Nº 2424 - Janeiro de 2004
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Uma Incursão na Dinâmica Militar no Estreito de Taiwan:Factores de Hardware e Software
Tenente-coronel
Manuel Alexandre Garrinhas Carriço
1.  Introdução
 
A diatribe político-diplomática entre Pequim e Taipé sobre o estatuto internacional da ilha consubstancia-se como um dos mais persistentes e perigosos potenciais conflitos no Leste asiático. No futuro, e a nível regional, muitas e melhores aproximações negociais e medidas criadoras de confiança entre as partes envolvidas nos mais variados conflitos e disputas verão a luz do dia e possivelmente a resolução definitiva de tais desacordos, num arco que poderá ir desde as ilhas do Mar da China meridional, passando pelo Vietname, Cambodja e Indonésia. Quer sob a forma de arranjos bilaterais ou o patrocínio de órgãos multilaterais (ASEAN ou ARF) existe uma tendência para uma maior integração política, institucional e económica das nações asiáticas na intricada malha da cooperação e da interdependência global - o que tanto tem benéfico como de potencialmente fragmentador. Os profetas da desgraça que arvoram o estandarte da belicosidade permanente, da corrida ao armamento, das disputas territoriais inultrapassáveis nesta região do planeta, deverão efectuar um breve e imparcial processo de análise da última década do século XX para se aperceberem do apreciável número de medidas de cooperação e de acordos assinados entre muitos países quanto à resolução de disputas fronteiriças (China e Rússia, China e Índia, China e Vietname, Japão e Rússia, Coreia do Sul e Japão)1. Mas como é normal, existe uma excepção que confirma esta regra: a República da China ou Taiwan2.
 
O simbolismo de Taiwan para a China é relevante, materializando um conjunto de atitudes e memórias bastante intrincadas na psiche colectiva dos chineses. A conjugação de factores históricos como a imperiosidade da unidade territorial nacional - à luz da qual o governo sempre foi caucionado - e um “nacionalismo afirmativo” como um dos instrumentos destinados a combater o “século da humilhação e do domínio das potências estrangeiras” prefiguram-se como alguns dos alicerces em que a China se apoia com vista à reabilitação do seu papel como potência central nos assuntos internacionais. Paralelamente, Taiwan significa igualmente o último grande escolho e um bastião nacionalista do Kuomintang no caminho da reunificação nacional delineada pelo Partido Comunista, prefigurando um sentimento de missão inacabada e de vitória por alcançar face ao adversário. Como declarou Zhu De, o fundador do Exército Popular de Libertação: “Enquanto Taiwan não for liberta, o sentimento histórico de humilhação do povo chinês não se dissipará; enquanto a Mãe-Pátria não se encontrar reunificada, a missão das forças armadas não estará cumprida”3.
 
Ao contrário dos casos de desanuviamento regional em cima mencionados, a década de 90 assistiu a uma progressiva acutilância política de Taipé vis a vis Pequim que implicou o recurso a métodos de diplomacia coerciva não observados desde a década de 50 aquando dos bombardeamentos das ilhas de Quemoy e Matsu por forças militares de Pequim. De facto, consideramos que seis acontecimentos de variável intensidade e importância política foram sendo explorados e cumulativamente alimentando as cada vez maiores desconfianças entre as duas lideranças gerando um maior alargamento do fosso político que as separa, independentemente da ponte económica que as une. O dictum popular chinês changtong buru duandong (literalmente uma dor prolongada é pior do que uma dor curta) poder-se-á aplicar a esta dialéctica, significando que uma resolução rápida da questão de Taiwan é melhor do que uma lenta, e que no caso de Pequim a exploração intencional de um sentimento de impaciência pode jogar em seu favor e no sentido de pelo menos se manter o actual “estado de coisas”. Como é óbvio os riscos associados a tal estratégia são enormes, mas não deixam - em caso de sucesso - de ser menos compensadores.
 
Primeiro, no início de Março de 1994, Lee Teng-hui numa entrevista com o escritor japonês Ryotaro Shiba, declararia que o “governo do Kuomintang era um governo alienígena”, que “a República da China é um Estado soberano”, que era adepto de uma nova política face à China continental, a qual se poderia ilustrar pelo slogan: jingying da Taiwan, jianli xing zhongyuan (governar uma Taiwan mais abrangente, construir uma nova China) e que a sua tarefa se assemelhava à de Moisés, conduzindo o seu povo para construir um outro país num outro local. Para além do ressentimento provocado pelo facto de Lee ter falado com um escritor japonês sobre assuntos políticos4, Pequim acreditou que a analogia bíblica indicava uma direcção política no sentido da independência de Taiwan.
 
Segundo, no final do mesmo mês, o incidente de Qiandaohu (lago das mil ilhas) realçou ainda mais as fortes desconfianças entre os dois lados do Estreito. Com efeito, no dia 31 de Março de 1994, vinte e quatro turistas de Taiwan bem como alguns turistas da China continental foram assaltados e queimados vivos por três criminosos durante uma viagem de barco ao lago das mil ilhas na província de Zhejiang. Ainda que o governo chinês tenha levado a sério estes acontecimentos - punindo os criminosos um mês depois - o hábito, implicou que não providenciasse qualquer informação à imprensa até que o caso fosse resolvido, recusando inclusive a admissão de repórteres de Taiwan em território continental. Durante o tempo das investigações que levaram à prisão dos culpados, as especulações multiplicaram-se na imprensa de Taiwan, chegando inclusive a serem levantadas suspeitas de envolvimento de militares no massacre. As declarações político-demagógicas sucederam-se e as expressões azedas empregues por Lee Teng-hui para classificar o regime de Pequim (“regime de bandidos” e “o Partido Comunista chinês é formado por forças do mal”), causaram um sério mau estar na liderança chinesa, principalmente quando se provou que não haviam elementos do Exército Popular de Libertação (EPL) ligados ao incidente.
 
Terceiro, em Novembro de 1994, o incidente de Xianmen agravaria ainda mais o clima de pressão nacionalista que igualmente assolava a sociedade chinesa5. Quando um vaso de guerra de Taiwan em exercícios navais efectuou um bombardeamento que ultrapassou largamente a área definida indo as granadas cair sobre uma vila na China continental e matando alguns camponeses, Jiang não emitiu um forte protesto - como seria normal - sugerindo igualmente a Taipé que Pequim não iria pedir qualquer indemnização (apesar das públicas lamentações dos camponeses na imprensa). A liderança militar ficou lívida, chegando Zhang Wannian (o actual chefe de Estado-Maior General do EPL) a acusar alguns líderes civis de “comportamento covarde”6.
 
Quarto, frustrado com a natureza das relações bilaterais, e após uma extensa reavaliação da situação de Taiwan, Jiang Zemin avançaria em 30 de Janeiro de 1995 com uma proposta de reunificação assente em oito pontos, a qual rompia em muitos aspectos com a fórmula original de Deng Xiaoping de “um país, dois sistemas”7. Por exemplo, acompanhando a realidade de que um sistema político multipartidário havia-se imposto em Taiwan e de que o Kuomintang (KMT) já não representava a ilha, Jiang abdicou de mencionar no texto da proposta uma negociação entre o KMT e o Partido Comunista Chinês (PCC) referindo apenas um diálogo com as “autoridades de Taiwan”, enquanto que a fórmula original de Deng apontava para uma negociação restrita ao PCC e ao KMT. Mais, Jiang deixou em aberto a possibilidade de “representantes de vários partidos políticos e de organizações de massas de ambos os lados do Estreito poderem ser convidadas a participar nas conversações”. Adicionalmente, o Presidente chinês advogaria pela primeira vez uma negociação em pé de igualdade entre as partes. Ao utilizar a expressão igualdade, Jiang evitou que se tocasse no sensível tópico do governo central/local, o qual era o objectivo a longo prazo de Pequim. Finalmente, Jiang sublinhou de que “sob a premissa de que só existe uma China, estamos preparados para dialogar com as autoridades de Taiwan sobre quaisquer assuntos incluindo matérias de preocupação para as autoridades de Taiwan”. Aparentemente, “quaisquer assuntos” incluíam as questões do espaço internacional, o estatuto político de Taiwan após a reunificação, e mesmo a designação, a bandeira e a forma de uma China unificada. Após várias semanas sem resposta de Taipé, a previsível recusa de Lee Teng-hui surgiu em Abril e foi liminar. Jiang viu-se subitamente sob intensa pressão dos sectores mais conservadores do Partido e do EPL que indirectamente o caracterizaram como um dos líderes civis com um “fundo fraco”. Para o “engenheiro chefe” era a hora de pela primeira vez endurecer o seu discurso e recuperar o terreno perdido reconhecendo que “quando as forças armadas forem mais fortes, haverá uma maior probabilidade de a reunificação se concretizar”8. Em Junho, numa reunião do Politburo, Jiang Zemin, Qian Qichen (Ministro da Defesa) e Wang Zhaoguo (responsável pelo Gabinete dos Assuntos de Taiwan) fizeram auto-críticas de severidade variável que conduziram a uma analose dos já ténues laços entre os dois lados do Estreito.
 
Quinto, em Maio de 1995 a visita particular de Lee Teng-hui aos Estados Unidos (mais concretamente à sua alma mater - a universidade de Cornell)9 acirrou ainda mais os ânimos de Pequim que encarou esta visita como mais um passo na direcção da independência de jure de Taiwan, materializando-se como um epitáfio à sua política de ofensiva pacífica iniciada em Setembro de 1981 por Ye Jianying, o então vice-Secretário Geral do Comité Permanente da Assembleia Nacional Popular (ANP)10. Era chegada a hora da diplomacia coerciva a qual foi amplamente dissecada nos mais diversos meios académicos internacionais11. Entre 21 e 25 de Julho de 1995, o EPL levou a cabo um conjunto de testes de lançamento de mísseis balísticos no Leste do Mar da China, a apenas 150 quilómetros do extremo Norte da ilha. Entre 12 e 25 de Agosto, Pequim conduziria uma nova série de exercícios militares, que incluíram três dias de testes de lançamento de mísseis e de bombardeamento naval a cerca de 136 quilómetros a Norte de Taiwan. Por esta ocasião foram disparados quatro DF-15 tendo três atingido a área designada e um explodido prematuramente12. Em Novembro, forças de fuzileiros navais e de carros de combate efectuaram um exercício de desembarque anfíbio na província de Fujian, nele tendo sido apoiados por aviões e vasos navais de guerra. Em Março de 1996, e antes das eleições presidenciais em Taiwan, Pequim realizou uma nova vaga de exercícios militares. Entre 8 e 15 de Março, o EPL lançaria um novo conjunto de exercícios aero-navais que culminariam com o lançamento coroado de êxito de quatro mísseis balísticos DF-15 de curto raio de acção nas águas envolventes aos dois portos principais da ilha (respectivamente a 19 milhas náuticas de Keelung, o segundo porto de Taiwan com maior movimento naval e a 28 milhas náuticas de Kaoshiung, o terceiro maior porto de contentores do mundo). Entre 18 e 25 de Março os exercícios aero-navais redobraram de intensidade. Os EUA procederam ao envio de dois grupos de combate liderados pelos porta-aviões Nimitz e Independence, por entre ameaças de ataques nucleares chineses a cidades norte americanas como Los Angeles em caso de intervenção militar americana. Ainda que destinadas a consumo interno e à manutenção do status quo da ilha13, as ameaças, os exercícios militares e a inflamada retórica chinesa lançaram um forte receio quanto à possibilidade de no futuro puderem suceder eventuais erros de cálculo capazes de descambar num conflito militar aberto, não desejado por todas as partes que nele possam estar a vir envolvidas.
 
Sexto, em Julho de 1999 as tensões voltaram a recrudescer entre os dois lados do Estreito quando o Presidente Lee sugeriu em declarações públicas que considerava Taiwan como um Estado separado da China, advogando numa entrevista a um jornalista alemão que todas e quaisquer negociações entre as partes deveriam ser conduzidas numa base “inter-estatal” (guojia yu guojia) e não numa base entre “governo central e governo local”. Pequim responderia a esta tentativa de Taipé de abdicar do princípio político de “uma China” com o anúncio de que tinha capacidade operacional de emprego da bomba de neutrões, com a ameaça de emprego da força em caso de independência de Taiwan, com exercícios militares ao longo da costa chinesa oposta a Taiwan, com o teste de um novo míssil balístico construído com base na tecnologia do sistema de defesa anti-míssil Patriot adquirido a Israel, e com um incremento do número de voos de patrulhamento dos seus aviões sobre o Estreito14. Com efeito, no dealbar do novo século a determinação de Pequim em incorporar a “ilha secessionista” no seu território não dá mostras de enfraquecer, ainda que a maioria da população de Taiwan não mostre uma particular inclinação pela sua inserção política na China continental15.
 
Taiwan representa assim um assinalável e potencial foco de conflito militar entre a China e os Estados Unidos. Ainda que uma eventual e indesejável confrontação fiquem aquém de uma guerra em larga escala, tal não impedirá a ruína das relações bilaterais e de uma grave desestabilização do cenário geopolítico e geo-económico regional, independentemente dos larguíssimos e mutuamente benéficos laços de cooperação comercial e de serviços, dos comuns interesses na estabilidade da península coreana, no controlo do crescimento do poder militar japonês, e no combate a ameaças “não-tradicionais” à segurança, como a degradação ecológica, o tráfico de drogas, e a imigração ilegal16.
 
O presente trabalho é um excerto de um estudo mais extenso e profundo elaborado pelo autor sobre os cenários de intervenção militar de Pequim sobre Taiwan e as respectivas probabilidades de êxito. No caso presente, limitar-nos-emos a proceder a uma aferição limitada de hardware e software militar de ambos os lados, efectuando simultaneamente uma incursão prospectiva sobre as respectivas dinâmicas de aquisição de armamento. Apesar de reconhecermos a improbabilidade da deflagração de um conflito militar sobre o Estreito - a não ser que ocorra (m) uma das quatro premissas de intervenção de Pequim e todas elas estreitamente relacionadas com eventuais desenvolvimentos passíveis de virem a ocorrer em Taiwan17 – o cuidado e a necessidade da elaboração de planos de contingência que contemplem o improvável ou o impensável validam esta fracção da análise em baixo avançada, a qual seguirá uma metodologia eminentemente conservadora - mais notória no que concerne aos sistemas de armas passíveis de poderem vir a ser empregues. Se a realidade actual ainda confere algumas vantagens a Taiwan face a uma eventual invasão da China, a tendência é de que num futuro muito próximo (no final da década) essa mais valia se tenda a esboroar, facto a que não deixaremos de prestar a devida atenção.
 
