Nº 2679 - Abril de 2025
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
O legado médico-histórico do Professor Universitário e Tenente-Coronel Médico Maximiano de Lemos
Professora Doutora
Amélia Ricon-Ferraz
Tenente-coronel
Rui Pires de Carvalho

Introdução*

Maximiano Augusto de Oliveira Lemos Júnior (1860-1923) foi um dos mais distintos diretores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP). Notabilizou-se nos estudos sobre a História da Medicina Portuguesa, tendo sido o primeiro professor catedrático de História da Medicina em Portugal. A qualidade, a dimensão e as repercussões nacionais e internacionais dos seus escritos explicam a decisão do fundador do Museu de História da Medicina desta Faculdade, seu sucessor na cátedra da disciplina, o Professor Luís de Pina Guimarães (1901-1972), de o nomear patrono desta instituição.

A 21 de fevereiro de 1923, a oito meses do seu falecimento, já numa fase difícil da doença que o viria a vitimar, a Faculdade de Medicina, na Sala Nobre, presta-lhe em vida, uma sentida homenagem, perante “uma assembleia grande e selectíssima, em que tomaram parte o Governo, todas as Universidades e Institutos scientíficos do país, a Academia, o corpo clínico portuense civil e militar, a Imprensa, as corporações e individualidades mais representativas na Arte, na Sciência e nas Letras, além da família, amigos e admiradores”1 (figura 1). O Diretor da Faculdade, o Professor João Lopes Martins Júnior (1866-1945), em representação do Ministro da Instrução, fez notar que “a Faculdade de Medicina ao promover a consagração dos altos merecimentos do seu ilustre antecessor preenchia um duplo objectivo: demonstrava, por um lado, o seu carinho e elevado apreço pelo homem eminente que tão notavelmente se revelou no estudo e cultura da história médica portuguesa; e por outro lado, apresentava à mocidade académica, pondo em foco a vida infatigável do erudito e probo trabalhador intelectual, um exemplo e um modelo digno de ser imitado pelas gerações vindouras”2. O Professor Ricardo de Almeida Jorge, enquanto orador convidado, recordou os tempos de juventude deste seu amigo e colega no magistério: “É singular como os temperamentos evoluem e a que mutações estão sujeitos. Quem diria que deste estudante folgasão e do colaborador da Folha Nova havia de pojar um historiador grave, austero e mesurado?!”3. Ricardo Jorge não podia estar ausente neste evento como assim o expressou: “De longe me anunciei como participante da celebração; era-me grato assistir a esta apoteose do companheiro e amigo de quási quarenta e cinco anos, sempre em comunhão sagrada de ideias e sentimentos; como que me julgava parte obrigada e indefectível, porque esta homenagem se reflectia do seio de Maximiano Lemos sobre o meu, como se seu irmão fôra, seu irmão verdadeiro em coração e espírito. Era-me grato ver o ente que admiro e adoro, saudado e vitoriado, como sumo prémio duma carreira em que o talento se associou à modéstia, o culto do trabalho ao da verdade, e o homem todo à virtude e à bondade”4. Dois anos mais tarde, em 1925, a cidade de Peso da Régua viu a sua toponímia enriquecida com o nome de Maximiano Lemos.

Figura 1 – Rosto da obra “Homenagem da Faculdade de Medicina do Porto ao Prof. Maximiano de Lemos” (1923).

Proveniência: Arquivo Particular

 

Por ocasião do centenário do seu nascimento, a sua terra natal prestou-lhe uma sentida homenagem (3-12-1960). O Professor Luís de Pina discursou sobre “Maximiano Lemos, na sua época literária e histórica”5. Foi inaugurada a “Biblioteca de Maximiano Lemos” na sede dos Bombeiros Voluntários do Peso da Régua, onde o amigo Professor Alberto Saavedra (1895-1979) lhe prestou uma sentida homenagem como o testemunha nesta passagem: “Absorvido em seu labor, assíduo freguês das bibliotecas, dos arquivos, folheando, sondando, sem pausa, velhos livros, velhos papéis, vencendo mil estorvos, mil canseiras, Maximiano faz-me lembrar o cavador do Douro, a lidar, sem parança, à chuva, ao vento, ao frio, ao sol: – ferrenho, obstinado, sonhador, enamorado da terra e escravo da terra…”6. Paralelamente, foi erigido um busto na cerca do Hospital D. Luiz I.

Na Faculdade de Medicina do Porto, oito dias mais tarde, uma comissão constituída pelos Professores Hernâni Monteiro (1891-1963), Fernando Magano (1905-1969) e Luís de Pina (1901-1972) organiza o I Colóquio de História da Medicina Prof. Maximiano Lemos (11 e 12-12-1960) que assinala a reinstalação e abertura do Museu de História da Medicina “Maximiano Lemos” nas novas instalações da sua Faculdade, sob a égide da Universidade do Porto e do Instituto de Alta Cultura7. Pouco depois (20-12-1960), o Professor Hernâni Monteiro proferiu uma conferência em sua homenagem no Hospital de Santo António.

Decorrido quase meio século (22-11-2008) desde estas iniciativas, a Câmara Municipal de Peso da Régua decide relembrar o Homem e a época em que viveu e associa-se nesta homenagem ao Museu de História da Medicina “Maximiano Lemos” da FMUP, sob as coordenações da Dra. Maria José Lacerda, Vereadora do Pelouro da Cultura, Ação Social e Saúde, e a coautora deste artigo, para a realização de vários eventos: o Colóquio “A Régua no tempo de Maximiano de Lemos”; a inauguração da exposição sob a nossa curadoria “A Medicina no tempo de Maximiano de Lemos”; a visita à Biblioteca Maximiano de Lemos no Quartel dos Bombeiros Municipais do Peso da Régua; e o lançamento de um selo comemorativo8 (figura 2).

Pelo centenário do falecimento de Maximiano Lemos, a Sociedade Portuguesa dos Escritores e Artistas Médicos promoveu uma evocação a Maximiano Lemos (21 a 28 de outubro de 2023), celebrando a sua vida e obra, na sede do Conselho Nacional da Ordem dos Médicos em Lisboa, com a organização de um colóquio, que contou com a nossa presença e da Doutoranda em Medicina na FMUP, no domínio da História da Medicina, Mariana Nascimento, e de uma exposição de importantes escritos do homenageado. Desta iniciativa surgiu o desiderato de publicar um artigo que, pela primeira vez, enquadrasse o menos conhecido percurso médico-militar na brilhante carreira académica de Maximiano de Lemos.

Figura 2 – Selo comemorativo do centenário do nascimento de Maximiano Lemos. Bilhete Postal com carimbo de 1.º dia de circulação – Edição da Câmara Municipal de Peso da Régua e CTT (22-11-2008).

Proveniência: Arquivo Particular

 

II – Primeiros Anos e Curso da Escola Médico-Cirúrgica do Porto

Maximiano nascido na freguesia de S. Faustino do Peso da Régua, no Concelho do Peso da Régua, a 8 de agosto de 1860, filho de Maximiano Augusto de Oliveira Lemos e de D. Guilhermina Pereira de Matos Oliveira, foi batizado, a 15 de setembro, com o nome do pai, acrescido do apelido Júnior.

Ingressou no curso médico-cirúrgico da Escola Médico-Cirúrgica do Porto em 1876, no tempo do diretor Manuel Maria da Costa Leite (1813-1896), que concluiu aos 21 anos com aprovado plenamente em todas as cadeiras, exceto na primeira, e com aprovação plena com louvor no “Acto Grande” a 16 de julho de 1881, sob a presidência do Professor Moraes Caldas (1846-1914) e secretariado pelo Professor Ricardo Jorge, formado na mesma Escola dois anos antes e seu docente desde há um ano. Durante o curso foi agraciado com Distinção nas cadeiras de Matéria Médica, Patologia Geral, Patologia Interna, Clínica Médica e Clínica Cirúrgica e Accessit nas restantes9. Defendeu a Dissertação Inaugural “A Medicina em Portugal (Tentativa Histórica)” (1881), “(…) Levado pelo enthusiasmo que tem pelas glorias da sua pátria a aquilatar o mérito d’aquelles que no ramo de conhecimentos a que se dedica se tornaram notáveis no seu paiz, consagrou horas que lhe sobravam de outras ocupações urgentes ao estudo dos médicos e da medicina em Portugal. (…) não quis mais do que apreciar o modo como esta sciencia foi cultivada entre nós, quaes as suas tendências, quaes as condições que presidiram ao seu desenvolvimento ou á sua decadência, (…) encontrar-se-hão mencionados e estudados os escriptos de médicos que não são da nossa nacionalidade (…) que influenciaram nos destinos da medicina pátria poderosa e profundamente”10 (figura 3). Maximiano Lemos estava decidido a valorizar os estudos médico-históricos nacionais. Após a conclusão do curso, exerceu clínica no Posto Médico-Cirúrgico na Rua das Oliveirinhas no Porto. No ano seguinte concorreu a uma vaga de Lente Substituto da seção de Filosofia da Academia Politécnica, mas não prestou provas, e concorreu a um lugar de Ajudante de Cirurgia em 18 de outubro de 1882.

