole bibliográfica, militar e pessoal. Tal como refere Luísa Meireles, o General Loureiro dos Santos foi o grande impulsionador da criação do CEISDTAD – Centro de Estudos e Investigação de Segurança e Defesa de Trás-os-Montes e Alto Douro, que tem a sua sede também na Vila de Sabrosa, junto do referido espaço.

Entretanto falecido a 17 de novembro de 2018, e já depois de escritas estas palavras (para a apresentação do livro da Luísa Meireles, na cidade do Porto, a 21 de setembro e na presença do General Ramalho Eanes, que também usou da palavra), o General Loureiro dos Santos foi acompanhado até à última morada pelos camaradas, pelos amigos, pela família, por Sabrosa e também por Luísa Meireles. Fui um dos que teve o privilégio de trabalhar e de aprender com o General Loureiro dos Santos, e de o acompanhar nos últimos momentos, com honras militares e sobretudo com muita tristeza, e já com uma grande saudade.

Apesar da partida, o General Loureiro dos Santos continua a constituir um estandarte ético e um exemplo de excelência como militar e académico.

Apesar da partida, e como podemos constatar facilmente através da leitura do livro da Luísa Meireles, o General Loureiro dos Santos está e estará sempre connosco, pois deixou obra valorosa e sempre atual.

Por todas estas razões e enquanto comandante da Academia Militar, sugeri a leitura deste livro a todos os que servem nesta grande casa e em especial aos meus alunos, futuros oficiais do Exército e da GNR, pois a vida e obra do General Loureiro dos Santos constitui um exemplo e um incentivo de bem servir Portugal e os Portugueses.

Termino como iniciei esta recensão, reiterando os meus sinceros parabéns à Luísa Meireles por esta magnifica obra e aconselhando a sua leitura a todos os portugueses em geral e aos militares em particular. Luísa Meireles fez jus à vida e obra do General Loureiro dos Santos, pois “o que tem de ser tem muita força”.

 

Major-general João Vieira Borges

Sócio Efetivo e Vogal Efetivo da Direção da Revista Militar

 

A Revista Militar felicita a editora e a autora e agradece a oferta do exemplar da obra para o seu acervo.

Major-general
João Jorge Botelho Vieira Borges
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