 
2.  Os Meios Militares e o Respectivo Treino dos Dois Lados do Estreito: Panorama Actual e uma Prospectiva a 10 anos
 
Antes de avançarmos para uma análise mais pormenorizada sobre os diversos cenários conflituais com recurso a métodos ortodoxos e não ortodoxos por parte de Pequim, julga-se importante efectuar uma comparação não só quantitativa mas qualitativa das eventuais forças e meios militares que se poderão vir a digladiar sobre o Estreito. Ao efectuarmos uma análise sumária sobre a ordem de batalha, não deixaremos de nos debruçarmos sobre factores como o terreno, o treino e a qualidade dos meios humanos, a interoperabilidade dos meios, a integração operacional de complexos sistemas militares, a capacidade C4I, entre outras, configuram factores de software que não são facilmente discerníveis a partir da análise crua do inventário de hardware patente nas respectivas ordens de batalha. È importante lembrar que o emprego de determinadas forças e meios se encontra dependente da contingência das situações e das missões a efectuar. Tendo estes aspectos em permanente atenção só assim poderemos ter uma imagem mais nítida sobre as possibilidades de êxito de cada uma das modalidades de acção disponíveis para a China. Esta é uma tarefa algo delicada, uma vez que o compreensível véu de secretismo que envolve a estratégia de emprego das forças armadas de ambos os lados do Estreito, tenderá a aproximar tal desiderato a um acto de “leitura de folhas de chá chinês”. Mesmo assim, o recurso a fontes públicas de informação permite delinear um contorno aproximado da realidade envolvente a tal dialéctica militar.
 
Actualmente o EPL encontra-se à distância de pelo menos duas décadas de conseguir implementar operacionalmente e de forma sustentada a sua doutrina de “Guerra Moderna sob Modernas Condições Hi-Tech” a qual pressupõe a capacidade de envolver e derrotar um adversário militarmente modernizado para além das suas fronteiras. Pequim acredita que pode desenvolver capacidades assimétricas em certos nichos - tais como nos mísseis de cruzeiro de ataque ao solo (LACMs) e nos mísseis convencionais de curto alcance (SRBMs). A guerra assimétrica é normalmente definida como o ataque de um adversário tecnologicamente inferior sobre os pontos mais vulneráveis de uma força tecnologicamente superior por intermédio do emprego de meios inesperados e inovadores, procurando simultaneamente evitar os pontos fortes desse mesmo adversário. O esforço da China em “saltar sobre gerações de tecnologia” no seu programa de armas é muitas vezes entendido como um esforço destinado a desenvolver novas e surpreendentes capacidades, apesar de a maioria desses programas serem derivados de esforços que já à alguns anos vêm sendo realizados em países mais desenvolvidos. Em vez de se poderem classificar tais programas como particularmente inovadores, a modernização militar chinesa podem ser descritos de uma forma mais precisa como uma concentração de esforços no sentido do desenvolvimento de capacidades de empenhamento assimétrico. A China procura assim identificar tácticas inovadoras e parâmetros de emprego de sistemas e tecnologias passíveis de emprego pelo EPL nas próximas duas décadas.
 
No que respeita à defesa estratégica de Taiwan e ao seu planeamento e prioridades de emprego e desenvolvimento de forças, Taipé renunciou há muito à “reconquista” militar da China continental. O plano de modernização das suas forças armadas centra-se sobre três áreas específicas:
 
• Manter a superioridade aérea sobre o Estreito de Taiwan.
• Conduzir eficazmente operações de contra-bloqueio.
• Derrotar um ataque anfíbio ou aerotransportado sobre a ilha.
 
Taipé espera que a sua actual superioridade tecnológica e táctica sobre a China nestas três áreas se mantenha de forma a poder ganhar tempo, aguardando que eventuais e benignos ventos de mudança possam no futuro desanuviar o clima enevoado que tolda as suas perspectivas de longo prazo.
 
Fundamentalmente os programas de modernização de ambos os lados têm uma natureza interactiva. Tal como as aquisições militares de Taiwan destinam-se a contrabalançar o programa de modernização militar de Pequim, o planeamento estratégico de Taipé tem em consideração as capacidades emergentes da China.
 
2.1.     Uma Perspectiva Geral das Forças Armadas
 
Como já atrás foi mencionado, o EPL procura a obtenção de uma capacidade credível de intimidação capaz de materializar a prossecução de objectivos políticos e militares sem ter de recorrer à totalidade das suas forças. O programa de modernização busca a obtenção a curto prazo de melhorias assinaláveis na sua capacidade de combate contra meios terrestres, nos lança­mentos de ataques de precisão e desenvolvimento a médio prazo da defesa anti-míssil e de sistemas de information warfare. Assim o EPL tem vindo a adquirir armas que poderão ser úteis para fazer face a adversários que operam com base em plataformas navais ou a partir de bases aéreas localizadas no Nordeste asiático (mísseis de cruzeiro anti-navio, LACMs, e SRBMs. Pequim tem tentado igualmente ultrapassar problemas associados com a integração de avançados sistemas de armas no seu inventário; com as vulnerabilidades do seu sistema de comando, controlo, computadores e informações (C4I)18; com o treino das suas forças militares; e com o apoio logístico, de forma a incrementar sua capacidade e proficiência de combate.
 
Em termos comparativos de forças, o EPL tem uma clara vantagem quantitativa. No entanto, apenas uma fracção desse poder total poderá ser empregue contra Taiwan num determinado espaço de tempo. As principais forças a serem envolvidas em tais operações incluirão as unidades da 2ª Artilharia de SRBMs nas províncias de Jiangxi e Fujian, unidades aéreas e terrestres subordinadas às regiões militares de Nanjing e Guangzhou, e os meios navais da Esquadra do Mar do Leste. Mesmo assim, e dependendo dos requisitos operacionais, meios aéreos, navais, de mísseis balísticos e terrestres adicionais e oriundos de outras regiões militares poderão ser envolvidos em operações sobre Taiwan.
 
Quanto às forças armadas de Taiwan, durante mais de uma década o seu esforço de modernização centrou-se na aquisição de sistemas de armas e de equipamento associado capaz de deter - e, se necessário - derrotar uma agressão chinesa. Biliões de dólares têm sido gastos em programas autóctones de defesa como o do caça IDF (Indigenous Defense Fighter) e o sistema de defesa anti-aérea TIEN KUNG, bem como com a compra de aviões F-16, MIRAGE 2000, fragatas francesas da classe LAFAYETTE. Muitos destes sistemas adquirido no início e em meados da década de 90 estão agora em fase de assimilação e integração operacional. Adicionalmente, no início da década passada, o Ministério da Defesa de Taiwan anunciou a intenção de reduzir até 2003 em cerca de 40,000 efectivos a dimensão das suas forças armadas, ficando estas totalizadas em cerca de 400,000 homens. A maioria dos cortes tem sido efectuada no Exército, o qual congrega actualmente um efectivo de 200,000 homens. A Força Aérea e a Marinha manterão os seus efectivos em 70,000 e 60,000 respectivamente, com o número de pessoal associados a funções logísticas, de polícia militar, de patrulhamento costeiro e de ensino militar nas academias a rondar os 60,000.
 
O principal objectivo desta redução é a criação de uma forças armadas mais pequenas mas com uma maior mobilidade, flexibilidade de emprego e poder de fogo. Uma outra razão prende-se com a desvantagem competitiva que as forças armadas possuem no recrutamento de pessoal especializado e tecnologicamente proficiente capaz de utilizar os modernos sistemas. Um terceiro factor orbita a intenção de reduzir o número de Oficiais Generais especialmente no Exército. Em 2005, Taiwan deverá possuir uma Força Aérea com cerca de 400 aviões e um Exército com 1,500 carros de combate. A frota naval de guerra será composta por 30 vasos de guerra, isto à medida que os velhos destroiers vão sendo abatidos e substituídos por novos vectores. Adicionalmente a proporção entre meios avançados e sistemas antigos de combate no seio de cada um dos ramos sofrerá um aumento.
 
 
 
2.2.     A Capacidade Balística Convencional da China e os Sistemas de Defesa Anti-Míssil de Taiwan
 
Como ficou demonstrado pelos exercícios militares sobre o Estreito de Taiwan entre 1995 e 1996, Pequim considera o desenvolvimento da sua força de mísseis balísticos como uma importante arma política capaz de influenciar a população e a liderança da ilha por intermédio do emprego de uma estratégia de ataque em profundidade (zongshen daji). Os projectos dos novos LACMs, quando forem introduzidos operacionalmente, irão substanciar consideravelmente a capacidade militar de atacar com precisão alvos estratégicos com ogivas convencionais. Este tipo de armas são particularmente importantes nos actuais campos de batalha, como tem vindo a ser provado pelo emprego sistemático dos mesmos por parte dos Estados Unidos quer no Iraque, no Sudão, na Sérvia, no Kosovo, e mais recentemente no Afeganistão. Em 2005, o EPL deverá ter no seu inventário “destinado ao teatro de Taiwan” dois tipos de SRBMs e uma primeira geração de LACMs cujo objectivo de emprego se centrará sobre infra-estruturas essenciais (centros de decisão política, estações de televisão, de rádio, de electricidade, de águas, e de telefones) bem como aeroportos, bases navais, e centros C4I, que dificultarão substancialmente a capacidade de resposta e de condução de operações militares por parte de Taipé.
 
Nos próximos anos a dimensão das forças de SRBMs chinesas irá aumentar substancialmente, podendo atingir o milhar de unidades no final da década com um custo total de 500 milhões dólares20. Actualmente o EPL possui uma unidade de escalão regimental com mísseis DF-15/M-9 localizada na região militar de Nanjing. O DF-15 é móvel, sendo propulsionado por combustível sólido e pode transportar uma ogiva convencional de 500 quilogramas até um alcance máximo de 600 quilómetros, possuindo um erro central aproximado de 300 metros (ainda que relatórios recentes apontem para um erro de 100 metros), e um tempo de activação de cerca de 30 minutos. Alegadamente a ogiva do DF-15 possui um mecanismo de controlo e manobrabilidade que lhe permite efectuar correcções desde o momento da separação do foguetão propulsor até ao momento do impacto21. A ogiva destacável oferece um alvo mais reduzido do que o da ogiva de um míssil SCUD, o que associado à sua manobrabilidade complica significativamente a missão dos radares de defesa anti-míssil no seguimento, nos cálculos informáticos, e na intercepção da mesma. Aquando do impacto no solo, a ogiva do DF-15 poderá criar uma cratera de 30 a 50 metros de diâmetro. Com base numa trajectória de alcance de 500 quilómetros, o DF-15 atingirá uma altitude 120 quilómetros, com uma velocidade de reentrada na atmosfera de cerca de 2 quilómetros por segundo e um tempo de voo de apenas seis a sete minutos22.
 
O DF-11/M-11 que se prepara para ser introduzido no inventário militar da 2º Artilharia, é igualmente móvel, propulsionado por combustível sólido e com um alcance estimado da ordem dos 300 quilómetros. A grande vantagem do DF-11 face ao DF-15 é a sua capacidade de transportar uma maior carga. Algumas fontes creditam o DF-11 com a capacidade de transporte uma carga de 800 quilogramas e possuindo um erro central de 150 metros23. O principal desafio que o DF-11 coloca às defesas anti-míssil prende-se com o seu reduzido tempo de voo (cerca de três minutos) que lhe permite manter-se na atmosfera o que o impede de ser interceptado pelo sistema THAAD.
 
O DF-21 (CSS-5) é um míssil balístico com um alcance médio de 2000 quilómetros (MRBM) e de combustível sólido, equipado com uma ogiva de 600 quilogramas e um erro central de 700 metros, estando apenas preparado para missões de ataque nuclear. No entanto, tem havido fortes indícios que apontam para o desenvolvimento de um sistema de direcção terminal que permitirá o ataque com ogivas convencionais24. A sua elevada velocidade de reentrada permitir-lhe-à obstar a tentativas de intercepção de sistemas de baixa altitude do tipo PATRIOT. Todos os três tipos de mísseis em cima descritos deverão incorporar tecnologia de navegação por satélite (GPS ou GLONASS)25 prosseguindo a investigação intensiva de sistemas de orientação terminal dos mísseis, de diversificação das cargas explosivas transportadas pelas ogivas (desde submunições, a cargas de impulso electromagnético, a ogivas de penetração e a cargas de explosão aérea)26 e de contramedidas face às defesa anti-míssil (como técnicas de saturação de área; de veículos de reentrada manobráveis; de tecnologia stealth, e da forma das ogivas, de empastelamento electrónico, de engodos; de inutilização de detecção por laser; de eixos múltiplos de ataque; e de trajectórias de forte ângulo de queda)27.
 