Figura 3 – Rosto da Dissertação Inaugural “A Medicina em Portugal (Tentativa Histórica)” (1881).

Proveniência: Arquivo Particular

 

III – Candidatura e primeiros anos da Carreira Médico-Militar

Para a candidatura a uma vaga de Cirurgião Ajudante do Exército, teve de apresentar diversa documentação conservada no Arquivo Histórico Militar (AHM). Além das expectáveis Certidão de Batismo e de Certidão de Formatura na Escola Médico-Cirúrgica (1881), apresentou a Certidão de Recenseamento Militar e de Sorteio (procedimento popularmente designado e eternizado por “Sortes”) e as curiosas (para a realidade atual) Certidões de Bom Comportamento Moral e Cívico e de Bom Comportamento Moral e Religioso. Apresentou, ainda, Certidões de Exames de Disciplinas (1877) que frequentou na Escola Polythecnica do Porto (“preparatórios”): Mineralogia, Geologia, Metalurgia, Arte de Mina, Agricultura e Veterinária.

Inspecionado, no âmbito do concurso para Facultativo Militar, no Hospital Militar Permanente do Porto, a 13 de janeiro de 1883, é considerado “prompto pª todo o serviço medico-militar”11. O Boletim da Inspeção Sanitária foi enviado, no próprio dia, pelo Diretor do Hospital ao Cirurgião em Chefe do Exército, que homologa o parecer da Junta (sem data).

Interessante é a apreciação do documento, com origem no Ministério da Guerra, de 16 de janeiro, que lista o posicionamento dos 3 candidatos que “satisfizeram os requisitos”12... Maximiano Lemos é o primeiro classificado, seguindo-se José Augusto Domingues de Araújo e Rafael Sousa Tavares, por esta ordem, todos da Escola Médico-Cirúrgica do Porto – com anotações, na margem, das Unidades de Colocação, cabendo a Maximiano o Regimento de Cavalaria n.º 3 (RC3). Contudo, sendo claro, pelo enunciado, que o concurso era para três vagas, verifica-se um aditamento (a lápis) de um quarto candidato, José Alexandrino Craveiro Feio, este oriundo da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa. Em Despacho de 1 de março de 1883, Sua Majestade nomeia para cirurgiões ajudantes os quatro elementos supramencionados.

Admitido no Quadro por Decreto de 4 de março de 1883, apresentou-se no Quartel-General do Porto a 9 de março, destinado a Cavalaria n.º 3 (onde é oficialmente colocado pela Ordem do Exército n.º 4, de 5 de março de 1883), sendo-lhe concedidos 10 dias de licença para se fardar.

Já em Estremoz, requer, a 12 de junho desse ano, licença para contrair matrimónio com D. Guilhermina da Costa Amorim. Só sobre esta questão encontram-se, além do requerimento, três informações e ofícios. Destacamos, pela curiosidade, a informação prestada pelo seu Comandante: “Posto que não tenha conhecimento da Senhora com que o supplicante pretende casar, é de crer (…) que tenha os requisitos necessários”13. Devemos registar que, sabendo que efetivamente se casou (8 de agosto de 1883), em diversas informações anuais, que se conservam no processo individual, a informação é omissa ou contraditória (menção de solteiro em algumas, como a de março de 1885).

A 28 de julho de 1885 é colocado em Caçadores n.º 9, no Porto. Por ter verificado uma inexatidão no seu nome (indevidamente mencionado como Maximiliano) na Ordem do Exército n.º 9, relativamente à sua colocação, solicita a devida retificação. A 2 de junho de 1886, pede licença para concorrer a vaga de Demonstrador da Escola Médico-Cirúrgica do Porto e é autorizado pelo Ministro da Guerra. No processo individual encontram-se as informações anuais de 1886, 1887 e 1888, sempre com avaliação positiva do seu desempenho. Neste último ano, surge uma situação que claramente transtornaria as suas pretensões na Escola Médico-Cirúrgica: em julho de 1888, fica doente o Cirurgião Mor da Praça de Peniche, Pitta Simões. Transitoriamente, de acordo com os Regulamentos, é requisitado o médico do partido, mas é solicitada a colocação de um cirurgião militar pelo Governador Militar da Praça. Numa primeira fase é destacado o Cirurgião de Caçadores n.º 6. Mas acaba por ser nomeado… A 9 de Julho, no entanto, o Ministério da Guerra é informado que Pitta Simões teve alta do hospital, estando pronto para todo o serviço. Neste contexto, a 10 de julho é enviado um telegrama anulando a ordem de marcha. Ainda este ano, a 27 de outubro, mantendo-se colocado em Caçadores n.º 9, mas apresentado na Carreira de Tiro de Esmoriz, solicita uma licença de 30 dias para tratar de assuntos de família assim que terminasse a diligência.

A 7 de Dezembro de 1888 é proposta a sua colocação como Cirurgião Mor do Regimento de Infantaria n.º 12, por morte do Cirurgião Mor daquele Regimento, Francisco Maria de Barros e Vasconcelos da Cruz Sobral, por ser o mais antigo da sua classe. Contudo, por despacho de 12 do mesmo mês e ano é promovido a Cirurgião Mor do Regimento de Infantaria n.º 24 (na altura em Pinhel).

 

IV – Concurso à Escola Médico-Cirúrgica do Porto e Transição de Quadro

Promovido pela Ordem do Exército n.º 32 de 22 de dezembro de 1888, em janeiro de 1889, é autorizado, pelo Ministro da Guerra, por Despacho de 4 desse mês14, a ficar demorado no Porto, por um período de 20 dias, para concorrer ao lugar de lente da Escola Médico-Cirúrgica do Porto (Lente Substituto da Secção Médica), ficando a auxiliar no serviço do Hospital Permanente do Porto. Esta licença foi prolongada até 28 de março, de acordo com a anterior autorização do Ministro da Guerra. Neste contexto, defendeu a Dissertação de Concurso intitulada “O problema da imunidade da tuberculose” (15-02-1889)15, e apresentou as lições (22-02-1889 e 01-03-1889) e provas práticas de Matéria Médica e de Clínica. A 9 de abril de 1889, Maximiano Lemos declara ao Cirurgião em Chefe do Exército que aceita a nomeação, por Decreto de 4 de abril, publicada em Diário de Governo nº 79 de 8 do mesmo mês, para o lugar de Lente Substituto da Secção Médica da Escola Médico-Cirúrgica do Porto. A 24 de abril de 1889, o “Paço”, nessa sequência, determina, em Ofício ao Ministro da Guerra, que Maximiano Augusto de Oliveira Lemos Júnior “(…) não seja contado no quadro da respectiva classe nos termos do artigo cento e setenta do decreto com força de lei de trinta d'outubro de mil oitocentos e oitenta e quatro, por ter sido nomeado por decreto de quatro do corrente mez, procedendo concurso, para o logar de lente substituto da secção medica da escola medico cirúrgica do Porto. (…)”16.

Neste contexto, toma posse da sua nova colocação a 1 de maio. Em outubro, no início do novo ano, proferiu a Oração de Sapientia intitulada “O humorismo antigo e o humorismo moderno”17 tendo apresentado a biografia do Professor da Escola e Cirurgião António Bernardino de Almeida (1813-1888), em seu entender, um benemérito da História da Medicina nacional. Maximiano Lemos ascendeu a Lente Proprietário de Medicina Legal (Decreto de 9 de março de 1895), sendo somente colocado nesta cadeira a 31 de maio de 1900 e na direção da Morgue do Porto. Neste contexto fez várias publicações na sequência de “Medicina Legal entre nós no século XVIII” (1883), como a “Nota sobre a Morgue da 2ª circumscripção medico-legal” (1901), a “2.ª nota sobre a Morgue da 2ª circumscripção medico-legal” (1902), que se seguirão mais tarde o “O Suicídio no Porto” (1907) e o “Programma da 11ª cadeira (Medicina Legal) – Lições e exercícios práticos” (1909). Paralelamente, por decisão do Conselho Escolar, assumiu a regência de Patologia Geral, Semiologia e História da Medicina (1895-1900).

Em 1904, de acordo com o Decreto da Organização do Exército, publicado na Ordem do Exército n.º 9, 1.ª Série, de 11 de setembro de 1899, em que os facultativos militares deixaram de ser nomeados pelas antigas designações18 e passaram a referidos pelos postos em que são graduados19, Maximiano é referido como Capitão (graduação correspondente ao posto de Cirurgião Mor). Nesse ano, a 12 de dezembro, Maximiano, nos termos do artigo 196º do Decreto de 7 de setembro de 1899, faz a sua Declaração de Opção pelo Serviço da Escola Médico-Cirúrgica do Porto, encaminhada, por ofício do Ministério do Reino para o da Guerra, a 23 de dezembro. Da análise do processo individual fica claro que a Direção Geral da Instrução Pública enviava regularmente avaliações para o Ministério da Guerra (que são em tidas em conta para efeitos de promoção). A título de curiosidade, nas informações de 1904 e 1907 é mencionado novamente, por lapso, como solteiro…

Figura 4 – Maximiano Augusto de Oliveira Lemos Júnior.

Fonte: Hemeroteca Digital – “O Ocidente: revista ilustrada de Portugal e do estrangeiro”, n.º 1019 (20ABR1907).

