
Comandantes-Gerais das Guardas em Portugal 1801-2023
Major-general João Vieira Borges e
Tenente-coronel GNR António Cardoso
Esta obra de Memória e Simbolismo, representa um tributo a mais de dois séculos de história e serviço dedicados à pátria, daqueles que, ao longo desse tempo, tiveram a honra de liderar a Guarda. Esta obra é também um tributo ao Exército português, graças a uma forte ligação histórica à GNR, através dos seus militares, em particular dos seus Comandantes. Por isso me sinto particularmente honrado pelo facto de fazer parte desse leque de antigos Comandantes-Gerais oriundos do Exército e de ter feito a ponte para os Comandantes-Gerais oriundos da GNR.
O desafio da publicação desta obra foi-me colocado por S.Exa. o Presidente da República, Dr. Marcelo Rebelo de Sousa, por ocasião da minha apresentação de cumprimentos, após ter tomado posse como Comandante-Geral da GNR.
Ao analisar as possíveis modalidades de acção quanto a quem poderia abraçar este projecto em tão pouco tempo, ocorreu-me imediatamente o Major-general João Vieira Borges, amigo, camarada de curso, com vasta experiência neste domínio e presidente da Comissão Portuguesa de História Militar. O facto de ter sido Comandante da Academia Militar e, naturalmente, uma forte ligação aos alunos da GNR, foi um fator muito relevante na minha decisão. Em janeiro de 2023, o Major-General João Vieira Borges aceitou o desafio e solicitou então o apoio do Tenente-Coronel António Cardoso, Diretor da Direcção de História e Cultura da Guarda (DHCG). Após as reuniões de coordenação iniciais afastei-me do projeto por ter terminado, a 1 de setembro de 2023, as minhas funções, pelo que, estou assim mais isento para fazer esta apresentação da obra.
Vamos então ao livro, que não é apenas uma colectânea de nomes, datas e cargos. É um reflexo do compromisso inabalável de 66 Oficiais do Exército, que, ao longo das gerações, colocaram todo o seu saber, coragem, dedicação e patriotismo ao serviço dos cidadãos. São Oficiais cuja liderança moldou não apenas a Guarda Nacional Republicana, mas em alguns casos, também a história de Portugal, ao longo de um período que abrange tanto momentos de paz como de turbulência.
Ao longo de dois séculos, os Comandantes-Gerais desempenharam um papel fundamental na preservação da ordem pública, sempre como força do regime e também na defesa dos valores democráticos que hoje consideramos como a base da nossa sociedade. As suas decisões, muitas vezes difíceis, marcaram não só o percurso da Guarda, mas também o do país. Este livro, em modo de registo cronológico, contribui para a preservação da memória permitindo-nos reflectir sobre os desafios e as lições que nos transmitiram.
Para este desafio, os autores estabeleceram como objectivos:
– “Marcar a transição exemplar do comando dos Oficiais do Exército para os novos Oficiais da Guarda, que representa uma reorganização profunda ao nível da formação dos seus quadros superiores, formados na Academia Militar a partir de 1991;
– Legar para memória futura e numa mesma obra, o CV resumido dos Oficiais do Exército que tiveram o privilégio e a honra de comandar as Guardas entre 1801 e 2023;
– Divulgar, de forma ligeira, a todos os que serviram e servem na Guarda, mas também à sociedade civil, os grandes marcos da organização/instituição Guarda, associados directamente aos seus Comandantes, que, na sua grande maioria, tiveram um papel importante no Exército, na GNR, e muitas das vezes na própria História de Portugal”.
A obra apresenta três notas prévias, da autoria de altas entidades, direta ou indiretamente, associadas ao processo, respetivamente: o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA), General José Nunes da Fonseca; o Chefe do Estado-Maior do Exército (CEME), General Eduardo Mendes Ferrão; e o Comandante-Geral da GNR, Tenente-General Rui Veloso. Permitam-me elogiar estes textos, de cariz institucional, mas também pessoal, como é o caso do General CEMGFA, dada a sua passagem pela GNR, em diversas funções e circunstâncias.
Depois de uma introdução da sua autoria, os autores optaram por organizar o livro em cinco partes. Esta estrutura permite constatar a evidência da metamorfose que moldou esta força e proporciona para cada uma dessas cinco partes, textos introdutórios com enquadramento social, político e militar do país, que nos ajudam a entender os pressupostos que levaram à criação das várias estruturas e também a sua constituição, evolução e designação, assim como os marcos históricos mais significativos associados à Guarda:
– Da Guarda Real da Polícia de Lisboa (1801-1834), com 9 comandantes;
– Da Guarda Municipal de Lisboa (1834-1868), com 11 comandantes;
– Da Guarda Municipal (1868-1910), com 8 comandantes;
– Da Guarda Republicana (1910-1911), com 1 comandante;
– Da Guarda Nacional Republicana (1911-2023), com 37 comandantes.
Essa metamorfose é muito clara em todo o processo de evolução. Veja-se a Guarda Real da Polícia de Lisboa, corpo policial criado em 1801 e precursor da GNR e das Forças de Segurança em Portugal, que era destinado a assegurar o sossego e a tranquilidade pública da capital e seus limites, assim como a segurança da «Corte e do Reino».
Hoje, as atribuições da Guarda são múltiplas e prosseguidas em todo o território nacional e no mar territorial, para assegurar a legalidade democrática, garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos, bem como colaborar na execução da política de defesa nacional, nos termos da Constituição e da lei.