A China tem vindo igualmente a desenvolver - e com um elevado grau de prioridade de investigação e desenvolvimento (I&D) - LACMs. Nesta área tem sido auxiliada por técnicos russos, mas igualmente tem procurado adquirir os seus sub-sistemas no mercado externo, especialmente na Rússia28. A importância dos LACMs prende-se com a facilidade de aquisição de baratos sistemas de navegação e de orientação terminal bem como de tecnologia de digitalização topográfica29. Sendo mais baratos (cerca de 175 mil dólares por unidade) e de mais fácil desenvolvimento do que os mísseis balísticos e possuindo uma assinalável capacidade de destruição dos alvos, o desenvolvimento dos LACMs poderá conferir uma vantagem de nove para um face aos custos resultantes da necessidade de deles se defender por parte de Taiwan. Uma outra vantagem dos LACMs orbita o facto de que a utilização do sistema GPS ou GLONASS permite que os seus vectores de lançamento se dispersem por um maior número de locais de lançamento, o que aumenta as suas possibilidades de sobrevivência face a um contra-ataque inimigo, para além de possuírem uma assinatura de infra-vermelhos aquando do seu lançamento ser muito mais reduzida que a dos mísseis balísticos, o que reduz o tempo de pré-aviso e dificulta a sua detecção. Os LACMs possuem igualmente a importante característica de poderem ser lançados a partir de aviões e navios e serem redireccionados com muito maior facilidade do que os mísseis balísticos. Os LACMs constituem assim uma perigosa ameaça para as defesas aéreas adversárias. Devido à curvatura da Terra, os radares terrestres apenas podem detectar mísseis de cruzeiro voando a baixa altitude a cerca de 32 quilómetros de distância. Em comparação um avião voando a cerca de 10 mil pés de altitude poderá ser detectado a 240 quilómetros de distância.
 
A China tem vindo a desenvolver quatro grandes tipos de LACMs. O XY-41 é uma evolução do SILKWORM (um míssil anti-navio conhecido igualmente pela designação de HY-4) e poderá ser lançado quer a partir de aviões quer a partir de baterias terrestres, podendo ter um alcance de 300-400 quilómetros e transportando uma carga de cerca de 500 quilogramas (idêntica à do DF-15). O YJ-8 é uma adaptação do EXOCET e terá um alcance reduzido de 42 quilómetros ou menos e uma ogiva com carga para 165 quilogramas. O YJ-82 é uma evolução do YJ-8 e apresentará uma propulsão mais potente que distenderá o seu alcance até aos 120 quilómetros. O YJ-9 é um míssil anti-radiação que está a ser desenvolvido com base no modelo russo Kh-31P30 e no modelo israelita do STAR-1 estando particularmente vocacionado para o ataque a estações de radar de sistemas AWACS, do radar MPQ-53 do sistema PATRIOT, e do radar de fase de entrada SPY-1D do sistema AEGIS podendo ter um alcance de 400 quilómetros31. Tudo indica que a primeira geração destes mísseis deverá ter a particularidade de ser lançado a partir de aviões e entrará em fase de produção e de emprego operacional nos próximos dois anos.
 
Existe igualmente a possibilidade de aquisição off-the-shelf de LACMs russos como o míssil subsónico Kh-65SE/KENT que possui um alcance de 210 quilómetros e é similar ao TOMAHAWK americano. Uma outra possibilidade é o ALPHA que equipa os submarinos russos da classe KILO que foram adquiridos pela China.
 
O aperfeiçoamento tecnológico dos C-801/SARDINE e do C-802/SACCADE levado a cabo pela China tem permitido a modernização dos velhos ASCMs de primeira geração como o CSS-N-1/SCRUBBRUSH. Apesar da antiguidade de muitos dos seus navios, o défice de experiência operacional e a sua incapacidade em efectuar reabastecimentos de ASCMs em pleno mar por parte da Marinha do Exército Popular de Libertação (MEPL), a China possui ainda uma assinalável capacidade de reunir meios capazes de saturar a Marinha de Taiwan com uma barragem de ASCMs. Adicionalmente, os bombardeiros B-6D, os quais estão subordinados ao comando da Força Aérea da Marinha do Exército Popular (FAMEPL) são capazes de operar o C-601/KRAKEN. O novo bombardeiro FB-7 provavelmente terá a capacidade de transportar os ASCMs C-801 e C-802. Mais, espera-se que a capacidade de emprego de mísseis de cruzeiro anti-navio sofra uma assinalável melhoria com a aquisição de mais dois destroiers russos da classe SOVREMENNY os quais estão equipados entre outros sistemas com os temíveis mísseis SS-N-22/SUNBURN 32.
 
A maior vulnerabilidade de Taiwan é a sua capacidade limitada de fazer face a um ataque balístico sobre os seus centros C4I e infra-estruturas vitais. De facto estes mísseis materializam uma séria ameaça para alvos militares que não se encontrem devidamente reforçados e protegidos. No seu esforço inicial de resposta a esta ameaça chinesa, Taipé adquiriu o sistema MADS (Modified Air Defense System) - uma versão melhorada do sistema PATRIOT empregue na Guerra do Golfo. O MADS que chegou a Taiwan em 1997 deverá estar a ser empregue na defesa das áreas mais densamente povoadas de Taipé, ainda que não logrem suster capazmente um eventual ataque balístico chinês.
 
2.3.     Os Meios Aéreos
 
O início do novo milénio representará para a FAEPL, pelo menos ao nível das intenções, a vontade de substituir gradual e racionalmente todas as suas decrépitas esquadrilhas de combate33, por novas gerações de caças quer construídos localmente quer co-produzidos, segundo linhas directoras definidas no início da década de 90:
 
• Os caças devem ter a prioridade de compra.
• A proporção da rubrica orçamental destinada à compra de aviões deve ser maior no que concerne às aeronaves de ataque ao solo, em prejuízo dos bombardeiros, uma vez que os primeiros mercê de reabastecimento aéreo poderão atacar os segundos escalões e as reservas das forças inimigas.
• Deverá existir uma determinada proporção de bombardeiros estratégicos.
• Aviões de reconhecimento, de guerra electrónica e de vigilância deverão ser fornecidos em quantidades apreciáveis.
• Deve-se desenvolver a capacidade de transporte aéreo táctico e estratégico.
• O reabastecimento aéreo deve constituir uma percentagem dos aviões de combate como multiplicador de poder militar.
• A China não deve subalternizar a importância do desenvolvimento de helicópteros de combate para o Exército e a Marinha.
• A FAEPL deve desenvolver sistemas de armas anti-aéreas baseadas em terra.
 
Mas, o ritmo de modernização dependerá de dois pressupostos fundamentais: o primeiro prende-se com o timing de introdução do novo caça chinês, o F-10 (equivalente ao F-16A norte americano) que após a fase de testes de voo (iniciados em Março de 1998), entrou em produção em 2000. Mesmo assim, os engenheiros aeronáuticos têm-se deparado com sérios problemas de motor, apesar do considerável input tecnológico dado pelos técnicos aeronáuticos “importados” da Rússia; o segundo, e mais importante problema, baseia-se na afectação substancial de fundos capazes de suportar as necessi­dades da FAEPL. Perante este enquadramento, só se prevê que os primeiros regimentos venham a estar operacionais em meados desta década.
 
O projecto do F-10 tem beneficiado da colaboração tecnológica de outros países. Israel iniciou a sua cooperação em meados da década de 80, tendo fornecido sistemas aviónicos e de radar ao agora defunto projecto sino-americano do caça Lavi. Pequim executou então uma transferência de tecnologia, encaixando estes sistemas no F-10, que seria redesenhado de forma a poder utilizar o seu único motor de fabrico russo Lyulka AL-31, inserido bem no interior da fuselagem e que propulsiona o SU-27, ao mesmo tempo que se socorria de materiais compósitos e de um design de configuração das asas em forma de delta, como método de catalizar as características stealth do avião34. Estas cambiantes materializam um avanço tecnológico de duas gerações para a FAEPL, comparativamente aos aviões de terceira geração como os F-8II e o F-7II (que possuem alguns sistemas aviónicos de quarta geração).
 
Um outro novo caça bimotor de fabrico nacional, o JH-7 (FBC-1) foi apresentado em Novembro de 1998 no festival aéreo internacional de Zhuhai. Este modelo foi desenhado na década de 80 para missões de longo raio de acção (cerca de 1650 km), como e por exemplo sobre as ilhas Spratly, tendo ao longo de todo o processo de I&D sido construídos sete modelos evolutivos. Apesar do aparato tecnológico e de linhas aerodinâmicas que o JH-7 demonstra, este enfrenta um futuro incerto tendo em linha de conta o reduzido número de encomendas feitas quer pela FAEPL quer pela MEPL, pelo que a fábrica de Xian já tem em estudo uma versão evolutiva deste, que será propulsionada não pelos actuais motores Rolls-Royce (produzidos na China sob licença) mas por motores franceses SNECMA M-53-P2 que equipam o MIRAGE 2000.
 
Como preparação face à tão esperada introdução destes novos aviões, a FAEPL iniciou o processo de abate do velhos e obsoletos caças Q-5 e F-6 (versões evolutivas do MiG-19, da década de 60), que totalizam cerca de 80% do número total de aviões (4 mil). Ora esta desproporção tem como consequência o facto de que levando em atenção o elevado preço unitário do F-10 (da ordem dos 20 milhões de dólares) e a reduzida dimensão da rubrica do orçamento da força aérea destinada à compra de novos aviões (apesar de ser o ramo das forças armadas que mais tem beneficiado dos aumentos do orçamento de defesa), esta só poderá adquirir anualmente algumas dezenas, quando necessita de algumas centenas, para obter um razoável grau de operacionalidade (que mesmo agora não possui)35. Perante este panorama, é previsível que a força aérea prossiga a actual política de encomendas limitadas dos aviões F-7 e F-8II, como forma de compensar este défice operativo, prolongando por mais uma década a vida útil destes aparelhos.
 
Extrapola-se de tudo o que em cima foi descrito, que o complexo industrial-militar aeronáutico chinês padece de um intrincado processo de debilidade científica, principalmente no que se sujeita à integração das novas tecnologias de topo e à consolidação racional dos processos de I&D de sistemas de armas passíveis de utilização pelo EPL. Sendo assim, compreende-se a necessidade sentida pela liderança político-militar de Pequim em recorrer à importação de plataformas (maioritariamente de fabrico russo) como meio de obstar a uma crescente décalage tecnológica face a Taiwan.
 
É neste cenário que se pode entender a decisão de compra de 72 SU-27 em 199136 (F-11, na designação chinesa), numa operação de aquisição off-the-shelf, cuja inclusão posterior da licença de produção local conseguida por Pequim, permite incrementar a sua base tecnológica de investigação aeronáutica37. Mesmo assim, e apesar das previsões optimistas que apontavam a saída do primeiro F-11 da linha de produção no início de 1999, as inevitáveis dificuldades de integração da mais moderna tecnologia sentida pelos engenhei­ros da Corporação Aeronáutica de Shenyang (cujas partes foram produzidas na Rússia e serão montadas na China), veio protelar em mais um ano a entrega da primeira encomenda de 38 destas aeronaves. Até ao final de 2010 a FAEPL pretende ter ao seu serviço 300 F-11 (72+38+200)38.
 
Em 1995, aquando da primeira entrega de 27 SU-2739 (o único avião do inventário chinês com um raio de acção capaz de efectuar operações prolongadas além das fronteiras da China continental40) Pequim iniciou conver­sações com Moscovo com vista à compra de 40 a 50 aviões SU-30 MK e que após seis anos de difíceis negociações - centradas na condição chinesa do fornecimento paralelo da última geração de mísseis de longo alcance ar-ar (AAMs), com sensor de infra-vermelhos, os AA-11/ARCHER e no seu interesse na aquisição da versão do mesmo avião vocacionada para o ataque ao solo, bem como na compra do know how indispensável à construção de uma fábrica de montagem dos motores AF-31F que propulsionam o SU-27 e o F-10 e que actualmente têm de ser enviados para a Rússia a fim de serem reparados - foram concluídas com êxito41. A compra dos SU-30 (tecnologicamente menos sofisticados que a versão vendida à Índia, uma vez que o seu radar não consegue detectar os 120 alvos em simultâneo e a uma maior distância que o modelo indiano efectua) irá providenciar à China um vector de combate aéreo de características similares às do F-15E norte-americano. Em combinação com um sistema AWACS do tipo PHALCON e a capacidade de reabastecimento aéreo, a FAEPL terá a capacidade de lançar sofisticados mísseis ar-terra anti-radiação como o Kh-31A que serão uma séria ameaça aos navios que operem dentro do raio de acção deste avião, mesmo com sistemas AEGIS ou baterias terrestres do sistema PATRIOT, para além dos mísseis Kh-29L (com orientação por laser), e do Kh-59M (teleguiado) cujos alcances variam entre os 90 e os 390 quilómetros42.
 
Para além do AA-11 que é superior ao AIM-9/SIDEWINDER43 (de fabrico americano) e ao TIEN CHIEN‑I/SKY SWORD-I (produzido em Taiwan), os principais mísseis ar-ar utilizados pela Força Aérea chinesa são: os AA-10/ALAMO que são equiparáveis ao AIM-7/SPARROW de Taiwan; os PL-2A, PL-5B IR (detecção por infra-vermelhos) e PL-8A IR que se encontram nos J-7 e os PL-4 e PL-10 de detecção semi-activa por radar transportados pelos J-8II os quais são basicamente equivalentes aos mísseis operados pela Força Aérea de Taiwan. A curto prazo a China terá no seu inventário um maior número de AAMs AR (anti-radar) passíveis de utilização por um maior leque dos seus aviões do que Taiwan. Caso se confirme a compra do AA-12/ADDER - um míssil que possui uma elevada velocidade terminal o que dificulta as manobras de evasão do avião alvo - por parte de Pequim, os Estados Unidos deverão libertar dos seus armazéns os AIM-120 que haviam sido adquiridos em meados da década de 90 por Taiwan e aguardavam distribuição operacional até à introdução por parte da FAEPL de mísseis ar-ar com idênticas capaci­dades44. Igualmente é de salientar a possibilidade de os J-10 virem a ser equipados com o míssil PYTHON-3 de fabrico israelita (considerado o mais avançado míssil ar-ar de curto alcance em serviço no mundo).
 
