Nº 2500 - Maio de 2010
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
A Ilhota do Paralelo 15
Tenente-coronel
João José de Sousa Cruz
 
 
A República de Moçambique tem na sua longa costa cerca de oitenta ilhas, umas maiores e outras mais pequenas. E é precisamente uma das mais pequenas que se tornou, desde a antiguidade, conhecida por ser um bom abrigo para embarcações de todos os calados, protegendo-as do alto mar e das suas tempestades e ainda protegendo os habitantes dos perigos de terra firme. É essa Ilhota do Paralelo 15, mais conhecida como Ilha de Moçambique, que pretendo apresentar.
 
No entanto, há um pequeno óbice a ter em conta. Tal ilha já foi cantada em prosa e em verso por muitos autores, o que me inibe de a tratar com a eloquência que merece.
 
 
A Ilha de Moçambique foi, historicamente falando, “uma verdadeira terra de mártires e de heróis, não para ser pisada mas sim beijada[1].
 
 
1.  Localização
 
 
 
 
A Ilha de Moçambique, neste trabalho apelidada de Ilhota do Paralelo 15, tem na realidade a seguinte localização: Latitude 15º 02’ S e Longitude 40º 44’ E.
 
É sobre esta ilhota de cerca de 3 km de comprido por 600 metros de largura, que pretendo recordar certos elementos históricos e certas memórias próprias.
 
Tendo presente a figura 1, pormenor das “Rotas de la Navegaçion de la Índia” de autoria dos pilotos Manuel Montero e Gaspar Ferrera, feito em 25 de Março de 1600, nele nos apercebemos de minúcias da costa do actual Moçambique, e não obstante o mapa ter sido construído com o sul para a parte superior do desenho, identifica-se com facilidade a foz do Zambeze, chamado na altura de Cuama, e descendo o Rio dos Bons Sinais, depois a Ilhas do Angoche e na parte inferior do desenho, finalmente, Mocambiqe.
 
O mapa inicial incluía mais informações geográficas, como a Ilha de São Lourenço (actual Madagáscar), mais os Baixos da Índia e incluía toda a costa desde o Cabo das Correntes, por Cofala, até ao Cabo Delgado a norte das Ilhas Quirimbas.
 
Como Mocambiqe, estão representadas na baía quatro ilhas, sendo a maior a nossa Ilhota do paralelo 15, realmente conhecida por Ilha de Moçambique.[2]
 
Num apanhado rápido pudemos averiguar que, ao longo da costa de Moçambique, existem cerca de 85 ilhas e ilhéus, mas somente a Inhaca, a Xefina, o Bazaruto, as de Angoxe, as da Baía de Mossulo (onde se inclui a nossa Ilhota) e as Quirimbas, têm ou tiveram importância económica, e/ou militar.
 
 
2.  Conhecenças e Crónicas
 
 
 
Os primeiros colonos árabes que visitaram e se instalaram na costa de Moçambique devem ter chegado, crê-se, por alturas do séc. VIII, mas durante muitos séculos foram pouco numerosos. Diz-se que os primeiros colonos árabes fundaram Quíloa, ao largo da costa do Tanganica e que descobriram o comércio do ouro de Sofala, perto da foz do Zambeze, por volta do séc. X[3].
 
As vias que os comerciantes utilizavam, a partir de Sofala e do resto da costa de Moçambique, são mal conhecidas, mas seriam provavelmente os vales dos grandes rios como o Zambeze, o Save e Limpopo e seus afluentes, Mazoé, Chire, Luângua e Cafué.
 
Seguindo os vales destes rios e por outros caminhos naturais, penetraram os comerciantes no coração da África Central, durante o I Milénio d.C.
 
 
Nos Roteiros[4] já referidos pode ler-se o conselho dos autores: “Depois de passares a Ilha de João da Nova …e por ires mais seguro, daqui governa ao nornordeste, e tomarás as Ilhas de Angoxe para Moçambique; e quanto mais governares para o Norte irás mais perto de Moçambique. E avisar-te-ás que nesta terra das ilhas do Angoxe para Moçambique não passes de 25 braças a Baixa de Currais…”[5]
 
Notava-se o cuidado para não haver problemas náuticos:
“…e por estes caminhos dobrarás os Baixos do Monginqual, governa ao Nordeste e irás dar nas Ilhas de Moçambique.”
 
 
 
 
E mais adiante:
“Se quiseres ir pousar à Ilha de Moçambique vai demandar a ponta nordeste da mesma ilha… Sabe que toda esta terra, além de Moçambique para o nordeste, faz grandes enseadas e abras, como dos rios. E esta ilha mais do nordeste é toda sem arvoredo, salvando umas árvores que parecem amieiros, direitos e altos.”
 