 

Maximiano é graduado em Major Médico por Decreto de 24 de dezembro de 1904 (Ordem do Exército n.º 32, 2.ª Série, de 31 de dezembro), com antiguidade de 7 de dezembro, sendo passada Carta Patente a 4 de janeiro de 1905 (figura 5). Em 1909, é agraciado com o Grau de Cavaleiro da Ordem Militar de S. Bento de Avis (Ordem do Exército n.º 15, 2.ª Série, de 10 de julho de 1909. Finalmente, é Tenente-Coronel Médico Graduado com antiguidade desde 8 de junho de 1911, por Decreto de 29 desse mês (Ordem do Exército n.º 15, 2.ª Série, 30 junho de 1911).

Em agosto de 1911, Maximiano solicita a sua apresentação à Junta Militar de Saúde, para “mudança de situação”, como consta em Ofício do Ministério do Interior para o Ministério da Guerra a 15 de agosto desse ano. Para o mesmo efeito apresentou atestado do Dr. António Teixeira Lopes Júnior, de 9 de agosto, que declara ser Maximiano portador otite média “esclerosa” à direita e otite média crónica supurada à esquerda, da qual resultava “surdez incurável e de tal modo acentuada que absolutamente o impossibilita de exercer os seus cargos”20, enviado posteriormente com outro ofício. Autorizado a ser presente a uma Junta Hospitalar de Inspecção da 3.ª Divisão Militar por Ofício da Secretaria de Estado dos Negócios da Guerra de 23 de agosto de 1911, sendo-lhe concedida licença de 60 dias até essa ocasião. Apreciado a 4 de setembro, a Junta do Hospital Militar do Porto pronunciou-se com “Incapaz do Serviço Activo” por “surdêz biauricular”21.

Figura 5 – Carta Patente de 4 de janeiro de 1905: Major Médico Graduado.

Fonte: Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05 (Cortesia do AHM)

 

Foi colocado no Quadro de Reserva em 21 de novembro de 1911 (Ordem do Exército n.º 216, 2.ª Série). A 2 de dezembro deste ano ofereceu em sua casa um jantar copioso aos seus “Amigos da Faculdade de Medicina do Porto”. Passou à situação de jubilado e afastado do ensino por um período de cinco anos. Identificado o engano, dado não existir qualquer processo de jubilação, regressou à Faculdade 5 anos depois. Mesmo na situação de Reserva teve que pedir licença para se ausentar do País para ir visitar Bibliotecas no estrangeiro, como foi o caso de Salamanca em abril de 1912, e só prestou curiosamente, Juramento de Fidelidade “à Pátria e às leis da República” apenas em 1 de outubro de 1912 (figura 6).

Figura 6 – Juramento de Fidelidade, a 1 de outubro de 1912.

Fonte: Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05 (Cortesia do AHM)

 

Em 1916 assumiu a regência da cadeira de História e Filosofia Médicas e Ética Profissional até 1923; de 1918 a 1922, a direção da Faculdade (Decretos de 25 de maio de 1918 e 30 de junho de 1922); e, em 1921, as funções de Vice-Reitor da Universidade do Porto (Decreto de 29 de outubro de 1921). Em 1920, o Ministro da Instrução reconduziu-o no seu lugar de Professor Ordinário22.

No seu processo individual, surge uma nota solta, aparentemente com o cálculo de pensão, referenciando ter falecido a “6-10-1919”23 e mencionando a Ordem do Exército n.º 5, 2.ª Série, de 1924. Trata-se claramente de um erro grosseiro (ver em baixo), já que o próprio solicita uma “Nova liquidação do tempo de Serviço”, a 5 de novembro de 1920, ao abrigo de nova legislação (Lei n.º 1039, de 28 de agosto de 1920). Nessa altura vencia de soldo 80.646 reis, sendo 53.765 reis pelo Ministério do Interior e 26.875 pelo Ministério da Guerra. Desta nova apreciação acaba por ficar com o soldo de 126.000 reis, como se vê pela Fig.7, devidamente publicado na Ordem do Exército n.º 21, 2.ª Série, de 15 de dezembro desse ano.

Figura 7 – Cálculo do Soldo para a reserva em 1920, ao abrigo de nova legislação, ficando a receber 27 mil reis pelo Ministério da Guerra e 99 mil pelo Ministério do Interior, num total de 126 mil reis.

Fonte: Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05 (Cortesia do AHM)

 

V – Últimos tempos

Maximiano faleceu, de facto, a 6 de outubro de 1923, como consta da troca de correspondência entre o Ministério da Guerra e o Comando da 3.ª Divisão do Exército, entre janeiro e fevereiro de 1924, desencadeada pela comunicação da sua viúva, e na Ordem do Exército n.º 5, 2.ª Série, de 21 de março de 1924. Temos a informação que o óbito ocorreu na sua casa, na antiga Avenida Marechal Carmona, em Vila Nova de Gaia, na sequência de uma neoplasia oral que condicionou, nos últimos tempos, toda a comunicação verbal. O Professor J. A. Pires de Lima (1877-1952), responsável pela edição da obra póstuma “História do Ensino Médico no Porto” (1925), de autoria de Maximiano Lemos, na apresentação desta monografia transcreveu algumas notas manuscritas de correspondência mútua que claramente demonstram a consciência da brevidade do fim por Maximiano Lemos: “Isto está a acabar, o trabalho e o autor”.

No seu processo nada consta sobre possível prole, tipo de registo que, do antecedente, era relativamente comum.

O último documento data de 12 de junho de 1926, em nota interna do Ministério da Guerra, acompanhando o seu Processo Individual, enviado para o Arquivista da 2.ª Direção Geral do mesmo.

 

Figura 8 – Caricatura do Professor Maximiano de Lemos (à esquerda), de 1907, da autoria do seu aluno Dr. José Alvaro Moreira de Carvalho, avô do coautor deste artigo, por sua vez caricaturado pelo seu amigo e colega Jaime Cortesão, em 1906.

Proveniência: Arquivo Particular

 

Epílogo – Obras e Primeiras homenagens

Por ocasião do centenário da Real Escola de Cirurgia do Porto (1925), dois anos após o falecimento de Maximiano Lemos, a Faculdade de Medicina editou vinte monografias, na maioria sobre a história dos serviços da Faculdade. A “História do Ensino Médico no Porto”24, obra póstuma de Maximiano Lemos, já citada, antecedeu todas as publicações comemorativas por decisão do então diretor da Faculdade, Alfredo de Magalhães (1870-1957). Contou com a colaboração do Dr. Alberto Saavedra (1895-1979) que, em outubro de 1923, no mês do falecimento de Maximiano Lemos, publicara no periódico A Medicina Moderna o trabalho “O Professor Maximiano Lemos. Inventário Bibliográfico”25. Este autor justifica-se desta forma: “Empenhei-me na tarefa. Ao nobilíssimo historiador da Medicina portuguesa prende-me além de rendido apreço intelectual, uma efusiva gratidão, pois eu tive a fortuna de receber, na minha alma sensível, os eflúvios da sua alma santa”26 e, em conclusão, “se Maximiano Lemos ergueu uma obra monumental, em louvor e honra da sua Pátria, edificou obra maior e mais bela, espalhando, às mãos fartas, os tesoiros do seu coração generoso. Aquele é, na sua vida, um episódio; esta, – rumo ansiosa de sua alma pura – toca o céu: «A gloria do homem bom é o testemunho da boa consciência»”27. Do seu Legado médico-histórico enumerou 134 títulos. Na apresentação da “História do Ensino Médico no Porto”, Maximiano Lemos fala da natureza da formação cirúrgica que antecedeu a criação das Reais Escolas de Cirurgia do Porto e Lisboa, os fatores determinantes da criação das Escolas, os privilégios concedidos à Escola de Lisboa, a organização do ensino, a primeira cerimónia de abertura das aulas, a instabilidade decorrente da situação política nacional até à reforma dos estudos de 1836, por Manuel da Silva Passos (1801-1862). De Vicente José de Carvalho (1792-1851) a António Plácido da Costa (1848-1915) totalizou quarenta e seis biografias dos professores da Escola Médica do Porto, onde a par da carreira académica e do contributo prestado à Escola figuram exemplos de intervenção social, aos mais diferentes níveis, e um resumo dos seus trabalhos científicos e literários. Inspirado nos retratos a óleo destes professores e numa litografia da época, Abel de Lima Salazar (1883-1946) reproduziu, em desenho, os seus retratos. Nesta obra basilar para o conhecimento da história da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, desde as suas antecessoras, ao saber médico-histórico aliou-se um trabalho de grandeza artística inestimável. Muitas das investigações aí organizadas figuraram em trabalhos parcelares editados anteriormente pelo autor em periódicos e monografias (figura 9).

Figura 9 – Rosto da obra “O Ensino Médico no Porto” (1925), monografia póstuma de Maximiano Lemos. Desenho de autoria de Alberto Sousa.