Quanto à defesa anti-aérea, Pequim terá também comprado à Rússia, 144 mísseis anti-radar AA-10, 96 mísseis ar-ar R60 (guiados por infra-vermelhos) e de uma centena de mísseis ar-ar de curto alcance AA-11, havendo fortes indícios de que o Kremlin terá validado a venda de mísseis anti-radar Kh31PO, e enviado 144 mísseis anti-aéreos 48N6E destinados à defesa de Pequim e da região de Tianjing bem como 4 sistemas de lançamento S-300 PMU-1 (equivalentes aos PATRIOT PAC-1, prosseguindo ainda as negociações com vista à obtenção de sistemas avançados S-300 PMU-2 e S-300V - equivalentes aos PATRIOT PAC-3) que foram integrados no sistema de defesa aérea chinês quer a nível táctico (defesa das bases aéreas onde se situam os Su-27 e os Su-30) como estratégico (defesa da capital e de silos de mísseis).
 
Pequim iniciou um programa nativo de investigação e desenvolvimento de um míssil designado por HQ-9, havendo relatórios do Pentágono de que o mesmo tem por base a tecnologia de um míssil PATRIOT comprado a Israel em 1993 e dos S-300 PMU45. Ainda que algumas notícias apontem para a possibilidade de 2005 a China poder possuir cerca de 740 mísseis de defesa anti-aérea46, não se prevê que Pequim consiga obter uma capacidade operacional e integrada de defesa aérea estratégica nos próximos dez anos, uma vez que a tecnologia empregue tem um atraso de uma geração relativamente aos sistemas ocidentais. Ao nível táctico as perspectivas são mais risonhas ainda que o cenário seja o de uma capacidade limitada assente na mobilidade relativa dos sistemas empregues.
 
A China adquiriu paralelamente 4 bombardeiros TU-26 de longo raio de acção, enviando ciclicamente pilotos para treino na Rússia em simuladores de aviões de elevada performance, como o TU-204, o SU-22, SU-24, SU-25, MiG-29, Mig-31 e aviões de transporte IL-7647. Esta aquisição visa a substi­tuição parcelar dos seus velhos regimentos de B-6/BADGER e B-5/BEAGLE, os quais para além de serem bastante lentos não possuem uma capacidade de stand-off (bombardeamento sem visualização do alvo) o que os torna extremamente vulneráveis às defesas anti-aéreas. O desenvolvimento de uma nova versão do BADGER visa a possibilidade de este poder transportar mísseis de cruzeiro ar-terra (ALCM) os quais poderão ser passíveis de emprego sobre Taiwan.
 
Uma outra prioridade de aquisição envolve vários sistemas de vigilância e controlo aéreo do tipo PHALCON, que serão instalados em aviões BERIEV A-50I, nos quais a indústria israelita de aeronáutica Elta montará um radar de fase. Segundo alguns relatórios, a FAEPL já terá feito a compra de um avião, com opção para mais três num total estimado em cerca de 250 milhões de dólares como forma de contrabalançar os E-2C HAWKEYE de Taiwan48. Este avião, dependendo dos sub-sistemas electrónicos nele instalados, poderá conferir ao EPL a capacidade de análise e de apoio a operações ofensivas e defensivas. As suas ligações com os vectores navais e terrestres poderão reforçar a capacidade de defesa anti-aérea destes e são fundamentais para o potenciar da capacidade estratégica de comando e controlo e de melhorar a coordenação das operações militares combinadas. Basicamente o seu radar terá uma abrangência de cerca de 700 quilómetros, o que com a futura aquisição de novos PHALCON e a absorção tecnológica chinesa do sistema poderão garantir com um efectivo mínimo de oito aeronaves a vigilância 24 sobre 24 horas do Estreito de Taiwan divididos em duas áreas de vigilância, o que permitirá igualmente o apoio aéreo e naval a uma operação de bloqueio naval de Taiwan. Numa outra vertente Pequim tem programado a produção e o aperfeiçoamento (sob licença) dos helicópteros Z-8 e Z-9 os quais irão equipar as fragatas do tipo JIANGWEI e os destroiers da classe LUHU.
 
Numa outra vertente, mas igualmente multiplicadora de potencial, a China adquiriu desde o início até meados da década de 90, 22 aviões pesados de transporte IL-76M de fabrico russo, mais concretamente três em Outubro de 1990 e posteriormente mais sete e doze ao preço de 520 milhões de dólares com os restantes 40% a serem pagos em produtos de consumo49. Estes aviões têm a capacidade de transportar 125 paraquedistas ou até 50 toneladas de carga num raio de acção de 5000 km e em apenas seis horas, o que confere ao EPL um ainda residual potencial de emprego de forças rápidas aerotransportadas (como já referido anteriormente, a pedra de toque da actual doutrina militar chinesa)50 Existem notícias que apontam para a intenção da FAEPL em adquirir a médio prazo 4 AN-124 (que possuem uma capacidade de transporte ligeiramente superior ao C-5 GALAXY norte americano), ainda que os custos de manutenção e operação destas aeronaves são extremamente onerosos e parecem condicionar a decisão da Comissão Militar Central. Neste campo, Pequim terá de investir substancialmente na importação ou construção sob licença deste tipo de meios, se quiser credibilizar a sua capacidade de projecção de poder quer no plano interno quer no plano externo, sem ter de recorrer à aviação civil.
 
Paralelamente, as chefias militares chinesas têm sondado frequentemente o específico mercado internacional das empresas que detêm a tecnologia do reabastecimento em voo, condição sine qua non para a materialização do primeiro passo em direcção a uma efectiva projecção de poder. Em 1986, uma empresa britânica chegou a assinar um memorando de entendimento com vista ao fornecimento de vinte sistemas de reabastecimento aéreo idênticos aos utilizados pela Royal Air Force. No entanto, ante pressões do Japão e dos Estados Unidos (via COCOM), a venda acabaria por ser cancelada, não sem antes se terem efectuado algumas visitas e trocas de informação técnica entre as duas partes. Desde então, Pequim voltou-se para a “fonte israelita”, existindo planos de adaptação do bombardeiro Y-8 ou H-6 como aviões tanque de reabastecimento dos Q-5 e dos Su-27. Segundo algumas fontes, foi montada em Zhanjiang (na região oposta à ilha de Hainan) uma base de treino para reabastecimento aéreo51. Igualmente existem notícias não confirmadas que apontam para a recente aquisição de 4 IL-78 por cerca de 1 bilião de dólares. A confirmarem-se tais notícias a FAEPL terá adquirido a capacidade de reabastecimento aéreo de cinco Su-30MK num raio de acção de 2, 300 quilómetros. Mesmo assim, as operações de reabastecimento aéreo requerem uma elevada competência profissional e uma factura de despesa considerável que resta saber se a China estará disposta a manter sem restrições operativas. Apesar destas legítimas preocupações com o treino de pessoal, não se prevê que a FAEPL venha a operacionalizar eficazmente esta modalidade antes de meados da primeira década de 2000.
 
Mesmo assim - e não obstante a introdução de todos estes novos meios avançados de combate, e das propaladas e muitas vezes especulativas notícias que referem a aquisição de material sofisticado por parte da EPL (em termos gerais)52, como se a China dispusesse de fundos ilimitados - e na realidade a FAEPL irá continuar a debater-se com consideráveis problemas técnicos e logísticos relacionados com a absorção deste equipamento. Mesmo com a intensa colaboração técnica russa, a força aérea chinesa demorou três anos a inserir operacionalmente os SU-27, o que racionalmente pode significar que com a entrada progressiva ao serviço dos F-10, F-11 e dos SU-30, estes modelos só estarão em condições de emprego operacional dentro de cinco anos (2006).
 
Não menos importante, a FAEPL tem tido sérias dificuldades de manutenção com os Su-27, demonstrando que aparentemente não se encontrava preparada para os custos associados à operação dos aviões53. Mas o verdadeiro calcanhar de Aquiles da FAEPL situa-se ao nível da qualidade dos seus pilotos, que apresentam uma confrangedora ausência de experiência de combate, não treinam sob situações realistas ou sob condições meteorológicas adversas, tudo sob a argumentação de preservar apertadas normas de segurança54. De facto, os pilotos chineses possuem uma média de 60 horas anuais de voo contra cerca de o dobro dos seus congéneres de Taiwan. Enquanto esta prática mantém bastante baixa a percentagem de acidentes, por outro lado não permite explorar convenientemente as capacidades destes novos aviões55.
 
Quanto a Taiwan, são por demais conhecidos os problemas de desenvolvimento e de inserção operacional de novos aviões, os quais remontam aos finais da década de 8056. A produção dos 130 IDF foi concluída este ano, estando estes aviões equipados com os novos AAM AR TIEN CHIEN-II (SKY SWORD-II). Os 150 F-1657 norte americanos foram entregues em 1997 e estão equipados com os mísseis SPARROW e SIDEWINDER. Os 60 MIRAGE 2000-5 foram entregues na sua totalidade em 1998 que com os seus quatro mísseis MICA AR e os dois MAGIC II IR o tornam no mais formidável caça de defesa aérea do inventário de Taiwan. A estratégia actual da Força Aérea de Taiwan (FAT) assenta no emprego dos IDF para missões de intercepção a baixa altitude e de ataque ao solo; os F-16 para intercepção a média altitude e sobre o mar, bem como para ataque ao solo; e, os MIRAGE 2000-5 para intercepção de elevada altitude e para além do Estreito. Taipé planeia igualmente proceder a um programa de modernização dos seus 100 F-5 como forma de obstar a uma acentuadamente descendente curva tecnológica, que partilha com Pequim58.
 
2.4.     Os Meios Navais
 
Numa perspectiva global a MEPL é a terceira maior a nível mundial, sendo genericamente equivalente em número (não em armamento) à Frota Russa do Pacífico - apesar de esta se ter vindo a degradar consideravelmente. No entanto, em termos qualitativos, e em comparação com as suas congéneres japonesa, indiana, taiwanesa e da ASEAN (somando-se o potencial das respectivas marinhas nacionais) apresenta uma inexorável décalage 59.
 
Como sublinhou o seu sucessor à frente da MEPL, o Almirante Zhang Lianzhong, “o actual programa de modernização visa o desenvolvimento de mísseis guiados, de guerra electrónica, de capacidade nuclear e automatização de sistemas, que deverão ser alcançados gradualmente por intermédio da reparação e da reconversão de velhos navios, da importação e transferência de tecnologia, bem como a melhoria dos actuais modelos”60. No entanto, quarenta anos de negligência, deixaram a MELP à beira da obsolência material, carenciada de modernização em quase todas as áreas (desde o armamento até à electrónica). Genericamente, e colocando a situação da forma o mais simplista possível, a sua indústria naval apresenta um deficiente nível de construção de cascos, e peca por um confrangedor índice na formação da sua mão-de-obra e no desenvolvimento de motores suficientemente poderosos e fiáveis. Com efeito, com base em relatórios vindos a público por intermédio de adidos militares em Pequim, que tiveram a oportunidade de visitar fragatas da classe JIANGHU, estas apresentavam claros problemas de design, sem compartimentos estanques destinados à limitação de danos, nem um sistema centralizado de controlo destes, o que adicionado ao quase inexistente treino das tripulações perante situações de emergência, deixava transparecer uma considerável debilidade estrutural61. A MEPL tem mesmo assim, e como não podia deixar de ser, vindo a modernizar paulatinamente as suas forças, socorrendo-se de uma estratégia bífida de aquisição de meios: recorrendo tanto a destroiers, fragatas lança mísseis e submarinos produzidos autóctonamente (nomeadamente fabrico dos cascos a que adiciona tecnologia importada62), como a plataformas mais sofisticadas oriundas da Rússia e dos antigos Estados da ex-URSS. Esta opção prende-se com o facto de a China ser um dos maiores construtores navais militares, saindo anualmente dos seus estaleiros vários e novos modelos e classes de navios: os destroiers das classe LUHU e LUDA III, a fragata da classe JIANGWEI, os navios de patrulha HULUDAO, o navio de reabastecimento modelo DAYUN e variadas lanchas anfíbias e de desembarque. Com esta “sintomatologia industrial e tecnológica” é compreensível que Pequim centre a sua atenção na aquisição de equipamento naval russo que lhe garanta uma - por enquanto - razoável capacidade de projecção de poder, nomeadamente por intermédio de submarinos e destroiers da classe SOVREMENNY.
 
O actual plano de modernização visa prioritariamente a obtenção de capacidades passíveis de utilização num eventual conflito sobre o Estreito de Taiwan, que poderá hipoteticamente se alargar ao Japão e aos EUA. As chefias da MELP definiram como vectores de importância primordial a compra de plataformas que permitam a prossecução de uma estratégia marítima ofensiva de negação de acesso (particularmente ao Estreito de Taiwan) através da encomenda dos excelentes destroiers russos da classe SOVREMENNY - originalmente desenvolvidos para fazer frente aos seus homónimos da OTAN - e do fabrico nacional de submarinos convencionais da classe SONG e da importação de submarinos da classe KILO de origem russa63.
 
A China acordou em adquirir dois destroiers SOVREMENNY, os quais serão armados com oito mísseis anti-navio MOSKIT (SS-N-22 SUNBURN) desenhados para obstar ao poder aero-naval norte-americano, bem como quarenta e quatro mísseis terra-ar URAGAN (SA-N-7 GADFLY)64. Os navios foram construídos em São Petersburgo, tendo sido entregues no final de 2000, numa altura em que as tripulações chinesas enviadas para a Rússia já se deverão ter concluído o seu treino. Se a China conseguir operar os destroiers e os temíveis SS-N-22 em conjugação com os submarinos KILO, o sistema AWACS PHALCON e os SU-27 ou Su-30 (só provável no final da década) poderá criar uma séria ameaça ao vasos de guerra que não se encontrem protegidos por uma força naval americana, ou por um sistema de defesa AEGIS.
 