E ainda mais adiante:
“Se quiseres entrar em Moçambique deixa as ilhas de S.Jorge (I. Goa) e Santiago (I. Sena) da banda do sudoeste e alarga-te de S.Jorge à vista; irás por 6 braças e 7, e vai de ló, de maneira que vás com a proa da nau em um areal que está de Nossa Senhora do Baluarte para o sudoeste.”
 
Assim se pode avaliar como a navegação era feita com o máximo de segurança. Mouzinho de Albuquerque, em 1899 informava:
“A baía de Mossuril, com a Ilha de Moçambique, que lhe serve de quebra-mar e as pequenas ilhas de Goa e Sena para facilitar a conhecença, é um dos melhores portos de toda a costa e está bem farolada e balizada…. As ilhas desta costa são:
- a de Moçambique, banco de coral onde assenta a cidade e a praça de S.Sebastião;
- as de Goa, Sena, Quitangonha, Conducia, Mafamude e Angoche, esta na barra de Meluli.
Em 1603 o atrevimento dos corsários (franceses) crescera ao ponto d’irem por cerco à fortaleza de Moçambique, sendo forçados a retirar, mas voltando no ano seguinte a tentar a empresa com mais forças. Felizmente era esse o tempo de Estêvão de Atayde que em 1607, com 150 soldados defendeu a fortaleza contra a esquadra de Paul van Caerden (holandeses) e perto de mil homens que ele desembarcara na ilha. Derrotados os holandeses incendiaram a cidade e devastaram as propriedades portuguesas na Terra Firme fronteira à Ilha.
Como se desenvolveu uma crise económica face a várias guerras na Europa e ataques corsários franceses, holandeses e ingleses, o governo da metrópole ordenou que fossem vendidos os cargos do Estado da Índia e, portanto, das Capitanias da África Oriental….
Foi nesta conformidade que se assiste ao facto de Tristão da Cunha dar a seu filho, que tinha sido nomeado Governador da Índia, o conselho “Carrega pimenta e deita-te a dormir.” [6]
 
Curiosa a informação de Alexandre Lobato, na sua Monografia da Ilha de Moçambique, que se transcreve:
“Quando em 1460 o Infante D.Henrique manda Diogo Gomes à Índia por mar, as nossas navegações ainda iam por alturas do mar da Guiné, mas quando da passagem de Vasco da Gama pela ilha, já os portugueses tinham conhecimento da existência da Ilha de Moçambique [7].
Em 1484, D. João II comunicava ao Papa a descoberta do caminho marítimo do Oriente, e afinal ainda apenas se navegava no mar do Congo. Três anos depois João de Paiva e Pêro da Covilhã foram despachados por terra, via Cairo, em missão de reconhecimento económico dos mercados produtores do Oriente, e logo a seguir Bartolomeu Dias segue por mar à procura da volta do Cabo.”[8]
 
Quando se pretende saber algo sobre história é aconselhável consultar as obras do historiador João de Barros (1496-1570), chamado o Tito Lívio português.
 
Das suas Décadas da Índia, no Livro III da 1ª Década, , retirámos que:
“…El Rey mandou por terra dous criados seus, um a descobrir os portos e navegações da Índia, e outro com cartas para o Prestes João…. Embarcou Pêro da Covilhã em uma nau que partiu de Aden, foi ter a Cananor e daí a Calicute e Goa, cidades principais da costa da Índia.
Aqui embarcou para a mina de Cofala que é na Etiópia sobre o Egipto…”
 
 
 
 
E no capítulo IV, sobre a viagem de Gama:
O qual temor lhe fez dar tanto resguardo para fugir de terra, que passou sem haver vista da povoação de Sofala, tão celebrada naquelas partes por causa do muito ouro que os mouros ali vão dos negros da terra per via do comércio (segundo ele[Gama] adiante soube).”
 
No Livro IX da 1ªDécada e capítulo VI pode ler-se:
Como El Rey mandou Pêro da Nhaya à mina de Sofala onde fez uma fortaleza, e em serviço d´El Rey seguiram em Setembro Cide Barbudo e Pedro Coresma a descobrir toda a terra desde o cabo da Boa Esperança até Sofala.”
 
No Livro XI e capítulo I, refere:
“A descrição da região do reino de Sofala e das suas minas de ouro e do seu príncipe Benomotapa.”
“O rio que vem contra Sofala, depois que sai deste lago[9] e correr por muita distância se reparte em dois braços, um vai sair aquém do Cabo Correntes e é aquele que os nossos antigamente chamavam rio da Laguoa, ora de Espírito Santo, (nome) novamente posto por Lourenço Marques que o foi descobrir no ano de 1545; o outro braço sai abaixo de Sofala 25 léguas chamado Cuama (ou Zambeze) chamado por outros povos do sertão.”
 