Proveniência: Arquivo Particular

 

Mas quando surgiu na vida de Maximiano Lemos o interesse pela História da Medicina pátria? No dizer do professor Alfredo de Magalhães: “o prof. Maximiano Lemos não encontrou, pode-se dizer, nada feito”28 e “ (…) Aquela mesma altivez interior e independência de alma, conjugadas a uma adorável modéstia, traduzindo um equilíbrio raríssimo de faculdades intelectuais e morais, permitiu-lhe transpor um largo periodo de prodigioso labor literário e scientifico, não se deixando corromper pelo scepticismo deliquescente que nos oprime, para realizar integralmente uma obra de erudição histórica, que é um monumento erguido à sciência portuguesa, e à perpetuidade do seu nome”29. Outro sentir era o de Maximiano Lemos, que o expressou pela primeira vez, em 1881, na apresentação da sua Dissertação Inaugural, que traduz a sua integridade científica e a sua modéstia: “Todo o individuo que trabalha na conquista de um dado científico recebe das gerações que o precederam elementos que o habilitam para a resolução d’esse problema. Não é o próprio esforço unicamente que vence as dificuldades que se lhe apresentam, mas coadjuvado pela força accumulada de todos os indivíduos que antecedentemente trabalhavam no mesmo fim. (…) Todo aquelle que assim não procede (…). Esquecendo-se de que não pertence a si próprio mas á comunidade de quem recebeu e de quem recebe materiaes para a sua obra, esse individuo esterilisa-se completamente para os outros, lembrando o guerreiro antigo que tendo-se munido de um arsenal completo, succumbe sob o peso da sua armadura sem ao menos fazer uso d’ella”30.

Maximiano Lemos foi redator dos Arquivos de História da Medicina Portuguesa (1886-1889; 1894-1896; 1910-1923), da Gazeta dos Hospitaes do Porto e da Gazeta Medica do Porto. Enquanto sócio efetivo e presidente da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Porto e sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa, da Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa, da Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais, entre as principais a nível nacional, e da Sociedade de Medicina e Cirurgia da Baía, da Sociedade Alemã de História da Medicina e da Sociedade das Ciências Naturais de Leipzig, entre as internacionais, participou de forma ativa nas iniciativas científicas então desenvolvidas31. Nos seus escritos perpetuou as memórias da Real Academia de Cirurgia do Porto (1886) e da Sociedade de Medicina e Cirurgia do Porto (1898), bem como lembrou as sociedades científicas no Porto no século XVIII (1898). Na apresentação do programa da primeira série dos Arquivos, em 1887, expressa a sua vontade de valorizar os estudos médico-históricos nacionais: “Acarretar os materiaes para uma história completa da medicina nacional, quer pela publicação de novos documentos quer pela coordenação de outros dispersos por varias obras de difícil consulta, sobretudo para aquelles que vivem longe dos centros intelectuais do paiz, é a tarefa que cumprirá religiosamente este periódico”32. Colaborou com outros periódicos como a Medicina Contemporanea, o Portugal Medico, a Medicina Moderna, o Porto Medico, o Coimbra Medica, a Revista de Guimarães, a Revista Scientifica, a Revista de Medicina da Sociedade de Instrução do Porto, a Revista de Medicina e Cirurgia do Hospital da Misericórdia do Porto, a Revista da Universidade de Coimbra, o Arquivo Histórico Português, a Revista de História da Sociedade Portuguesa de Estudos Históricos, os Anais Scientíficos da Faculdade de Medicina do Pôrto, o Arquivo Medico, o Arquivo de Medicina Legal, entre os principais.

Em qualquer documento literário ou histórico procurava de forma infatigável e constante referências à História da Medicina nacional. As suas pesquisas remontam ao tempo da instauração da monarquia portuguesa e abrangem todos os períodos até 1923, data do seu falecimento.

Do século XIII fala-nos, após uma contextualização da Medicina em Portugal nesse século, das cruzadas, “que tiveram, como é sabido, uma profunda influencia no desenvolvimento commercial dos povos e ainda na reforma de algumas instituições politicas, não exerceram essa mesma acção benefica sobre a medicina. É, essa, pelo menos, a opinião dos auctores: depois veremos se na história da medicina portuguesa acha confirmação ou descredito”33. Esta era a escrita de Maximiano Lemos: acessível a todos os leitores e organizada nos conteúdos, apesar da densidade das informações e da vastidão das referências bibliográficas reunidas no texto ou apensas a cada página dos seus trabalhos. Introduzia alguns veios condutores sob a forma de questões ou afirmações a que pronto dava resposta. Não descurava um trabalho de síntese nas conclusões. Sobre o tema das cruzadas encontramos essas questões e a condensação dos temas: “Exercida por Ecclesiasticos, ensinada pelo clero, que feição tomou a medicina n’esta época? que doutrinas predominaram no ensino?”34 ou, então, “Antes de prosseguirmos e mostrarmos qual a influencia que as cruzadas exerceram na medicina portugueza cultivada só pelo clero, necessario é dar um resumo ligeiro da maneira como entre os arabes, e nomeadamente os do Ocidente, foi cultivada a medicina”35.

É vasta a bibliografia médica do professor relativa ao século XVI. Em destaque, pelo número de publicações, reunimos os estudos sobre a vida e a obra de Amato Lusitano, João Rodrigues Castelo Branco (1511-1568?), um dos médicos portugueses de ascendência hebraica que mais se notabilizou neste século, autor das Centuriae (1551-1556-1557, etc.), do Index Dioscoridis (1536) e do In Dioscorides Anazarbei de medica materia (1553). Enquanto anatomista deu um contributo para a descoberta da grande circulação sanguínea com a identificação, pela primeira vez, das válvulas venosas e do sentido unidirecional da corrente sanguínea e, como clínico, foi um observador cuidado, como o comprovam as setecentas histórias clínicas nas Centuriae sobre um conjunto de patologias do foro médico e cirúrgico. Conhecedor de botânica médica legou relevantes informações neste domínio. Em 1900, Maximiano Lemos lembra Amato e as válvulas venosas36; em 1904, Amato e o seu tempo37; em 1905, Amato em Salamanca38; em 1906, Amato em Ferrara39 para culminar em 1907, com a monografia sobre a sua vida e obra40. Os capítulos deste livro centralizaram-se nos sucessivos locais onde exerceu, tornando possível conhecer as características e as ofertas profissionais existentes em cada povoado, os portugueses aí residentes, os médicos locais, os doentes, os adversários, entre algumas das inúmeras informações. Parecia ter-se esgotado o tema! Contudo, em 1913, Maximiano Lemos publica “Amato Lusitano – Novas Investigações”41, que como documento é uma das provas da sua mais pura honestidade científica: “Julgávamos nós, em nossa ingénua vaidade, que ao trabalho devotado de investigação e crítica, havia correspondido uma realização aceitavel. Não se demorou muito a ilusão. Ao escrevermos o nosso livro, não conheciamos a excelente memória, que ao nosso compatriota havia consagrado o sr. Max Salomon nas páginas da Zeitschrift fur Klinische Medicin de 1900. Desde que a lemos, reconhecemos que o médico alemão estava, em muitos pontos, de acordo comnosco mas algumas divergencias se notavam, e em outras passagens se mostrava muito melhor informado que nós. Vieram depois algumas críticas benévolas, demasiado benévolas infelizmente, porque sem crítica consciente nenhum estímulo existe para o trabalho honesto, mas o nosso presado amigo Ricardo Jorge procurou avaliar a obra do biógrafo sem de leve sacrificar a amizade, visto que, apontando inexactidões por vezes flagrantes, o fez de modo que talvez só o autor do livro visse bem os pontos fracos do estudo que realizara. Impunha-se-nos um trabalho de revisão que adiámos até hoje, pesarosos de que o nosso amigo se não resolva a publicar o muito que analisou e investigou; se nos não apressássemos, já não teríamos tempo de redigir os resultados do exame retrospetivo de um volumoso processo. Aproveitamos o ensêjo para responder a outras ligeiras observações que nos foram feitas, mas antes queremos cumprir o gratíssimo dever de agradecer a todos, nacionais e estrangeiros, as palavras de louvor que nos dirigiram e que melhor que ninguem sabemos o favor que representam”42. O artigo é um encadeado de datas consignadas por si e apontadas pelo médico alemão Max Salomon sobre as estadias e as viagens de Amato. É toda uma formação histórica nacional e internacional que nos evidencia e que se reveste do maior significado e saber. No dizer de Ricardo Jorge, o texto de Max Salomon é “mais parco em citações de minudências e mais reduzido no volume, menos compendioso nas coisas judiográficas assim como nas peninsulares, do que o livro de Maximiano Lemos”43.

Na leitura das fontes documentais encontrava com frequência divergências de informações, que de imediato procurava averiguar e indagar sobre a veracidade dos factos. Foi o que aconteceu com os artigos sobre João Fragoso. Em posse de informações recolhidas a partir de documentos existentes na Torre do Tombo pôde afirmar: “Resumindo, julgamos provado que não era português; havia estudado cirurgia em Sevilha e Medicina em Alcalá; não acompanhou a imperatriz Isabel, mulher de Carlos V; não assistiu à doença do príncipe D. Carlos e não ocupou um papel importante no seu tratamento”44.