Possivelmente os destroiers da classe SOVREMENNY serão reforçados por mais alguns da classe LUHAI (de 7 mil toneladas), cujo primeiro foi lançado à água em início de 1999 nos estaleiros de Dalian no nordeste da China. Esta classe tem a particularidade de a grande maioria dos seus sistemas de armas, de guerra electrónica e de propulsão serem importados ou o resultado da reversão de tecnologia: mísseis anti-navio MOSKIT (origem russa), dois helicópteros de guerra anti-submarina KAMOV Ka-28 (fabrico russo), tor­pedos italianos, mísseis anti-navio YING JI-1 (versão chinesa do Exocet francês), sistemas eléctricos e electrónicos alemães e turbinas a gás ucranianas65. Este navio será substancialmente maior que o da classe precedente (LUHU)· representando um assinalável incremento da capacidade naval chinesa na direcção da materialização de uma marinha de águas profundas. A classe LUHU tem sofrido igualmente uma remodelação estando actualmente a serem construídos modelos equipados com turbinas a gás ucranianas e à imagem da classe LUHAI com uma miscelânea imprevisível de sistemas electrónicos oriundos da Rússia, da Itália e da Holanda, podendo vir a possuir uma versão naval do HQ-9 ou o míssil russo de cruzeiro YAKHONT.
 
As fragatas têm sofrido igualmente uma evolução geracional. As JIANGHU I, II e III têm sido modernizadas (especialmente a primeira versão)66. Existem no entanto, alguns indicadores de que a futura espinha dorsal em termos de fragatas da MEPL será a nova classe JIANGWEI. De facto, desde 1991 (ano de lançamento da primeira) que a Marinha comprou 8 destas fragatas, as quais apesar de basicamente possuírem o hardware da classe JIANGHU III, apresentam uma notável melhoria ao nível dos radares e dos mísseis anti-aéreos e anti-navio de fabrico ocidental (modelo CROTALE) e de produção local (HQ-61, C-101, C-30167) os quais se consubstanciam como um importante “multiplicador de força”.
 
A MEPL recebeu também em 1999 a segunda versão do projecto 636 dos submarinos da classe KILO, encontrando-se em fase de negociação a possível compra da versão III do 636 (num negócio de 800 milhões de dólares) capaz de lançar verticalmente os mísseis de cruzeiro como os YAKHONT ou os ALPHA. Infelizmente, os chineses têm tido sérias dificuldades na operação da primeira versão deste projecto (entregue em 1997) devido ao défice existente em pessoal devidamente treinado. Este facto deve-se à opção (discutível) de enviar para a Rússia para treino um pequeno lote de oficiais, complementando os quadros orgânicos com pessoal proficiente na operação dos dois tecnologicamente menos avançados submarinos do projecto 877EKM, obtidos em 1995 (ambos de fabrico russo). Quando os submarinos do projecto 636 foram entregues, as chefias militares foram confrontadas com a desagradável constatação de que estes diferiam substancialmente do 877EKM, que entretanto por problemas de geradores e por acidentes resultantes da má operação e do deficiente treino das respectivas tripulações estiveram inactivos durante dois anos (1997-98)68.
 
Paralelamente, o MEPL tem avançado com a opção de encomenda de submarinos eléctricos e a diesel da classe SONG construídos localmente enquanto procura concluir o desenvolvimento dos novos sistemas evolutivos: o Tipo 093, de propulsão nuclear e que é mais ruidoso que o homólogo russo da classe VICTOR III e o Tipo 094, balístico de propulsão nuclear, cuja inclusão e inserção no MEPL está prevista respectivamente para o ano de 2003 e para meados desta mesma década. O primeiro submarino da classe SONG entrou ao serviço em 1997, tendo a sua introdução o objectivo de substituir os seus antiquados e ruidosos congéneres da classe ROMEO e MING 69. No entanto, o modelo SONG tem sofrido de sistemáticas dificuldades operativas resultantes das deficiências em conjugar eficazmente a panóplia de sistemas e de tecnologias que a Marinha se limitou a “colar” no casco deste submarino, tornando-o excessivamente ruidoso. Segundo algumas fontes abalizadas, o submarino do Tipo 093 pode ser tecnologicamente comparável à segunda geração do submarino russo da classe VICTOR III SSN, enquanto que o Tipo 094 tem previsto o transporte de 16 mísseis balísticos JULONG‑2 (JL-2), que se encontram em fase de desenvolvimento. A premência na construção destes submarinos prende-se com o aumento da idade e dos problemas técnicos que os submarinos nucleares de primeira geração da classe HAN 70 e XIA têm atravessado, especialmente no que se refere aos seus propulsores nucleares que apresentam uma reduzida autonomia, o que os obriga a operarem por curtos períodos, sempre em águas costeiras e não ultrapassando a profundidade de 50 metros71.
 
A esquadra de forças anfíbias chinesas tem a capacidade para transportar aproximadamente uma Divisão de Infantaria. A MEPL possui igualmente a possibilidade de se socorrer de centenas de outros navios (maioritariamente civis) para transportar tropas e aumentar tal capacidade de transporte. No entanto, são notórias as deficiências em termos de transporte de longo alcance, em apoio logístico, e apoio aéreo à projecção de forças anfíbias muito para além da costa chinesa.
 
Apesar dos rumores de meados da década de 90, nos quais se ventilava o interesse da MEPL na compra de um porta-aviões (especialmente o ucraniano VARYAG de 67,500 toneladas, o qual acabaria por ser adquirido por uma empresa de Macau72), a liderança militar optou por protelar uma eventual aquisição até ao início da próxima década, uma vez que a China não enfrenta uma ameaça marítima imediata e ainda persistem alguns obstáculos de índole prática: o astronómico preço de compra, a falta de equipamento especial, a ausência de treino e de defesa aérea envolvente a um tal grupo de combate naval, para não mencionar nas repercussões político-diplomáticas que a obtenção de tal capacidade ofensiva traria para a estabilidade regional. Mesmo assim, é possível que a China opte por um porta-aviões de menor tonelagem, similar ao modelo espanhol BAZAN vendido à Tailândia e de 11,500 toneladas, ou por um russo da classe KIEV de 40,000 toneladas73.
 
Em suma, apesar da superioridade numérica da MEPL, apenas uma pequena percentagem dos seus meios possuem capacidade oceânica (cerca de vinte destroiers). Tal situação prefigura uma capacidade limitada de efectuar um bloqueio naval em redor da ilha, podendo no entanto, e em conjugação com os meios submarinos interditar o tráfego marítimo em direcção aos portos de Taiwan. Em termos de combate naval, com a sua congénere “independentista” a MEPL poderá auferir de uma significativa vantagem quantitativa, cuja superioridade só poderá ser posta em causa pela Força Aérea de Taiwan, caso esta consiga obter uma situação de superioridade aérea sobre o Estreito.
 
Quanto à Marinha de Taiwan (MRC) possui no seu inventário cerca de 40 navios de superfície, 4 submarinos, 100 barcos de patrulha, 30 draga-minas, e 25 navios de transporte anfíbio. Apesar do esforço de modernização e de extensão da vida operacional dos seus vasos de guerra, uma parte considerável da Marinha de Taipé é ainda formada por navios obsoletos datados da Segunda Guerra Mundial. A missão principal da MRC é a defesa da ilha contra um eventual bloqueio chinês e salvaguardar a liberdade de navegação nas linhas marítimas de comunicação. Dos seus 4 submarinos a diesel, dois são classe ZVAARDVIS (classe HAI LUNG) de origem holandesa adquiridos em finais da década de 80, possuindo torpedos filo-guiados, sendo os restantes dois submarinos da classe GUPPY II (remanescentes da Segunda Guerra Mundial e comprados aos Estados Unidos em 1973) empregues para treino de combate anti-sub­marino e lançamento de minas. Em 2001, os EUA aprovaram a venda de 4 submarinos a diesel a Taiwan, à luz do Taiwan Relations Act, os quais serão presumivelmente adquiridos novamente à Holanda, se bem que a oposição e a pressão de Pequim sobre o governo de Amsterdão possa fazer gorar o negócio.
 
O programa de modernização da frota de superfície (apelidado de Kuang Hua ou “China Gloriosa”) inclui a produção sob licença de 8 fragatas americanas da classe PERRY (classe CHENG KUNG); a compra de 6 fragatas francesas da classe LAFAYETTE (classe KANG TING), 3 das quais já entregues; e, a aquisição em sistema de leasing de 8 fragatas americanas da classe KNOX. Enquanto as duas primeiras classes estão equipadas com mísseis anti-navio Hsiung Feng II (de produção local), a última possui mísseis Harpoon (de fabrico americano). Os sistemas de defesa anti-aérea incluem o sistema Standard (nas fragatas americanas) e o Sea Chaparral (nas fragatas francesas). A missão primária destas fragatas centra-se no controlo dos mares, particularmente na protecção das linhas marítimas de comunicação para além do raio de acção dos aviões de patrulha e dos caças. Existem ainda algumas dezenas de destroiers da Segunda Guerra Mundial da classe GEARING bem como um pequeno número de navios auxiliares. O programa Kuang Hua contempla a futura aquisição de três tipos de navios de superfície de menor tonelagem: 12 patrulhas lança-mísseis oceânicos da classe JIN CHIANG); 10-14 corvetas; e, cerca de 50 lanchas rápidas de ataque lança-mísseis de forma a substituir a velha frota da classe HAI OU.
 
A Força Aérea da Marinha de Taiwan é composta por 10 helicópteros HUGHES MD 500 de luta anti-submarina (empregues em conjunto com os destroiers da classe GEARING) e 9 Sikorsky S-70C (empregues em conso­nância com as fragatas da classe PERRY e LAFAYETTE). Os cerca de 30 aviões de vigilância e luta anti-submarina S-2T TRACKER foram recentemente inseridos organicamente na Marinha.
 
2.5.     Os Meios Terrestres
 
Actualmente a China possui cerca de 70 Divisões das quais 15 foram designadas como forças de reacção rápida: unidades de armas combinadas capazes de se deslocarem por terra ou por ar no interior do território nacional sem necessidade significativa de alocação de recursos logísticos adicionais. O 15º Grupo de Exército (GE) aerotransportado possui três divisões cada uma com cerca de 10 mil efectivos. Este GE é a principal força de reacção rápida (quantou - FRR) passível de poder ser empregue em caso de conflito com Taiwan. O 31º GE sediado em Fujian é igualmente passível de ser utilizado em caso de conflito com Taiwan74. Ambos padecem de uma limitada capacidade de air lift. Com a Guerra do Golfo, a liderança do EPL centrou a sua atenção na condução do treino e implementação operacional de forças de operações especiais, às quais poderão ser atribuídas missões e tarefas em território insular como: localização e destruição de nódulos C4I e de transportes, depósitos logísticos, captura e destruição de aeródromos, destruição de sistemas de defesa anti-aérea, e condução de operações de reconhecimento75.
 
Tradicionalmente as forças do EPL são coesas, patrióticas, bem preparadas fisicamente e muito bem treinadas em tarefas básicas de combate próximo. Possuem um assinalável potencial ao nível das comunicações operacionais, e no emprego de estratégias de combate assimétrico, fazendo-se valer da sistema­tização do treino da camuflagem, protecção e decepção. As suas fraquezas principais revolvem em torno da deficiente capacidade de transporte e de apoio logístico; de uma deficiente liderança ao nível táctico, das limitações em implementar operações combinadas, e de um moral que se pode definir como não dos mais elevados entre os quadros de conscritos. A ausência de um sistema de oficiais contratados, de uma endémica sub-valorização cultural e técnica dos seus quadros inferiores, associada a práticas de algum nepotismo ao nível das promoções de carreira condicionam ainda mais os factores de ordem moral do Exército. Os baixos salários e a ruptura dos laços familiares (resultantes de comissões em áreas longínquas da China relativamente aos principais centros urbanos) limitam a captação de efectivos com um nível educacional capaz de operar alguns dos mais sofisticados sistemas de armas. A liderança do EPL tem vindo de forma progressiva a tentar combater estas deficiências, sendo apoiada por poder político que não tem recusado o aumento sistemático do orçamento de defesa desde 1991 onde uma quota muito importante é destinada às despesas com o pessoal (melhoria de salários e de infra-estruturas de apoio às famílias de militares) como meio de cativar um maior número de voluntários.
 
No que concerne a Taiwan, o seu Exército possui um efectivo total de cerca de 220 mil homens, aos quais compete a missão de defenderem todo o território insular de uma possível invasão. 80 por cento dos efectivos estão sediados em Taiwan, sob o controlo de três corpos de Exército. Os restantes três comandos correspondem às ilhas de Xianmen, Matsu e Quemoy, os quais englobam mais de 50 mil homens. Em 1997, o Exército iniciou uma extensa campanha de reestruturação com o intuito de incrementar a sua capacidade de combate, concedendo uma maior ênfase ao treino de forças de reacção rápida, operações aerotransportadas, e operações especiais76. Aparentemente o plano prevê a redução de mais de 20 mil efectivos. Os três corpos de Exército permanecerão intactos, mas as divisões serão abolidas como grande unidade básica operacional, dando o seu lugar a brigadas independentes de armas combinadas. O seu programa de aquisição de armamento contempla a compra de 450 carros de combate M-60A3 e 42 helicópteros de ataque AH-1W COBRA, bem como 26 OH-58D KIOWA.
 
2.6.     Outros Factores Influenciadores da Dinâmica Militar
 
Como ficou definido nas primeiras páginas deste estudo, iremos agora efectuar uma incursão sobre os factores de software do poder militar entre os dois lados do Estreito. Ainda que reconhecendo a limitação e subjectividade desta abordagem, as observações em baixo efectuadas servem como uma referência ou linha de base, a partir da qual se poderão futuramente aquilatar evoluções ou involuções específicas.
 
2.6.1.    Liderança Militar
 
A liderança do EPL aborda as noções de comando de forma algo diversa das suas congéneres ocidentais, conferindo uma maior importância ao desenvolvimento de capacidades técnicas do que aos meandros da arte de liderar. Por razões de natureza histórica e até ao início da década de 90, as chefias militares eram avessas ao contacto com entidades homólogas, preferindo um isolamento apoiado numa justificação de carácter eminentemente nacionalista, onde o intercâmbio com outros países eram interpretados como tentativas imperialistas de descortinar as fraquezas e potencialidades do aparelho militar chinês. Com o levantamento das sanções resultantes dos acontecimentos de Tienanmen, e a subida ao poder castrense de uma nova geração de generais “profissionalmente mais liberais”, o EPL avançou com um extenso programa de modernização militar nos seus mais diversos vectores operacionais, programa esse que tem o condão de unir e gerar o consenso entre as elites políticas e militares. A inclinação por um modelo mais profissional, ainda que umbilicalmente ligado ao Partido Comunista, tem potenciado a implementação de vertentes empíricas e práticas mais específicas da vida militar, e de um menor pendor da influência do doutrinamento político por intermédio da cadeia de comando dos comissários políticos do EPL, o que poderá conduzir à implementação de um quadro de oficiais subalternos e superiores menos politizados e mais proficientes tecnicamente. Paralelamente tem-se verificado uma preocupação com o ajustamento dos avanços técnicos com a definição e implementação doutrinária de emprego do EPL ajustadas à estrutura de forças.
 