A Guarda sobreviveu a períodos de instabilidade, revoluções, guerras, purgas, alterações estruturais com aumentos e reduções de meios humanos e de armamento, alterações na sua missão, esta de abrangência mais ou menos urbana ao longo do tempo.
Ainda sobre a organização do Livro: após cada texto introdutório são inseridos os CV resumidos de cada um dos Comandantes-Gerais, acompanhados pelos retratos respectivos ou, na sua impossibilidade, por documentos assinados pelos mesmos, tendo por base um critério que destaca as suas acções em prol da Guarda, independentemente do tempo, maior ou menor, em que serviram na instituição. As referências a funções desempenhadas no Exército, dizem apenas respeito à participação dos Comandantes no Corpo Expedicionário Português (CEP), nas comissões no Ultramar ou dos agraciados com a Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor Lealdade e Mérito.
Estes CV resumidos, inseridos após os textos introdutórios, constituem um complemento a estes mesmos textos, proporcionando informação e factos relevantes que constituem valiosos elementos da história e cultura da Guarda ao longo de 222 anos.
É importante frisar que, ao longo da História da Guarda, os seus Comadantes-Gerais não só lideraram em tempos de grande agitação política e social, mas também em momentos decisivos para a segurança e estabilidade do país, designadamente e apenas para referir alguns dos mais relevantes:
– na receção de Junot, a 30 de Novembro de 1807;
– na defesa do regime contra a revolta militar de 31 de Janeiro de 1891, com a Guarda Municipal do Porto;
– em 5 de Outubro de 1910, na defesa do regime monárquico;
– na insurreição de 14 de Maio de 1915;
– no período conturbado em termos sociais e políticos, entre 1919 e 1922, em que a GNR chegou a ser quase um 2º Exército, tendo sido depois alvo de reorganização e reduzida às funções policiais;
– no golpe de Estado de 1926 que resultou na queda da Primeira República Portuguesa e na revolta de 1927, na tentativa de travar a consolidação da ditadura militar saída do Golpe de 28 de Maio de 1926;
– na revolução do 25 de Abril de 1974, que teve no Largo do Carmo, junto ao Comando-Geral da GNR, com a “rendição” de Marcelo Caetano ao general António de Spínola.
Isto apenas para citar alguns momentos da História, em que os Comandantes-Gerais se depararam com situações difíceis, algumas de extrema gravidade e em que tiveram perante si o dilema da decisão certa a tomar. Cada um deles, com a sua capacidade de inovação e de adaptação aos novos tempos e circunstâncias, foi uma peça-chave na construção da identidade e da missão da Guarda Nacional Republicana, uma força que hoje continua a proteger os cidadãos portugueses com dignidade e zelo.
Sublinho algumas curiosidades quanto aos Comandantes:
– O período de comando variou entre alguns dias e os 12 anos;
– 5 Oficiais comandaram a Guarda por duas vezes;
– O General Afonso Botelho, comandou a GNR por 12 e 2 meses, entre 22/5/1945 e 9/8/1957:
– O General Farinha Beirão, que é hoje nome do prémio com o mesmo nome, que distingue anualmente os melhores comandantes de posto Territorial, foi o General mais tempo em funções, durante 12 anos e 4 meses;
– A grande maioria dos Comandantes passou à situação de reforma ou reserva após o seu comando na Guarda;
– Em geral, os Comandantes eram provenientes das armas de Infantaria, Artilharia e Cavalaria;
– Alguns Comandantes cumpriram comissões no ultramar, maioritariamente em África, em especial no período da Guerra de África (1961-1975);
– 23 dos Comandantes foram agraciados com a Ordem Militar da Torre e Espada, do Valor Lealdade e Mérito, a mais elevada ordem honorífica nacional;
– 21 nasceram em Lisboa, 4 em Vila Real, 3 no Porto, Bragança, Setúbal e Chaves e os restantes distribuídos por todo o país.
Julgo ser importante referir que todos os objectivos que os autores estabeleceram para o Livro foram atingidos e, nesse sentido, os meus parabéns aos autores e, sobretudo, à GNR.
Ao olharmos para este livro, somos convidados a recordar que o passado não é apenas um reflexo distante de tempos idos, mas uma fonte viva de ensinamentos que nos permitem compreender melhor o presente e projetar o futuro.
Este livro é uma homenagem aos Comandantes-Gerais do Exército que lideraram uma instituição que é, sem dúvida, um pilar da nossa História nacional. É também uma homenagem à Guarda Nacional republicana e ao Exército Português.
Na minha última alocução, enquanto Comandante-Geral da GNR, referi: “O momento presente é o de virar a página de um livro que é um só!”. Hoje, a GNR vive a segunda parte de um livro só.
Felicito os autores, o Major-general João Vieira Borges e o Tenente-Coronel GNR António Cardoso, que foram capazes de realizar um rigoroso trabalho de investigação e que proporcionou a concretização, bem conseguida, desta obra de valor histórico e de muito simbolismo, para a Guarda e também para o Exército. Gostaria ainda, de felicitar o Dr. Fernando Mão de Ferro das Edições Colibri, pela excelente qualidade da obra.
A Revista Militar felicita os autores e agradece a amável oferta do livro às Edições Colibri.
Tenente-general José Manuel Lopes dos Santos Correia
(Texto base da apresentação do livro, que teve lugar no dia 17 de dezembro de 2024, no Comando-Geral da GNR, no Carmo, em Lisboa)

Comandante-geral da Gurada Nacional Republicana (2022-2023).