Maximiano Lemos percorreu os textos literários que mais se identificavam com a nacionalidade portuguesa. No Cancioneiro de Garcia de Rezende identifica os médicos e cirurgiões dos reinados de D. João II (1455-1495) e D. Manuel I (1469-1521), as doutrinas médicas arábicas reinantes, os conhecimentos sobre anatomia, fisiologia, patologia geral, as doenças, a higiene, a alimentação, a terapêutica e a cirurgia. Descobre nestes documentos a primeira notícia sobre a sífilis em Portugal45. Analisou a obra de Gil Vicente (1465-1536) enquanto naturalista, como o fez com Luís Vaz de Camões (falecido em 1580) e fixou-se no Auto dos Físicos que dedicou a Carolina Michaelis de Vasconcelos (1851-1925)46.

Na sequência do trabalho monumental que constituiu a monografia sobre Amato Lusitano, Maximiano Lemos preparou outra, a vida e obra de Zacuto Lusitano (1575-1642). Dedica este trabalho “ao eminente Professor Dr. Max Neuburger da Universidade de Vienna d’Austria”47. Segue uma metodologia semelhante à obra precedente, acompanhando cronologicamente as suas deslocações e estadias e os factos mais relevantes para o conhecimento da medicina desse tempo e nessas paragens. Zacuto legou uma vasta obra médica – De medicorum principum historia (1629), Praxis historiarum (1642); De praxi medica admiranda (1634) – que reúne todo um saber greco-árabe, com conhecimentos novos sobre a América, em particular o Brasil, um código de deontologia médica, um tratado breve de Anatomia e a mais antiga tentativa nacional de organização de uma história sobre a Medicina. Tal era a sua erudição que foi convidado a prefaciar inúmeras obras no tempo. Neste século, outro tema do interesse de Maximiano Lemos foi a cirurgia portuguesa, em particular a figura do cirurgião António da Cruz (falecido a 1626)48, na busca incessante de factos que demonstrassem a originalidade das suas descrições clínicas em resposta a comentários depreciativos de certos bibliógrafos (figura 10).

Figura 10 – Reprodução em azulejo dos desenhos de instrumentos cirúrgicos existentes na “Recopilaçam de Cirurgia” de António da Cruz. Foram produzidos por Isilda Fernandes, por solicitação da coautora, por ocasião do 60.º Aniversário do Museu de História da Medicina “Maximiano Lemos” da FMUP (1993).

Proveniência: Arquivo Particular

 

Sobre esses médicos portugueses de ascendência hebraica que, mesmo no estrangeiro, foram a glória da medicina portuguesa Maximiano Lemos lembra um pensamento de Ricardo Jorge: “Era um sinal dos tempos; aqueles intelectuais da Renascença andavam numa roda viva, aprendendo e ensinando pelos quatro cantos da Europa num cosmolitismo festejado que mostra acima de tudo o culto imponente e universal da inteligencia”49.

No século XVIII, Maximiano Lemos recorda a vida e a obra de Jacob de Castro Sarmento (1691-1762?) e de António Nunes Ribeiro Sanches (1699-1782). O primeiro era partidário das doutrinas de Francis Bacon (1561-1626), adepto da Iatrofísica, promotor do medicamento à base da quina, a Água de Inglaterra, e da inoculação antivariólica50. Ribeiro Sanches foi um dos mais notáveis médicos deste século. Discípulo dileto de Hermann Boerhaave (1668-1738) na Universidade de Leiden, foi médico da Imperatriz da Rússia e dos seus exércitos (1731-1743), membro das mais destacadas sociedades científicas da Europa, naturalista, pedagogo, um insigne clínico, higienista e sifilígrafo. Foi o principal mentor da reforma dos estudos universitários em Portugal. Por solicitação do governo, Ribeiro Sanches apresentou, no Methodo para aprender e estudar a Medicina (1763), as bases em que a reforma havia de ser executada e cujos pontos capitais no dizer de Maximiano Lemos eram: “o maior desenvolvimento dado ao estudo das ciências acessórias; a feição prática do ensino pela criação de hospitais, de laboratórios e de jardins botânicos; a introdução do sistema de Boerhaave; e por último, como acabamos de dizer, o reconhecimento de que a Medicina e a Cirurgia, tão distanciadas pelos estudos que reclamavam e pelas leis que proibiam aos médicos o exercício da cirurgia e reciprocamente, deviam ser estudadas e exercidas conjuntamente”51. Parafraseando Ribeiro Sanches “Que todos os Medicos deviaõ aprender a Chirurgia Practica na Universidade; e sabella taõbem que a practicassem; da tal modo, que se extinguisse esta classe de homens com nome de Chirurgioens”52 Outras obras lhe são conhecidas: Tratado da conservação da saúde dos povos (1756); Cartas sobre a educação da mocidade (1760), Dissertations sur l’origine de la maladie vénérienne (1750). Multiplicam-se os artigos de Maximiano Lemos sobre Ribeiro Sanches, preparatórios e complementares da monografia (1911)53,54 (figura 11). Ainda neste século, Maximiano de Lemos privilegia a génese dos primeiros jornais médicos e das sociedades médicas em Portugal. Recém-licenciado, em 1882, apresentava na Revista Scientifica um trabalho exaustivo sobre o jornalismo médico em Portugal que dedicou ao professor Augusto Henrique de Almeida Brandão (1846-1935)55. Organizou o tema em cinco capítulos: Introdução ao Jornalismo; Medicina em Portugal no século XVIII; Manuel Gomes de Lima; o jornalismo científico no século XVIII; o Jornalismo médico em Portugal e o Jornal das Sciencias Medicas de Lisboa / Jornal da Sociedade das Sciencias Médicas. A Manuel Gomes de Lima Bezerra (1727-1806) dedicou um capítulo. Foi médico e cirurgião no Porto e o criador das primeiras sociedades médicas e jornais de Medicina em Portugal. O primeiro periódico médico, o Zodiaco Medico Delphico, foi impresso em janeiro de 1749. Quanto à Real Academia de Cirurgia do Porto, Maximiano Lemos dá-nos notícia da sua primeira sessão, presidida pelo cirurgião-mor do reino, António Soares Brandão, a 9 de junho de 1760. Em posse do discurso de Gomes de Lima “Oração inaugural para abrir a conferencia, ponderando a felicidade do reino e da academia, no governo de Sua Magestade” transcreve uma parte por lhe parecer relevante: “Logo de principio assevera que Deus, depois de crear o homem, o entregou aos cirurgiões para velarem pela sua conservação, visto como são os substitutos da divindade. Isto é bem de ver porque eles «abatendo as cataratas dão instantaneamente vista aos cegos, evacuando o peito com a operação do empyema fazem fallar os mudos, reduzindo as deslocações das pernas e dos pés, fazem marchar os aleijados»”56.

Figura 11 – Rosto da obra “Ribeiro Sanches – A sua vida e a sua obra” (1911).

Proveniência: Arquivo Particular

 

Como redator e colaborador de diferentes periódicos do tempo a história do jornalismo médico era inevitável. Muito cedo, no âmbito da História da Medicina, se mostrou atento e crítico em relação a notícias ou artigos sobre esta matéria, evidenciando um domínio do tema e segurança nas suas argumentações. No Coimbra Medica, um bibliógrafo conceituado apresentava os nomes de alguns médicos portugueses que foram professores em Universidades estrangeiras. Maximiano Lemos identificou dois erros e divulgou-os por escrito. É gratificante ler a conclusão do artigo de Maximiano Lemos nos seus vinte e dois anos de idade: “Em conclusão nem um nem outro é portuguez… Não nos doamos por isso. A medicina portugueza não carece de brilho emprestado para augmentar o seu esplendor. Quem possuiu na medicina um Valesco de Tharanta, um João Rodrigues de Castello-Branco, um Abrahão Zacuto, etc. cirurgiões como Francisco do Amaral, Manuel Constancio, Antonio d’Almeida e tantos outros, não têm muito que invejar aos outros paizes, para lhes querer usurpar as suas glórias”57. Nesse mesmo ano, a redação do periódico Coimbra Medica, no tema Bibliografia, divulgava: “O sr. Maximiano Lemos Júnior, um erudito medico portuense, enviou-nos a nota immediata de documentos para a história da cirurgia em Portugal (…)”58. Muitos outros exemplos lhe sucederam visando despertar a atenção e facilitar o estudo dos leitores sobre a medicina pátria. Para além destas preocupações de divulgação médico-histórica, colaborou com alguns jornais médicos na apresentação dos principais casos clínicos do seu tempo, publicados em revistas de Medicina.