A liderança militar de Taiwan pode-se considerar, de um modo geral, como competente e profissional. Em comparação com os seus congéneres continentais, os militares insulares exibem um maior grau educacional, o que lhes confere uma vantagem na operação de sistemas de armas sofisticadas. No entanto, contra estes atributos, o corpo de oficiais das forças armadas de Taiwan (FAT) valorizam excessivamente a precaução face à inovação e à iniciativa. Os oficiais subalternos denotam uma grande capacidade de adaptação a novas situações tácticas, mas a introdução de novos sistemas de armas poderá gerar algumas dificuldades na operação maximal dos mesmos. As FAT têm-se entretanto confrontado com dificuldades em captar novos voluntários para as fileiras, muito devido ao facto de a carreira no sector privado ser mais aliciante e financeiramente mais compensadora77. Um factor que merece igual preocupação tem sido os mais recentes casos de acusação de corrupção entre as chefias militares, resultantes ou associadas a concursos de aquisição de armamento francês, os quais conduziram inclusive à prisão de três majores-generais78. O Exército continua a dominar as fileiras, constituindo mais de 50 por cento dos efectivos, dominando o topo da hierarquia militar. No entanto, os recentes programas de redução de efectivos e de modernização dos meios contempla a redução do número de generais no activo, notando-se uma tendência para uma maior ascensão de oficiais da Marinha e da Força Aérea ao topo da hierarquia, os quais curiosamente são mais pró-independência e nativos de Taiwan. Se o programa de modernização for levado até ao fim, crê-se que as FAT poderão vir a ser a curto prazo, umas forças militares mais coesas e moralizadas apoiadas numa estrutura humana onde predominam homens nascidos na ilha79.
 
2.6.2.    Treino
 
Nos anos mais recentes, a China tem vindo a desenvolver e a aperfeiçoar novas facetas de treino operacional. O treino tem sido mais realista e com um progressivo maior grau de dificuldade, onde forças opositoras são integradas nos exercícios que possuem uma componente de aperfeiçoamento das operações combinadas. Ao nível táctico a performance tem melhorado, mas continuam a notar-se sérias dificuldades ao nível estratégico.
 
Mesmo assim e dada a importância conferida a Taiwan pela liderança política chinesa, a ilha assume um papel fulcral nos cálculos estratégicos do EPL que não hesita em atribuir um elevado grau de confidencialidade aos sistemáticos estudos que efectua. Com efeito, dos livros e jornais militares disponíveis para consulta ou aquisição por parte de estrangeiros apenas o jornal Junshi Wenzhai (Resenha Militar)80 publica regularmente artigos sobre as defesas militares de Taiwan, os quais permitem inferir valiosas percepções sobre o pensamento e o planeamento levado a cabo pelo EPL com vista à penetração das defesas aero-navais da ilha, às formas de “empastelar” os sistemas C4I, a métodos de destruição de submarinos, passando pela neutralização da superioridade aérea de Taiwan, pelo emprego de mísseis balísticos e pela análise da infusão e capacidades dos novos sistemas de armas americanas vendidas a Taiwan. Apesar desta limitação imposta a estrangeiros no que à análise do EPL sobre as questões militares de Taiwan é óbvio que as mesmas são alvo de uma intensa abordagem nas instituições militares, existindo na Universidade de Defesa Nacional (UDN) um curso para os actuais Oficiais superiores sobre o armamento e as forças militares de Taiwan. Concomitantemente, um considerável número de jogos de guerra são levados a cabo nos centros de simulação da Universidade de Defesa Nacional, da Academia de Ciências Militares, no Quartel General da Região Militar de Nanjing, e em outras unidades do EPL81. Igualmente, a profusão de exercícios militares conjuntos realizados pelo EPL durante a década de 90 nas regiões militares passíveis de mobilizarem meios face a Taiwan permitem igualmente aferir a importância conferida à preparação das forças. O quadro 3 refere os principais.
 
No que concerne a Taiwan, o seu plano de exercícios militares possui uma periodicidade quadrimestral os quais se desenrolam nos principais centros de instrução e treino e são efectuados sempre com fogos reais. O planeamento destes exercícios tem visado treino de operações conjuntas, com especial ênfase no aperfeiçoamento da defesa e funcionamento dos centros C4I, defesa contra operações anfíbias, aerotransportadas e de bloqueio naval. O realismo conferido ao treino tem trazido alguns dissabores à liderança política e militar de Taiwan, sendo frequentes a ocorrência de acidentes durante os mesmos, muitos dos quais com baixas humanas e em material sofisticado. Por exemplo entre Fevereiro e Abril de 1998, um avião de treino T-38 despenhou-se tendo morrido o piloto; um helicóptero TH-55 caiu tendo morto os dois tripulantes; uma fragata da classe KNOX colidiu com uma outra da classe PERRY na base naval de Tsoying; um caça F-16 desapareceu no mar; e um avião MIRAGE ficou seriamente danificado quando colidiu com um pombo perto da base de Hsinchu82. Em Junho de 1998, a Força Aérea de Taiwan revelaria que entre 1995 e finais de 1997, 22 oficiais tinham perecido em acidentes militares, prometendo uma ampla investigação. No entanto, em Julho um barco patrulha chocaria com um recife perto da ilha de Penghu, e em Setembro um avião de treino da Academia da Força Aérea incendiar-se-ia, ferindo ligeiramente o piloto. Em 1999, dois aviões F-16 despenhar-se-iam em diferentes exercícios.
 
2.6.3.    Formação Profissional Militar
 
A educação profissional do actual quadro de oficiais é uma das maiores prioridades para a liderança política de Pequim. Até 1978 e fruto da Revolução Cultural, as instituições vocacionadas para o ensino militar estiveram ausentes do panorama universitário chinês. Este cenário foi desde então consideravelmente modificado, tendo sido criadas várias Academias Militares e Institutos, cujo apex é a Universidade de Defesa Nacional (UDN), a qual lecciona cursos de estudos estratégicos, de arte operacional, de organização, comando e gestão, de operações conjuntas e combinadas, sobre forças militares de outros países, sobre apoio logístico, aos oficiais superiores do EPL. A UDN funciona igualmente como um instituto de aconselhamento político e de investigação e desenvolvimento.
 
As Academias Militares materializam o segundo nível de ensino militar, preparando os seus alunos para o comando de unidades regimentais e a condução de operações conjuntas e combinadas. O currículo centra-se no treino de tácticas ao nível de Companhia, Batalhão e Regimento. Algumas destas Academias formam igualmente oficiais especializados em engenharia e comunicações.
 
Finalmente, existe uma rede de Colégios Militares que se destinam ao ensino de oficiais subalternos os quais terão de frequentar um curso cuja duração é de quatro anos a que se seguem mais dois de on job training (tirocínio nas unidades). A maioria dos seus alunos possui o equivalente ao 11º ano português.
 
O projecto de um corpo de oficiais contratados está ainda na sua infância, tendo sido estabelecido nos finais de 1980. Quando os conscritos optam pelo voluntariado passam a ser “sargentos-chefes” ou “sargentos técnicos”. Posteriormente os melhores são enviados para os Colégios Militares das respectivas Regiões Militares (RM) onde frequentam um curso de seis meses direccionado para o ensino da táctica de escalão pelotão84.
 
Quanto a Taiwan, o seu sistema de formação de oficiais profissionais contempla duas vertentes de desenvolvimento: uma vertente universal destinada àqueles que pretendem uma carreira nas armas combatentes e uma vertente profissional para aqueles que auguram uma carreira de especialistas como medicina, engenharia ou assuntos políticos. O vertente universal é conduzido em três Academias (uma por cada ramo ou serviço) recebendo os alunos no final do curso de três anos o grau de bacharéis. Após o término do curso os novos oficiais vão para as Escolas Práticas das respectivas armas ou serviços (Infantaria, Artilharia, Administração, etc.) onde efectuam o respectivo tirocínio de dois anos de duração. A vertente profissional é efectuada em institutos ou colégios como o Colégio Médico de Defesa, o Colégio de Administração da Defesa, e o Instituto Chung Cheng de Tecnologia. Os oficiais superiores frequentam cursos de promoção na Universidade das Forças Armadas (UFA), a qual forma especialistas militares em todas as áreas da arte operacional e estratégica, ao mesmo que conduz acções de investigação e desenvolvimento académico. A UFA inclui quatro colégios: o Colégio de Guerra para oficiais generais e os Colégios de Comando e Estado-Maior de cada um dos ramos (Marinha, Exército e Força Aérea).
 
2.6.4.    Operações Conjuntas
 
O EPL tem vindo a implementar um extensivo e intensivo plano de treino táctico entre os respectivos serviços de modo a torná-los numa força de combate mais coesa e integrada. Actualmente várias unidades continuam a treinar simultaneamente e geograficamente próximas, mas não parecem conseguir ser controladas operacionalmente pelo comando conjunto estabele­cidos para os exercícios. As componentes terrestres e aéreas têm treinado em conjunto com frequência, especialmente missões de apoio aéreo próximo (CAS). No entanto, as componentes terrestre e naval raramente têm efectuado exercícios conjuntos, saldando-se as manobras normalmente pela realização de exercícios de postos de comando (CPX). O EPL tem vindo a desenvolver esforços no sentido de implementar operacionalmente conceitos ocidentais como o de “teatro de operações” e de Estados-Maiores conjuntos85.
 
2.6.5.    Moral
 
O moral entre as forças do EPL, especialmente entre os conscritos, é normalmente considerado baixo. De facto subsistem problemas de deserções, degradação das relações entre oficiais e subordinados, relutância em treinar com equipamentos obsoletos, problemas de corrupção nas empresas do EPL (pelo menos até 1999). As actividades comerciais do EPL teve igualmente um condão não muito favorável de fazer divergir para o ramo comercial muitos dos oficiais mais competentes, tendo inclusive degradado a capacidade operacional de muitas das unidades sediadas nas zonas costeiras chinesas86. A decisão de Jiang Zemin em Julho de 1998 de retirar o EPL dos negócios, permitiu limitar as preocupações existentes, o que associado ao incremento do orçamento de defesa destinado às despesas com o pessoal, parece querer direccionar o EPL no sentido de uma maior profissionalização.
 
No que concerne a Taiwan, o moral das suas forças é igualmente baixo entre as fileiras dos conscritos, os quais vêm o cumprimento do serviço militar como uma perda de tempo de dinheiro e de oportunidades que o sector privado oferece a especialistas. A sua tradição de cultura militar e o seu sistema de comando extremamente rígidos desencorajam a inovação e a capacidade de decisão nos escalões tácticos mais baixos. Os recentes escândalos de corrupção não contribuíram (antes pelo contrário) para o aligeirar das tensões e da descrença entre os escalões superiores e inferiores do aparelho militar, as quais têm sido acirradas pelos novos programas de redução de quadros. Igualmente os pilotos da Força Aérea têm-se queixado da acentuada diferença de vencimentos auferidos pelos seus congéneres da aviação civil.
 
2.6.6.    Logística
 
 
O sistema e a doutrina de apoio logístico chinês ainda são o produto, na sua maior parte, de longas décadas de uma estratégia operacional designada de “Guerra Popular”, a qual centrava o fulcro da sua justificação na ameaça de uma invasão terrestre em larga escala por parte da ex-URSS. Ao abrigo de tais disposições doutrinárias, um comandante de uma região militar deveria ter a capacidade e a autonomia para conduzir per se operações militares autónomas por um largo período de tempo. A logística de base destinada ao apoio de tais operações era extremamente descentralizada, assentando em linhas de comunicação remotas no interior da China, e eram optimizadas de forma a garantir a subsistência e o reabastecimento das forças militares com base nos recursos locais. Aos comandantes locais era-lhes conferida uma grande flexibilidade de decisão e de gestão, o que desde cedo dificultou a implementação de um sistema standardizado e nacional de apoio logístico, devido à fragmentação regional de tal sistema. Recentemente o EPL tem vindo a melhorar a cadeia de apoio logístico com vista a um eventual cenário de ataque a Taiwan. Alguns dos procedimentos adoptados têm sido a automatização dos sistemas de controlo de inventário, racionalização do sistema de aquisição de material, e melhoria do sistema de transporte e distribuição de reabastecimentos a unidades operacionais. Ainda que modestos, estes melhoramentos - se sustentados e aperfeiçoados no tempo - poderão a médio prazo contribuir para o assegurar do êxito de operações militares conjuntas e combi­nadas sobre o Estreito de Taiwan87.
 
No que diz respeito a Taiwan, a ilha possui uma capacidade limitada de sustentação logística de operações militares de elevada intensidade. O seu sistema está extremamente dependente da capacidade norte americana de apoio a partir das bases de Okinawa no Japão. Não obstante, as FAT possuem uma boa capacidade de apoio logístico face a operações localizadas e de média intensidade. Face a um cenário mais abrangente, a sofisticação dos seus sistemas de defesa aérea e naval requerem uma maior capacidade de protecção, transporte e distribuição de artigos das mais diversas classes de reabastecimento logístico. Esta é uma vulnerabilidade que Taiwan tarda em eliminar satisfatoriamente.
 