Nos últimos anos da sua vida dedicou-se à história da Escola Médica do Porto e dos seus primeiros professores. Gostava de realçar factos que evidenciassem a qualidade do ensino ministrado, a nobreza e a generosidade do seu corpo docente e a sua relevância clínica e social. José de Andrade Gramaxo (1826-1921), José Carlos Lopes (1838-1903), João Monteiro de Meira (1881-1913), Roberto Belarmino do Rosário Frias (1853-1918), José Dias de Almeida (1854-1919), Joaquim Guilherme Gomes Coelho (1839-1871), de pseudónimo Júlio Dinis, foram alguns dos professores seus contemporâneos que, pela nobreza de carácter, pela qualidade de serviços prestados à escola e ao país e pela afetividade desenvolvida no seio do convívio escolar, foram lembrados e homenageados aquando das suas jubilações ou da despedida terrena. Maximiano Lemos, no tempo de diretor da Faculdade de Medicina, proferiu o discurso fúnebre do Professor Gramaxo, professor catedrático sucessivamente de Fisiologia e Patologia Interna, tendo afirmado: “(…) se a poucos, a muitos poucos, é dado ombrear comtigo como professor; se a raros, muito raros, é lícito exercer a clínica como a exerceste, em todos deixaste um exemplo, que nos esforçaremos em seguir, de altruísmo e dedicação.”59. José Carlos Lopes foi o professor, o erudito e o literato. Regeu primeiro Patologia Interna, a Fisiologia e, por último, a Matéria Médica. João Monteiro de Meira nasceu no ano em que Maximiano Lemos defendeu a sua dissertação inaugural em 1881. Este viria a concluir o curso médico em 1907 e, no ano imediato, era nomeado lente substituto da secção cirúrgica. Com a reforma dos estudos médicos diz-nos Maximiano Lemos: “competia-lhe ser nomeado professor ordinário do novo regime. Não o foi, e agora não será fácil, como nunca o veremos professor de historia que tão distinto deveria ser”60. Em carta dirigida ao Professor Pires de Lima, que preferiu enviar por intermédio do periódico a enviá-la pelo correio, confessa: “O desaparecimento do Meira do nosso meio é uma falta muito sensível. Não é a amizade que sempre tive por ele que me dita estas palavras: é a justiça extreme”61. A Pedro Dias prestou uma homenagem em vida, onde lembrou o mestre, o colega e o amigo. Sobre o seu mérito pessoal Maximiano Lemos escreve “Bastará lembrar que, filho da Universidade de Coimbra onde então os estudos cirúrgicos estavam descurados, pode dizer-se com inteira verdade que se fez a si próprio”62, regendo com brio a cadeira de Operações durante trinta anos. À história da cirurgia e das guerras liberais e à numismática dedicou uma atenção especial. Sobre o Professor Roberto Frias conta-nos que o conhecera durante o primeiro ano do curso. Estava Roberto Frias no segundo ano. Enaltece as suas qualidades de trabalho e lembra o ter granjeado os primeiros prémios em Clínica Médica e Clínica Cirúrgica. Relembramos uma passagem em que Maximiano Lemos descreve as suas aulas de Anatomia e de Fisiologia, sendo regentes os professores Dias Lebre (1829-1900) e Carlos Lopes respetivamente: “A aula de anatomia era um daqueles logares de suplicio que só o genio do mal poderia ter inventado para tormento dos estudantes, e custa-nos escrever que os resultados que se colhiam de tão fatigante e assiduo aprendizado não estavam em relação com o esforço dispendido. Eram então exercicio quasi quotidiano umas repetições a que em linguagem academica se chamava fogo preso e consistiam em perguntar ao aluno quaes os musculos, nervos e vasos que passavam em qualquer região. Dotado de uma memoria prodigiosa, era este o ensejo de manifestar a vastidão dos seus conhecimentos anatomicos. Nunca falhavam e o Frias ainda depois de professor se lembraria dos tempos do Lebre quando nos exames de anatomia, depois de ouvir de um estudante a enumeração dos ramos arteriais e venosos da região formulava o seu terrivel: Que mais? que incutia verdadeiro terror. Mas a aula em que ficavam aquilatados para todo o sempre os meritos de um estudante era a de fisiologia, onde se não trabalhava menos, mas onde se apreciavam mais as qualidades de inteligencia e critica. O chorado José Carlos conhecia bem a emulação que havia entre os seus discipulos mais aplicados e fomentava-a. Recordo-me de ter assistido a uma sabatina em que argumentaram Júlio de Matos e Roberto Frias; o professor não pôde eximir-se a manifestar a admiração que lhe causara a enorme leitura deste ultimo, o que o não impediu de valorizar mais o primeiro”63. Dias de Almeida foi professor ordinário da 6.a classe – Medicina. Estudou a Pediatria em França e criou no Hospital da Misericórdia do Porto uma sala específica para crianças até aí inexistente. Foi director clínico deste hospital e promotor da Aliança Académica, da União Médica e da Sociedade de Medicina e Cirurgia, onde conviveu com Maximiano Lemos. Este acompanhou-o em algumas das suas visitas clínicas e dessas incursões lembrava-se que “era comovente o espetaculo das creanças que ao vê-lo retirar-se lhe dirigiam as suas saudações. (…) Antes da Guerra, era não menos de ver o aspecto da sua enfermaria por ocasião das festas do ano. Á sua custa e dos seus amigos, havia uma distribuição de brinquedos que as crianças apreciavam como era de crer e que eram mais um laço que as prendia ao director da enfermaria”64.

Em 1922, edita a monografia “Gomes Coelho e os Médicos” onde apresenta a vida deste professor da Escola Médica, conhecido no meio literário por Júlio Dinis, vítima de tuberculose pulmonar. A riqueza de pormenores sobre o seu estado de saúde, as viagens que se viu necessitado de efetuar (Ovar e Ilha da Madeira), os médicos com quem conviveu, escutou ou foi objeto de orientação clínica e os professores da Escola Médico-Cirúrgica seus contemporâneos “que estimava e o estimavam como se fossem todos membros de uma família”65, fazem da obra um documento precioso pelo testemunho clínico que nos lega no contexto da medicina oitocentista. Maximiano Lemos transcreve parte de uma carta que Gomes Coelho dirigiu a um primo sobre uma consulta médica do Dr. António Luz Pitta (1802-1870), Diretor da Escola Médico-Cirúrgica do Funchal: “Eu vou vivendo. Estes últimos dias um pouco encatarrado, graças a um exame que me quis fazer o Dr. Pitta e que me obrigou a estar despido alguns quartos de hora. Esta medicina é uma coisa tão doentia! Afinal disse o mesmo que os outros: Pomadas, fricções, óleo e inverno na Madeira”66.

Maximiano Lemos publicou outros trabalhos sobre a história da Escola Médica do Porto e sobre alguns dos primeiros professores desta instituição, muitos reunidos na monografia “História do Ensino Médico no Porto”, já citada.

Nos escritos de Maximiano Lemos encontramos imensas referências aos estudos estatísticos, demográficos e epidemiológicos de Ricardo Jorge. Maximiano Lemos discursa na Sociedade de Medicina e Cirurgia sobre “A obra scientifica de Ricardo Jorge” (1905), onde apresenta as quatro modalidades da sua actividade como neurologista, pedagogo, hidrologista e higienista. Aí afirma “que é uma existência bem preenchida a d’este homem que apenas pelo seu esforço se elevou a um dos logares mais preeminentes a que um médico possa aspirar e que não procurou n’elle nem commodidades nem satisfacção de ambições, mas apenas o ensejo de servir honradamente o seu paiz e a sciencia”67.

Toda a investigação de Maximiano Lemos se centraliza na História da Medicina Portuguesa embora sempre faça uma contextualização internacional, evidenciando conhecimentos profundos neste domínio. Paralelemente aos temas tratados anteriormente específicos de cada período da História houve outros transversais sobre a História da Medicina nacional.

Alguns dos trabalhos foram estudos preparatórios de “História do Ensino Médico no Porto” (1925) e da obra magistral “História da Medicina em Portugal. Doutrinas e Instituições” (1899)68 (figura 12). Esta obra é uma referência incontornável da especialidade a nível nacional. Por iniciativa do Museu e da Ordem dos Médicos, em 1991, foi possível a sua reedição. Coube à coautora a organização dos índices onomástico, ideográfico e sistemático até aí inexistentes.

Figura 12 – Rosto da obra “História da Medicina em Portugal. Doutrinas e Instituições” (1899).

Proveniência: Arquivo Particular

 

Ainda sobre o século XIX e primórdios do seguinte, investigou sobre a vida e obra de escritores tais como Gomes Coelho, já citado; Almeida Garrett; Alexandre Herculano (1810-1877); e Camilo Castelo Branco (1825-1890) (Arquivos, 1915-1921; Monografia, 1922). A figura do Dr. João Semana das Pupilas do Senhor Reitor lembrava a Maximiano Lemos um cirurgião da sua terra natal, José Rodrigues Barbosa, que o assistira, era ainda estudante de Medicina, numa situação de um distúrbio digestivo. Em 1914, dedica-lhe um artigo na Vida Médica e Scientifica, onde expressa “Lembro-me hoje, mais de quarenta anos depois de ter merecido a estima de um dos mais nobres caracteres que me foi dado a conhecer”69. Estava ainda na sua lembrança a visita guiada pelo Dr. Barbosa ao seu hospital: “(…) convidou-me a visitar na sua companhia o modestíssimo hospital que pessoas caritativas haviam fundando na minha terra e para o qual ele oferecera gratuitamente os seus serviços; á visita seguir-se-ia um almoço que me oferecia em sua casa. O hospital tinha apenas 4 leitos e um deles era ocupado por um ferido num pé, em que se manifestara gangrena. O curativo era trabalhoso e não é possível que a mulher mais terna e compassível tenha dedos mais leves e delicados do que os seus. A voz, nas poucas palavras que dirigiu ao ferido, tinha caricias maternais. Era um sacerdote no exercicio do mais augusto ministerio. Terminada a visita mostrou-me o arsenal cirurgico e a livraria, que também eram donativo seu. Nem um nem outra eram de grande valia, mas êle não dera mais porque o não tinha e áquela obra dera o seu coração que era oiro”70.