 
3.  Conclusões: Vulnerabilidades, Potencialidades e Riscos
 
Em resumo, até final da década a China deverá possuir a capacidade militar de efectuar um ataque aéreo (mas sem obtenção de superioridade aérea) e de mísseis convencionais sobre Taiwan, os quais não obstante os modernos sistemas de defesa anti-áerea da ilha (sistema MADS e os recentemente adquiridos PATRIOT PAC-3) conseguirão destruir em elevada percentagem os centros C4I e a infra-estrutura económica de Taiwan. Apesar da previsível evolução doutrinária e operacional de combate anti-submarino por parte das forças armadas de Taiwan, a China continuará a reter a capacidade de interditar as linhas de comunicação marítima em redor da ilha e de efectuar um bloqueio “selectivo e limitado” aos principais portos marítimos da ilha. Caso a China opte por uma invasão, tal operação irá requerer um empenhamento bastante considerável dos meios civis de transporte aéreo e naval, o qual será prolongado no tempo, e não terá a garantia de um sucesso absoluto, estando intrinsecamente conectado com a eventual intervenção militar norte ameri­cana.
 
A maior ou menor probabilidade de êxito de uma tal aventura por parte Pequim, encontra-se e continuará a assentar na capacidade que a liderança militar do EPL terá em ultrapassar problemas de recrutamento de voluntários tecnicamente capazes, de interoperabilidade dos meios, de adequada capa­cidade de apoio logístico extensivo e intensivo no tempo, e de integração e consolidação operacional de operações conjuntas e combinadas.
 
Uma conclusão primordial poderemos extrair: qualquer que seja o resultado, a China estará sempre perante uma lose-lose situation. Em caso de um ataque coroado de sucesso e com base numa declaração de independência de Taiwan, os custos associados à devastação provocada na ilha terão um efeito proporcional na imagem de Pequim, e nos seus laços comerciais, de investimento e diplomáticos com a comunidade internacional. Por outro lado, os custos de um falhanço, não ficarão igualmente atrás, pois poderão significar a queda de um regime que busca a consolidação e a sustentação na sua frágil base de “legitimidade interna”. A implosão chinesa daí resultante seria uma verdadeira “Caixa de Pandora”.
 