Maximiano Lemos dirigiu a impressão e coordenou a edição da Encyclopedia Portugueza Illustrada, de 11 volumes, obra de referência no país e no estrangeiro.

Quantos adjetivos e afirmações Maximiano Lemos utilizou nos seus escritos para definir certas personalidades nacionais que bem se aplicam a si e ao seu trabalho? Quando nos fala de exatidão, independência, honestidade, meticulosidade, imparcialidade, eloquência e excelência da crítica rapidamente identificamos estes adjetivos na sua obra histórica e literária e revemos a sua pessoa nas suas qualidades, nos seus compromissos e nos seus afetos.

Nas últimas palavras que dirigiu ao médico, insigne jornalista e homem das artes plásticas Sousa Viterbo (1843-1910), uma vez mais revemos a vida de Maximiano Lemos mas nos seus momentos derradeiros: “A sua actividade era febril e sobretudo nos ultimos mezes de vida dir-se-ia que, presentindo a morte proxima, queria aproveitar o pouco tempo que tinha deante de si para divulgar os documentos que trabalhosamente reunira. Justamente se póde dizer que morreu trabalhando”71.

Quando se impôs a Maximiano Lemos apresentar a obra científica do seu inestimável amigo Ricardo Jorge disse: “O que vão ouvir não passa da exposição da sua obra atravez dos seus proprios livros”72. Identifiquei-me com esta decisão de Maximiano Lemos e pareceu-me avisado seguir o seu conselho nesta tentativa de relembrar o seu legado médico-histórico.

Parafraseando o insigne médico e historiador da Medicina vienense Max Neuburger (1868-1955): “Os círculos médicos de Portugal teem obrigação de reconhecer os serviços que Maximiano Lemos prestou pela assiduidade nos seus trabalhos de investigação histórica, pois, como nenhum outro, foi ele que conseguiu renovar a antiga fama que a Lusitânia gozava nas coisas da medicina”73.

 

Referências de Fontes e Bibliografia

1. Homenagem da Faculdade de Medicina do Porto ao Prof. Maximiano de Lemos (1923). Porto: Tipografia Costa Carregal, pg. 7.

2. Faculdade de Medicina do Porto (1923). Homenagem da Faculdade de Medicina do Porto ao Prof. Maximiano de Lemos. Porto: Tipografia Costa Carregal, pgs. 8-9.

3. Faculdade de Medicina do Porto (1923). Homenagem da Faculdade de Medicina do Porto ao Prof. Maximiano de Lemos. Discurso do Prof. Ricardo Jorge. Porto: Tipografia Costa Carregal, pg. 55.

4. Faculdade de Medicina do Porto (1923). Homenagem da Faculdade de Medicina do Porto ao Prof. Maximiano de Lemos. Discurso do Prof. Ricardo Jorge. Porto: Tipografia Costa Carregal, pg. 50.

5. PINA, Luís de (1960). Maximiano Lemos na sua época literária e histórica. Arquivos de História da Medicina Portuguesa, 3.ª série, vol. I-IV, 1968-70.

6. SAAVEDRA, Alberto (1960). Maximiano Lemos (1860-1923). No primeiro centenário do seu nascimento. Porto: Araujo & Sobrinho, Sucrs., pg. 14.

7. Faculdade de Medicina do Porto (11-12 de dezembro de 1960). I Colóquio de História da Medicina Prof. Maximiano Lemos e «Mesa Redonda» para o estudo da linguagem médica. Regulamento do Colóquio. Porto.

8. RICON-FERRAZ, Amélia (22 de novembro a 30 de dezembro de 2008). Catálogo da Exposição “A Medicina no tempo de Maximiano de Lemos”. Biblioteca Municipal do Peso da Régua.

9. RICON-FERRAZ, Amélia (2013). A Real Escola de Cirurgia e a Escola Médico-Cirúrgica do Porto. Porto: UPORTO edições.

10. LEMOS, Maximiano (1881). A Medicina em Portugal (Tentativa Histórica). Dissertação Inaugural. Porto: Imprensa Commercial, pg. XIII-XV.

11. Arquivo Histórico Militar (AHM). Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05

12. Idem.

13. Idem.

14. Há 3 Despachos e Ofícios sobre o assunto, todos com disparidades na data da respectiva emissão (22 de dezembro de 1888, 4 de janeiro de 1888, 4 de janeiro de 1889). A nossa interpretação segue a lógica de sucessão de factos. AHM, cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05.

15. LEMOS, Maximiano (1889). O problema da imunidade da tuberculose. Dissertação de Concurso (15-02-1889). Porto: Typ. de Arthur José de Sousa & Irmão.

16. Arquivo Histórico Militar (AHM). Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05.

17. LEMOS, Maximiano (1889). O humorismo antigo e o humorismo moderno. Oração Inaugural do ano letivo de 1889/90. A Medicina Contemporanea, vol. VII, pgs. 380-382, 385-387, 393-394.

18. Cirurgião Ajudante, Cirurgião Mor, Cirurgião de Brigada, Cirurgião de Divisão, Cirurgião-Chefe (N. do Coautor).

19. Seguidos da designação Médico (N. do Coautor).

20. Arquivo Histórico Militar (AHM). Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05.

21. Idem.

22. RICON-FERRAZ, Amélia (2013) – A Real Escola de Cirurgia e a Escola Médico-Cirúrgica do Porto. Porto: UPORTO edições.

23. Arquivo Histórico Militar (AHM). Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05.

24. LEMOS, Maximiano (1925). História do Ensino Médico no Porto. Porto: Typ a vapor da «Enciclopédia Portuguesa».

25. SAAVEDRA, Alberto (1923). O Professor Maximiano Lemos. Inventário Bibliográfico. A Medicina Moderna, n.º 379.

26. SAAVEDRA, Alberto (1923). O Professor Maximiano Lemos. Inventário Bibliográfico. A Medicina Moderna, n.º 379, pg. 11.

27. SAAVEDRA, Alberto (1923). O Professor Maximiano Lemos. Inventário Bibliográfico. Porto: A Medicina Moderna, n.º 379, pg. 18.

28. Faculdade de Medicina do Porto (1923). Homenagem da Faculdade de Medicina do Porto ao Prof. Maximiano de Lemos. Discurso do Prof. Alfredo de Magalhães. Porto: Tipografia Costa Carregal, pg. 23.

29. Ibidem, pg. 20.

30. LEMOS, Maximiano (1881). A Medicina em Portugal (Tentativa Histórica). Porto: Imprensa Commercial, pg XIII.

31. MONTEIRO, Hernâni (1925). História do Ensino Médico no Porto (Suplemento). Porto: tip. A vapor da «Encoclopedia Portuguesa», pg. 28.

32. LEMOS, Maximiano (1887). Introducção. Archivos de História da Medicina Portuguesa, Vol. I, pgs. 1-2.

33. LEMOS, Maximiano (1884). Medicina Portugueza: As Cruzadas. Medicina Contemporânea, vol. II, pgs. 156-157.

34. Ibidem, pg. 139.

35. Ibidem, pg. 139.

36. LEMOS, Maximiano (1900-1901). Amato Lusitano e as válvulas venosas das veias. Gazeta Médica do Porto, 4.º ano, pgs. 37-41.

37. LEMOS, Maximiano (1904). Amato Lusitano e o seu tempo. Porto: Typ. A vapor de Arthur José de Souza & Irmão.

38. LEMOS, Maximiano (1905). Amato Lusitano em Salamanca. Porto Medico, II ano, n.º 8, pgs. 242-253.

39. LEMOS, Maximiano (1906). Amato Lusitano em Ferrara. A Medicina Contemporânea, série II, tomo IX, ano XXIV, pgs. 294-296 e 299-301.

40. LEMOS, Maximiano (1907). Amato Lusitano. A sua vida e obra. Porto: Eduardo Tavares Martins.

41. LEMOS, Maximiano (1913). Amato Lusitano. Novas Investigações. Revista de História, 2.º vol.

42. Ibidem, pg. 25.

43. JORGE, Ricardo (1914). Introdução. Arquivos da História da Medicina Portuguesa, Nova série, 5.ºano, pg. 13.

44. LEMOS, Maximiano (1912). João Fragoso. Gazeta dos Hospitais do Porto, VI ano, pgs. 324-328.

45. LEMOS; Maximiano (1920-1921). A Medicina no «Cancioneiro de Garcia de Resende». Arquivos de História da Medicina Portuguesa, nova série, 11.º ano, pgs. 93-96, 113-128, 145-153, 161-176 e 12.º ano, pgs. 75-79.

46. LEMOS, Maximiano (1920). O «Auto dos Físicos» de Gil Vicente. Comentário Médico. A Medicina Contemporanea, Série II, tomo XXIII, ano XXXVIII, pgs. 345-348, 353-356, 385-390, 401-404.

47. LEMOS, Maximiano (1909). Zacuto Lusitano. A sua vida e a sua obra. Porto: Eduardo Tavares Martins, editor, pg. 5.

48. LEMOS, Maximiano (1886). A Cirurgia Portuguesa no século XVII. Archivos da Historia da Medicina Portuguesa, vol. 1, pgs. 3-9.