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*      Sócio Efectivo da Revista Militar.
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 1 As excepções são as disputas sobre os recifes e ilhas do Mar da China meridional que envolvem a China, a Malásia, o Vietname, as Filipinas, o Brunei e a Tailândia; a disputa sobre as ilhas Senkaku/Diaoyu que opõe a China ao Japão; a disputa sobre as ilhas Curilhas que azeda (ainda que ligeiramente) as relações da Rússia com Japão. Para uma análise sobre estas disputas vejam-se respectivamente: Carriço, Manuel Alexandre; (2001); “A China e as Ilhas Spratly: Contributos para a Desmistificação do Modus Operandi de Pequim”; Revista Militar nº 4; pp. 317-346. Carriço, Manuel Alexandre; (2001); “As Ilhas Senkaku/Diaoyu: Diplomacia, Propaganda e Geopolítica Sino-Japonesa”; a publicar pela Revista Militar. Carriço, Manuel Alexandre; (1998); A Conflitualidade Territorial Marítima na Ásia: Uma Incursão na Dinâmica Geopolítica; Monografia apresentada no Curso de Pós-Graduação em Estudos Asiáticos da Universidade Independente.
 2 Ao longo deste estudo os dois termos serão empregues interactivamente, ainda que com maior frequência o termo China se aplique à República Popular da China e Taiwan à República da China.
 3 Esta declaração tem sido frequentemente empregue por vários líderes chineses, incluindo o Ministro da defesa Chi Haotian aquando dos exercícios militares de Março de 1996 e por Zhang Wannian, o actual Chefe de Estado-Maior General do EPL. Veja-se: Miles, James; (2000); “Chinese Nationalism, US Policy and Asian Security”; Survival nº 4; p. 63.
 4 Pequim sempre suspeitou das intenções japonesas face ao futuro de Taiwan, sendo ainda mais relevadas quando após um silêncio jornalístico de mais de vinte anos sobre os assuntos da ilha, a imprensa escrita nipónica iniciaria em 1993 uma intensa cobertura cultural e política sobre Taiwan que se mantém até hoje.
 5 Em 1994 o mercado chinês estava pejado de livros de forte tónica nacionalista - quase todos best sellers - alertando para o reforço das defesas de Taiwan com vista à proclamação da independência e advogando um ataque à mesma. Os mais relevantes eram Zhongguo da Zhanlue: Lingdao Shijie de Lantu (A Grande Estratégia da China: Indicações Com Vista a uma Liderança Mundial) e Zhongguo Keyi Shuo Bu (A China que Diz Não). Para uma revisão crítica sobre ambos veja-se respectivamente The China Journal nº 37, (1997); pp. 180-185 e The China Journal nº 39; (1998); pp. 61-66.
 6 Lam, Willy Wo-Lap; (1999); The Era of Jiang Zemin; Singapore, Prentice Hall; p. 173.
 7 Para uma descrição da proposta de Jiang Zemin veja-se: Carriço, Manuel Alexandre; (2000); “China e Taiwan: História, Belicismo e Empirismo”; Revista Militar nº 2/3; pp. 197-198.
 8 Citado em Gilley, Bruce; Tiger on the Brink: Jiang Zemin and China’s New Elite; Berkeley, University of California Press; p. 253.
 9 Só possível graças ao fortíssimo lobby pró-Taiwan que existe tanto no Congresso como no Senado norte-americano e que tem como patrocinador principal a Fundação Chiang Ching-kuo para o Intercâmbio Internacional fundada em 1989 e que deve o seu nome ao filho de Chiang Kai-shek. Para uma visão sobre a extensão do lobbying político em Washington veja-se: Sutter, Robert G.; (1998); U.S. Policy Toward China: An Introduction to the Role of Interest Groups; Rowman & Littlefield, especialmente a anexo A que descrimina uma extensa lista de organizações ligadas a tais actividades e menciona os respectivos patrocínios.
10 Esta política assentava em três ligações (santong): comercial, de correspondência postal, e de viagens; e de quatro intercâmbios (siliu): académico, cultural, económico, e desportivo.
11 O objectivo da diplomacia coerciva prende-se na necessidade de apoiar uma exigência feita a um adversário com uma ameaça de punição caso este não a aceite, devendo a ameaça ser suficientemente credível e potente de modo a persuadi-lo de que é do seu interesse aceitar a exigência... A diplomacia coerciva é essencialmente uma estratégia diplomática que se apoia mais na ameaça do emprego da força do que no seu uso com vista a alcançar um objectivo. Leia-se George, Alexander; (1994); “Introduction: The Limits of Coercive Diplomacy” em Alexander George e William Simons (Eds); The Limits of Coercive Diplomacy; Boulder, Westview Press; p. 2. Para uma análise concreta sobre os acontecimentos de 1995-96 leiam-se por exemplo: Zhao, Suisheng (Ed); (1999); Across the Taiwan Strait: Mainland China, Taiwan, and the 1995-1996 Crisis; London, Routledge. Ross, Robert; (2000); “The 1995-96
   Taiwan Strait Confrontation: Coercion, Credibility, and the Use of Force”; International Security nº 2; pp. 87-123. Carriço, Manuel Alexandre; (2000); “China e Taiwan: História, Belicismo e Empirismo”; Revista Militar nº 2/3; pp. 187-212. Lilley, James e Chuck Downs (Eds); (1997); Crisis in Taiwan Strait; Washington, National Defense University Press. Garver, John; (1997); Face Off: China, the United States and Taiwan’s Democratization; Seattle, University of Washington Press. Porch, Douglas; (1999); “The Taiwan Straits Crisis of 1996: Strategic Implications for the United States Navy”; Naval War College Review nº 3; pp. 15-48.
12 Cordesman, Anthony; (2000);The Asian and Chinese Military Balance: A Comparative Summary of Military Expeditures; Manpower; Land, Air, Naval, and Nuclear Forces; and Arms Sales; Washington,CSIS; p. 36.
13 Na véspera da terceira vaga de testes balísticos chineses (8 de Março de 1996), Liu Huaqin, director do Gabinete de Política Externa do Conselho de Estado visitou Washington, onde durante um encontro com Anthony Lake, um dos conselheiros de segurança nacional da Casa Branca, confidenciou que a China não tinha intenções de invadir Taiwan, mas aconselhava os EUA a manterem-se afastados da disputa. Segundo algumas fontes chinesas esta revelação destinada a que Washington não reagisse extemporaneamente aos exercícios militares de Pequim, permitiu que os EUA avançassem para uma pública demonstração de força com o envio dos dois grupos de combate dos porta-aviões, certos da não invasão de Taiwan, o que não deixou de ser uma facada nas costas de Jiang Zemin. A uma distância de cinco anos extrapola-se, por paradoxal e irónico que pareça, que o objectivo das manobras militares de Pequim destinou-se a manter a paz sobre o Estreito segundo uma lógica assente em três pontos: (1) a China teria de avançar para a guerra caso Taiwan declarasse a independência; por isso (2) as ameaças de emprego de forças militares reduziriam as probabilidades de uma declaração de independência; e finalmente (3) as ameaças militares diminuiriam a probabilidade de uma guerra.
14 “Taiwan Tensions”; The Washington Post; 4 August 1999; p. 20.
15 Uma sondagem efectuada em 1999, revelou que 87% da população apoiaria uma eventual invasão militar de Taiwan caso esta declarasse a independência.
   Veja-se: http://uschina@listbox.com, acedido em 20 de Julho de 2000. Inversamente uma sondagem efectuada em Abril de 2000 revelou que 45% da população de Taiwan defendia a independência da ilha a longo prazo. Veja-se: http://uschina@listbox.com, acedido em 10 de Outubro de 2000. Aparentemente, parece caminhar-se no sentido de uma polarização das posições das respectivas opiniões públicas.
16 Para uma análise mais detalhada sobre os factores passíveis quer de estabilizar quer de desestabilizar a relação entre a China e Taiwan veja-se: Lin, Chong-Pin; (1996); “The Military Balance in the Taiwan Straits”; The China Quarterly nº 146; pp. 5777-578.
17 São eles: (1) declaração da independência por parte de Taiwan; (2) aquisição de armas nucleares; (3) um cenário de forte instabilidade interna em Taiwan e; (4) intervenção de terceiros em tal cenário de instabilidade.
18 A China efectuou durante a última década um programa intensivo de modernização da sua rede de comunicações militares. Actualmente existem quatro redes: (1) rede telefónica militar; (2) rede telefónica militar de segurança; (3) sistema automático de comando e controlo; e (4) sistema integrado de comunicação táctica. A introdução intensiva de cabos de fibra óptica tem permitido incrementar substancialmente a segurança e a resistência das redes de comunicações nacionais. Veja-se Stokes, Mark; (1999); China’s Strategic Modernization: Implications for the United States; SSI, Carlisle Barracks; pp. 44-52.
20 Lin, Yuen; (1998); “Probing the Capability of Taiwan’s Antiballistic Missiles”; Kuang chiao ching de Hong Kong; pp. 54-61; FBIS-CHI-98-252. Em comparação o custo de três baterias MADS com 180 mísseis orça os 850 milhões de dólares, preço similar a um destroier com o sistema AEGIS. No entanto, deve-se realçar que o valor de um sistema de defesa anti-míssil baseia-se naquilo que é passível de ser defendido e não nos custos das ramas ofensivas do adversário.
21 Lennox, Duncan (Ed); (1997); Jane’s Strategic Weapon Systems, Issue nº 24; Surrey, Jane’s Information Group.
22 Se lançado de uma localização mais próxima do objectivo, o DF-15 terá uma trajectória mais oblonga que aumentará o seu tempo de voo no exterior da atmosfera, incrementando a sua vulnerabilidade a sistemas de defesa anti-míssil do tipo THAAD (Theater High Altitude Anti-Missile Defense). Por outro lado, uma trajectória oblonga permitirá aumentar a velocidade de reentrada do míssil, reduzindo a sua assinatura electromagnética e complicando a intercepção por parte de sistemas de defesa anti-míssil de baixa altitude como o PATRIOT. Lindsey, George; (1998); The Information Requirements for Aerospace Defense: Limits Imposed by Geometry and Technology; Bailrigg Memorandum nº 26; CDISS, Lancaster University; p. 18.
23 Yunshan, Zhao; (1999); China’s Missiles and Strategy: The PLA’s Central Weapon; Hong Kong, Mirror Books; p. 234.
24 Veja-se http//www.wforum.com (acedido em 18 de Janeiro de 2000).
25 É de salientar que em caso de conflito militar sobre Taiwan os Estados Unidos caso decidam ou não intervir, deverão tentar controlar a disseminação de imagens de satélites comerciais de elevada resolução. Um tal controlo poderá ser possível uma vez que durante a Guerra do Golfo apenas a Índia teve a possibilidade vender imagens de satélite ao Iraque. No entanto, é pouco credível que o mercado russo, israelita, francês ou indiano não forneçam clandestinamente tais serviços à China, ainda que sob pressão de Washington para não o efectuarem. Actualmente a China tem acesso a imagens de satélites comerciais a partir dos SPOT franceses, do IRS-1C indiano, do RADARSAT canadiano, e de vários outros satélites russos, o que lhe permite desenvolver mapas digitais do terreno com vista à aquisição de objectivos, orientação de mísseis, e planeamento de missões. Para além do mais existem actualmente empresas que comercializam sistemas diferenciais que combinam e se socorrem das duas redes de satélite (GPS e GLONASS) para aumentarem a sua precisão de localização, a qual pode ir desde os 30 decímetros até aos 3 metros consoante a qualidade tecnológica dos sensores. O GPS diferencial é mais resistente ao empastelamento de sinal uma vez que ignora aqueles sinais que sejam mais fracos.
26 Stokes, Mark; (2000); “China’s Military Space and Conventional Theater Missile Development: Implications for Security in the Taiwan Strait”; in People Liberation Army After Next, Susan Puska (Ed); Carlisle Barracks, Strategic Studies Institute; pp. 121-124.
27 Ibid; pp. 124-126.
28 A Rússia tem tentado vender o míssil de cruzeiro RADUGA KH-65SE o qual se equipara ao TOMAHAWK norte americano. Igualmente existem notícias de que a China participou no programa de co-desenvolvimento do LACM israelita DELILAH extraindo daí fortes ganhos de know how. Fisher, Richard; (1999); “Appendix to Chapter 5: Foreign Arms Aquisition and PLA Modernization” in James Lilley e David Shambaugh (Eds); China’s Military Faces the Future; Washington, M.E. Sharpe; p. 131 e p. 135 respectivamente.
29 Stokes, Mark; Op. Cit.; pp. 131-133.
30 Havendo rumores de que a China procura chegar a um acordo de co-produção com Moscovo.
31 Jane’s Strategic Weapons Systems, 1998.
32 A China já possui dois destes destroiers. Os SS-N-22 são mísseis anti-navio que a URSS fabricou e que eram destinados ao ataque a grupos de combate de porta-aviões. Estes ASCM podem atingir uma velocidade de Mach 2, voando um pouco acima do nível do mar, o que dificulta consideravelmente a sua detecção por parte dos sistemas de vigilância inimiga.
33 Para uma visão do material aeronáutico da FAEPL veja-se: Godwin, Paul H. B.; (1996); “From Continent to Periphery: PLA Doctrine, Strategy and Capabilities Towards 2000”; The China Quartely, nº 146; p. 479.
34 Segundo alguns analistas de defesa sediados em Pequim, a Rússia terá vendido ao abrigo do acordo dos SU-27, 10 motores AL-31. Jane’s Defense Weekly; Vol. 30, nº 24, 16 December 1998; p. 26.
35 Relembre-se que em termos militares, quantidade não significa necessariamente qualidade. No caso específico da FAEPL, deve-se notar que vectores como o treino dos pilotos, o sistema de manutenção e de apoio logístico, a integração racional e eficaz dos aviões em
   manobras militares combinadas e conjuntas, ainda apresentam fortes debilidades que mesmo que o ritmo de abate dos antigos aparelhos fosse idêntico à entrada ao serviço dos novos, tal não significaria um incremento acentuado do poder militar efectivo da FAEPL. Mais à frente iremos retornar a este tópico.
36 Sobre alguns pormenores sobre a visita do General Liu Huaquing a Moscovo em 1990, a qual se materializou como o ponto de partida para as negociações subsequentes com vista à aquisição dos SU-27 e Il-76 leia-se Gill, Bates e Taeho Kim; (1995); China’s Military Aquisitions: A Quest for Superb Weapons; Stockholm, SIPRI; pp. 57-58.
37 As recentes intenções de compra dos MiG-31 e dos SU-30 (estes últimos já acordados) inserem-se igualmente nesta perspectiva. Veja-se: www.darren.lib.utah.edu/wwiii_alert.htm (acedido em 14 de Fevereiro de 2000).
38 O F-11 (SU-27) é um caça de elevado desempenho aéreo e com um raio de acção da ordem dos 1500 km, o que o torna equiparável ao F-15 norte-americano. No pacote inicial de negociação, não estiveram contemplados a aquisição dos potentes mísseis ar-ar AA-10 (ALAMO) e AA-11 (ARCHER), bem como o guarnecimento destas aeronaves com a última palavra em sistemas de contra-medidas electrónicas. Só posteriormente é que a China comprou 144 AA-10, 96 AA-11, 40 motores suplentes e um simulador de treino para o SU-27. Veja-se Jane´s Inteligence Review, Special Report nº 4, September 1994; pp. 21-24.
39 Estes ficaram inicialmente sediados na base aérea de Wuhu estando agora na base de Liancheng na província de Fujian. A segunda leva de 24 Su-27 ficou instalada na base de Suixi na província de Guangdong.
40 Segundo fontes russas o avião foi modificado, tendo o seu trem de aterragem sido reforçado para poder levantar voo com o depósito de combustível no máximo da sua capacidade de forma a conferir um maior raio de acção. Fisher, Richard; Op. Cit.; p. 144.
41 Jane’s Defense Weekly, Vol. 31, 24 February 1999, nº 8; p. 16.
42 Fisher, Richard; Op. Cit.; pp. 146-147 e 163.
43 A operação do AA-11 implica a utilização de um capacete com mira virtual que permite um campo de fogo de 120 graus comparado com os 50 graus do SIDEWINDER. Os militares chineses apreciaram este capacete pela similaridade com o seu modelo de capacete para o míssil PL-9.
44 Shambaugh, David; (2000); “Taiwan’s Eroding Military Advantage”; The Washington Quarterly nº 2; p. 126.
45 Ibid; p. 141.
46 Ibid; p. 142.
47 No entanto continuam a existir alguns receios de que a Rússia possa vir a vender a sua última palavra em bombardeiros estratégicos, o TU-22M (Backfire) que tem um raio de acção de 4 mil quilómetros sem necessidade de reabastecimento. Tal não nos parece possível a curto prazo tendo em conta a elevada base de manutenção logística e os onerosos custos de operação dos mesmos. Veja-se Blank, Stephen J.; (1997); “The Dynamics of Russian Weapon Sales to China”; Parameters, March 4.
48 Por pressão de Washington, a venda foi abortada em finais de 2002, tendo o governo israelita indemnizado Pequim pela quebra do contrato em mais de 2, 5 milhões de dólares.
49 Far Eastern Economic Review, 14 October, 1993; p. 68.
50 Estes 10 aviões foram colocados sob o comando da 13ª Divisão Aérea perto de Wuhan, em apoio directo às forças aerotransportadas (unidades de reacção rápida).
51 Veja-se Air Force Magazine, July 1997; p. 59.
52 Para uma breve súmula das especulações veja-se Allen, Kenneth e Allan Grummel; China’s Air Force Enters the 21 st Century; Santa Monica, RAND; pp. 158-160.
53 Em 1998, um relatório russo apontava para o facto de os chineses não guardarem os seus aviões em hangares adequados fazendo com que a humidade degrade a capacidade dos sistemas aviónicos do Su-27. Para mais no mesmo ano, um tufão terá danificado seriamente entre 17 a 24 Su-27 sediados na base de Liancheng (três ficaram sem reparação) o que provocou a ira da Comissão Militar Central (CMC) sobre os comandantes locais da FAEPL. Fisher, Richard; Op. Cit.; pp. 145-146.
54 Os pilotos dos Su-27 não voam praticamente sobre grandes superfícies de água, especialmente sobre Taiwan - em parte pelo receio de uma eventual deserção - o que torna este sofisticado avião num mero caça-bombardeiro e não naquilo para que se encontra excepcionalmente vocacionado: a intercepção de alta altitude.
55 Allen, Kenneth W.; (2000); “PLA Air Force Operations and Modernization”; in Susan Puska (Ed); People’s Liberation Army After Next; Carlisle Barracks, ISS; pp. 189-254.
56 Com uma frequência preocupante têm caído aviões F-16 durante a realização de exercícios militares, especialmente em 1999. Os inquéritos têm apontado para erros humanos. Mesmo assim, os pilotos de Taiwan são superiores aos chineses.
57 120 do modelo A (com um piloto) e 30 do modelo B (com co-piloto).
58 A curva tecnológica será tanto mais acentuada quanto a discrepância técnica existente entre os meios similares operados por um determinado ramo das forças armadas. Por exemplo operar meios de quarta geração (década de 80) enquanto mantém no inventário meios da primeira geração (década de 50).
59 Para uma comparação analítica das marinhas regionais veja-se: Downing, John; “China’s Evolving Maritime Strategy: parts I and II”; Jane’s Intelligence Review; March and April 1996; pp. 129-133 e 186-191 respectivamente. Para uma visão genérica sobre o material da MEPL veja-se: Godwin, Paul H. B.; (1996); “From Continent to Periphery: PLA Doctrine, Strategy and Capabilities Towards 2000”; The China Quartely, nº 146; pp. 476-477.
60 Jacobs, Gordon; “Chinese Naval Developments post-Gulf War”; Jane’s Intelligence Review; February 1993; p. 84.
61 Não alheias a estas particularidades encontram-se modelos estruturais datados da década de 60 e armamento naval já ultrapassado (como os mísseis mar-mar Hy-2 Silkworm e o míssil anti-aéreo HQ-61). As autoridades militares tailandesas confirmaram igualmente estas debilidades estruturais, quando depois de terem comprado alguns navios da classe Jianghu, os tiveram que adaptar para o patrulhamento costeiro.
62 Opção particularmente arriscada e cujos resultados têm sido desoladores, levando em consideração as naturais dificuldades em integrar eficientemente sistemas oriundos das mais diversas fontes, e o défice científico-tecnológico chinês.
63 O submarino da classe Kilo tem uma velocidade em submersão de 17 nós e um raio de acção de 9500km, podendo estar submerso durante 45 dias com uma tripulação de 51 elementos.
64 Gertz, Bill; (1997); “Pentagon Says Russians Sold Destroyers to China”; Washington Times, p. 1. Para uma descrição do SS-N-22 veja-se Jane´s Strategic Weapons Systems, nº 22, September 1996.
65 Jane’s Defense Weekly, Vol.31, nº 5, 3 February 1999; p. 16. Genericamente, o armamento desta classe baseia-se na transferência e adaptação daquele que se encontra na classe LUHU. Entretanto notícias posteriores trouxeram à tona a decisão de adiar a construção do segundo destroier desta classe devido à inadequação do sistema de defesa anti-aéreo russo HQ-7 instalado na primeira LUHAI e que será substituído pelo SA-N-12 das SOVREMENNY. O HQ-7 será instalado nos destroiers da classe LUDA.
66 Se bem que as versões II e III desta classe sejam modelos da década de 70, estas não deixam de se constituir como um eficaz vector de dissuasão, mercê do seu raio de acção de 4 mil milhas náuticas, e do razoável equipamento de defesa anti-aérea, de luta anti-submarina e de guerra electrónica.
67 Estes mísseis são capazes de atingir velocidades de Mach 2, possuindo um temível grau de precisão até uma distância de 130km. A última versão possui capacidade de manobra autónoma quando se aproxima do alvo, o que dificulta substancialmente a eficácia de sistemas de defesa pontual como o canhão PHALANX que equipa os destroiers americanos.
68 Jane’s Defense Weekly; Vol. 30, nº 24, 16 December 1998; p. 25.
69 Um recente acidente ocorrido em 3 de Maio de 2003 com um submarino da classe Ming, veio demonstrar a degradação e antiguidade deste modelo, uma vez que a MEPL apontou como causa da tragédia, que originou cerca de 60 mortos, uma falha mecânica do sistema de bombas.
70 Fotos recentemente obtidas por satélite, revelaram que o casco de três dos cinco submarinos desta classe foram substancialmente alongados de modo a poder acolher uma bateria de mísseis anti-navio Yang-Ji.
71 Jane’s Defense Weekly, Vol.32, nº 7, 18 August 1999; p. 17. Estes factos materializam um grave revés para a MELP, que aquando da decisão de compra, planeou a sua atribuição às Esquadras do Sul e do Leste, de modo a reforçar substancialmente a respectivas missões de salvaguarda das reivindicações territoriais sobre o Sul do Mar da China (ilhas Spratly e Paracel) bem como de imposição de um bloqueio naval no Estreito de Taiwan.
72 Possivelmente seguirá para um porto chinês onde será estudado pormenorizadamente, ao nível da sua estrutura de construção.
73 Veja Carriço, Manuel Alexandre G.; (2002); “A Evolução da Estratégia de Defesa Naval Chinesa e o Processo de Modernização em Curso: A Questão do Porta-Aviões”; Revista Militar nº 12; pp. 983-1023.
74 Newell, Phil; (1998); “Maintaining the ROC-PRC Military Balance”; Sinorama nº 10.
75 Veja-se Yang, Andrew e Wen-Chung Liao; “PLA Rapid Reaction Forces: Concept, Training, and Preliminary Assessement” inJames Mulvenon e Richard Yang (Eds); The People’s Liberation Army in the Information Age; Santa Monica, RAND; pp. 48-58.
76 Para uma visão sobre os três planos de reorganização das forças armadas de Taipé veja-se: Ding, Arthur e Alexander Chieh-cheng Huang; (1999); “Taiwan’s Military in the 21st Century: Redefinition and Reorganization” in Larry Wortzel (Ed); The Chinese Armed Forces in the 21st Century; ISS, Carlisle Barracks; pp. 253-288.
77 Lin, Chong-Pin; (1996); “The Military Balance in the Taiwan Straits”; The China Quarterly nº 146; pp. 577-595.
78 Blatt, Jason; (1998); “Military Unit Chief Suspected of Bribery” in South China Morning Post; April 6.
79 Dreyer, June Teufel; (1999); “Taiwan’s Military: A View From Afar” in Larry Wortzel (Ed); China’s Armed Forces in the 21st Century; Carlisle Barracks, ISS; pp. 306-307.
80 O jornal Junshi Wenzhai de circulação restrita, é publicado pelo Segundo Instituto de Pesquisa Aeroespacial da China e pela Associação de Cientistas Militares chineses. Ainda que disponível em algumas livrarias, os estrangeiros só o conseguem obter por intermédio de vendedores de rua chineses que a estas se dirijam.
81 Shambaugh, David; (1999); “China’s Military Views the World: Ambivalent Security”; International Security nº 3; p. 65.
82 Nas imediações da base está sediada a principal associação columbófila de Taiwan à qual foi solicitada cooperação para evitar mais acidentes.
84 Veja-se Mulvenon, James; (1997); Professionalization of the Senior Chinese Officer Corps; Santa Monica, RAND.
85 Veja-se Ji, You; (1999); The Armed Forces of China; London, I.B. Tauris.
86 Veja-se Carriço, Manuel Alexandre G. (2001); As Actividades Comerciais do EPL: Oxigénio Orçamental?; Monografia apresentada no curso de Pós-Graduação em China Moderna no ISCSP.
87 Carriço, Manuel Alexandre G. (2001); A Evolução Doutrinária do Pensamento de Segurança e Defesa Chinês; Monografia não editada.
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2009-06-05
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Tenente-coronel

Manuel Alexandre Garrinhas Carriço

Tenente-Coronel de Infantaria. Assessor do Instituto da Defesa Nacional. Vogal da Direção da Revista Militar.

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