49. JORGE, Ricardo (1914). Introdução. Arquivos da História da Medicina Portuguesa, Nova série, 5.º ano, pgs 20-21.

50. LEMOS, Maximiano (1910). Jacob Castro Sarmento. Porto: Typ. da «Encyclopedia Portugueza Illustrada».

51. LEMOS, Maximiano (1991) – História da Medicina em Portugal. Doutrinas e Instituições. 2.ª edição. Vol. II. Lisboa: Publicações D. Quixote/ Ordem dos Médicos, pg. 188.

52. SANCHES, Ribeiro (1763). Metodo para aprender e estudar a Medicina. Paris, pg. 50.

53. LEMOS, Maximiano (1910, 1914). Amigos de Ribeiro Sanches. Archivo Historico Portuguez vol.VIII, pgs. 281-295, 447-469; vol. IX, pgs. 111-162.

54. LEMOS, Maximiano (1911, 1912, 1913). Cartas de Ribeiro Sanches ao Dr. Pacheco Valladares. Archivos de História da Medicina Portuguesa, Nova Série, 2.º ano, pgs. 111-120, 150-156, 193-196; 3.º ano, pgs. 28-30, 40-48, 75-80, 131-139; 4.º ano, pgs. 25-31, 57-62, 90-96, 119-128, 137-143.

55. LEMOS, Maximiano (1882). O Jornalismo médico em Portugal. Revista Scientifica, pgs. 191-197, 306-313, 405-412.

56. LEMOS, Maximiano (1886). A Real Academia de Cirurgia do Porto. Arquivos de História da Medicina Portugueza, Vol. I, pg. 19.

57. LEMOS, Maximiano (1882). Diogo da Silva e Pedro de Barros. Coimbra Médica, n.º 16, pg. 304.

58. LEMOS, Maximiano (1886). LEMOS, Maximiano (1882). Coimbra Médica, n.º 16, pg. 270.

59. LEMOS, Maximiano (1921). Necrologia. Prof. José de Andrade Gramaxo. A Medicina Moderna, n.º 327, pg. 25.

60. LEMOS, Maximiano (1913). João de Meira. Arquivos de História da Medicina Portuguesa, Nova série, 3.º ano, pgs. 153-160.

61. LEMOS, Maximiano (1913). João de Meira. Gazeta dos Hospitais do Porto, VII Ano, pg. 289.

62. LEMOS, Maximiano (1913). Dr. Pedro Augusto Dias. Arquivos de História da Medicina Portuguesa, Nova série, 6.º ano, pgs. 79-88.

63. LEMOS, Maximiano (1918). Prof. Roberto Frias. A Medicina Contemporanea, série II, tomo XX, ano XXXVI, n.º 8, pg. 137.

64. LEMOS, Maximiano (1919). José Dias de Almeida. Portugal Medico, 3ª. Série, ano 13.º, pg. 112.

65. LEMOS, Maximiano (1922). Gomes Coelho e os Médicos. Porto: Typ. a vapor da «Encyclopedia Portugueza», pg. 79.

66. LEMOS, Maximiano (1922). Gomes Coelho e os Médicos. Porto: Typ. a vapor da «Encyclopedia Portugueza», pgs. 72-73.

67. LEMOS, Maximiano (1905). A obra scientifica de Ricardo Jorge. Porto: Typographia a vapor de Arthur José de Souza & Irmão, pg. 51.

68. LEMOS, Maximiano (1899). História da Medicina em Portugal. Doutrinas e Instituições”. Lisboa: Manoel Gomes, Editor.

69 LEMOS, Maximiano (1914). José Rodrigues Barbosa. Notas sobre um cirurgião provinciano. Vida Médica e Scientifica, pg. 151.

70. LEMOS, Maximiano (1914). José Rodrigues Barbosa. Notas sobre um cirurgião provinciano. Vida Médica e Scientifica, pg. 149.

71. LEMOS, Maximiano (1911). Sousa Viterbo. Archivos da História da Medicina Portuguesa, Nova Série, 2.º ano, pg. 6.

72. LEMOS, Maximiano (1905). A obra scientifica de Ricardo Jorge. Porto: Typ. a vapor de Arthur José de Souza & Irmão, pg. 2.

73. Faculdade de Medicina do Porto (1923). Homenagem da Faculdade de Medicina do Porto ao Prof. Maximiano de Lemos. Porto: Tipografia Costa Carregal, pg. 21.

 

Fontes Adicionais

Arquivo Histórico Militar (AHM)

Livro n.º 17 – Livro de Matrícula do Pessoal do Regimento de Infantaria n.º 24, Registo dos Oficiais e Indivíduos com a graduação de Oficial, de 1884. Cotas: PT/AHM/G/LM/B-24/17/0162 + PT/AHM/G/LM/B-24/17.

Livro n.º 23 – Registo dos facultativos militares (1882-1900). Cotas: PT/AHM/G/LM/A-02/23/0004 + PT/AHM/G/LM/A-02/23.

Conjunto de registos órfãos Série 1: Cotas: PT/AHM/G/2287+ PT/AHM/G/ORFAOS.

Arquivo Pessoal

Annuário da Escola Medico-Cirurgica do Porto, 1908-1909. Porto: Typ. A vapor da «Encyclopedia Portugueza Illustrada»

Biblioteca do Exército (BiBEx)

Ordem do Exército n.º 20, de 31 de outubro de 1884.

Ordem do Exército n.º 9, de 11 de setembro de 1899.

Diário da República

Lei n.º 1039 de 28 de agosto de 1920, DR, 1.ª série n.º 167.

 

Figuras / Iconografia

1. Rosto da obra “Homenagem da Faculdade de Medicina do Porto ao Prof. Maximiano de Lemos” (1923). Proveniência: Arquivo Particular.

2. Figura 2 – Selo comemorativo do centenário do nascimento de Maximiano Lemos. Bilhete Postal com carimbo de 1.º dia de circulação – Edição da Câmara Municipal de Peso da Régua e CTT (22-11-2008). Proveniência: Arquivo Particular.

3. Rosto da Dissertação Inaugural “A Medicina em Portugal (Tentativa Histórica)” (1881). Proveniência: Arquivo Particular.

4. Maximiano Augusto de Oliveira Lemos Júnior. Fonte: Hemeroteca Digital – “O Ocidente: revista ilustrada de Portugal e do estrangeiro”, n.º 1019 (20ABR1907). Hemeroteca Digital – O Ocidente: revista ilustrada de Portugal e do estrangeiro (cm-lisboa.pt).

5. Carta Patente de 4 de janeiro de 1905: Major Médico Graduado. Fonte: Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05 (Cortesia do AHM).

6. Juramento de Fidelidade, a 1 de outubro de 1912. Fonte: Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05 (Cortesia do AHM).

7. Cálculo do Soldo para a reserva em 1920, ao abrigo de nova legislação, ficando a receber 27 mil reis pelo Ministério da Guerra e 99 mil pelo Ministério do Interior, num total de 126 mil reis. Fonte: Processo Individual. Cota: PT/AHM/DIV/3/7/2105/05 (Cortesia do AHM).

8. Caricatura do Professor Maximiano de Lemos (à esquerda), de 1907, da autoria do seu aluno Dr. José Alvaro Moreira de Carvalho, avô do co-autor deste artigo, por sua vez caricaturado pelo seu amigo e colega Jaime Cortesão, em 1906. Proveniência: Arquivo Particular. Ver também: Biblioteca Municipal do Porto. Biblioteca Pública Municipal do Porto (cm-porto.pt) (consultado em junho-julho de 2024).

9. Rosto da obra “O Ensino Médico no Porto” (1925), monografia póstuma de Maximiano Lemos. Desenho de autoria de Alberto Sousa. Proveniência: Arquivo Particular.

10. Reprodução em azulejo dos desenhos de instrumentos cirúrgicos existentes na “Recopilaçam de Cirurgia” de António da Cruz. Foram produzidos por Isilda Fernandes por solicitação da co-autora por ocasião do 60.º Aniversário do Museu de História da Medicina “Maximiano Lemos” da FMUP (1993). Proveniência: Arquivo Particular.

11. Rosto da obra “Ribeiro Sanches – A sua vida e a sua obra” (1911). Proveniência: Arquivo Particular.

12. Rosto da obra “História da Medicina em Portugal. Doutrinas e Instituições” (1899). Proveniência: Arquivo Particular.

 

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* O presente trabalho tem a sua génese em duas conferências proferidas a 21 de outubro de 2023, na sede do Conselho Nacional da Ordem dos Médicos, em Lisboa, no contexto de uma evocação do Centenário da Morte de Maximiano de Lemos, a convite da Sociedade Portuguesa dos Escritores e Artistas Médicos.

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Professora Doutora

Amélia Ricon-Ferraz

MD, PhD. Centro de Bioética da FMUP, CITCEM da FLUP. Delegada Nacional e Conselheira para a SIHM.

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Tenente-coronel

Rui Pires de Carvalho

MD PhD. Reformado (Exército). Presidente da Secção de História de Medicina da Sociedade de Geografia de Lisboa. Sócio efetivo da Revista Militar.

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by COM Armando Dias Correia