No Livro X, 1ª Década capítulo 11, lê-se:
“Esta povoação que os nossos tinham feito naquele lugar chamado Sofala não foi por força das armas nem contra a vontade dos naturais da terra, mas por vontade deles e do príncipe que naquele tempo reinava, porque esta comunicação todos receberam benefícios havendo panos e coisas que não tinham e dando ouro e marfim que lhes não servia, pois então aquela parte da costa de Sofala não lhes dava saída.”
 
 
 
 
Era portanto muito conhecida região de Sofala, pois caso contrário o nosso historiador não se teria referido a ela com tanta insistência.
 
Brian Fagan, num aditamento à edição portuguesa do seu livro Africa Austral, de 1965, afirmava:
“Já em fins de 1489 ou princípios de 1490 Pêro da Covilhã tinha visitado Sofala. Em 1505, o negócio do ouro da costa oriental da África passou a ser monopólio da Coroa facto que parece indicar a existência de contactos e experiências suficientes para suscitar o interesse régio por tal monopólio. A Ilha de Moçambique foi, desde a primeira viagem de Vasco da Gama, escala obrigatória das naus que demandavam a Índia. Por outro lado, a penetração do interior, através dos grandes rios, foi sendo feita com o auxílio de pontos de apoio que se iam construindo, os presídios. Sofala era um dos mais importantes.
Estes presídios eram governados por capitães, com certa jurisdição sobre os prazos, terras concedidas pela Coroa, no interior, para exploração. Nos meados do séc. XVII, o domínio português estendia-se, com eficácia variável, por toda a costa africana entre Lourenço Marques, a Sul e Melinde, a Norte.
O comércio do marfim e do ouro, no interior, era drenado por Sena e Tete, por meio de um sistema de feiras e feitorias fortificadas. O sistema de prazos era na Zambézia, complemento das feiras, situadas mais no interior. Sobre todas as fortalezas, superintendia o capitão de Moçambique (cidade-ilha), ou castelão, que por seu turno, foi dependente do governa da Índia até 1752.
Para dominar toda esta extensa área marítima e terrestre, houve necessidade de ter algumas bases estrategicamente colocadas e os portugueses instalaram-se além da Ilha de Moçambique, em Sofala, Sena, Quelimane, Tete, Manica, Zumbo e mais tarde na Baía da Lagoa (Lourenço Marques). Estas fortalezas e feitorias foram mais tarde elevadas à categoria de Vilas (1761).” [10]
 
 
3.  Visualizações da Ilha de Moçambique
 
Do Roteiro de Lisboa a Goa, de D. João de Castro, conhece-se o aspecto da Ilha e seus arrabaldes que podem ver-se na figura 6.
 
 
 
 
No mesmo Roteiro, pode ler-se:
“A ponta de Mocamgo (Mocambo), … pode sem dúvida ser o promontório Plaso, que foi a derradeira terra que conheceu Ptolomeu para a banda sul.
A 29 Julho (2ª feira) a hora de véspera, nos fizemos à vela, o vento era nordeste bonança e fomos surgir dentro do porto (de Mossuril, de Moçambique).”
 
  
 
Diz D. João de Castro:
“Moçambique é um dos melhores portos que tenho visto, podendo-se dentro agasalhar 30 naus…, esta ilha é muito rasa e sem nenhuma água…, de fora do porto jazem duas outras ilhas, assim mesmo estéreis e baixas, uma chama-se Santiago e outra São Jorge.
A altura (latitude) de Moçambique … 14º45’.
O Cabo Delgado podemos ter por muito averiguado ser o promontório Rapto, muito conhecido de Ptolomeu, e este pego onde nos achamos (na data em que escreve) pode ser o Golfão Barbárico, mas o Rio Rapta que lava as raízes do mesmo promontório, agora é chamado pelos navegantes de Rio Dosengo (será o Rovuma?).” [12]
 
Durante a vigência de Portugal, como gestor da zona a que se convencionou chamar de Moçambique, esta ilha que inicialmente foi uma simples feitoria, depois fortaleza e, mais tarde, em 1761, por carta régia, elevada à categoria de vila, foi até 1975 uma cidade portuguesa.
 
Das primeiras imagens na Europa sobre a Ilha de Moçambique e, para mim a mais bonita, podemos destacar um desenho de Joannes a Doetecomius Jr., e incluído no livro o “Itinerário” de Jan Huygen Van Linschotten, em Amsterdão datado de 1596 (Fig. 7).
 
 
 
 
Na minha modesta opinião, o nome de Mocambique, poderá ter vindo do nome da Baía de Mocambo, a sul da baía do Mossuril, e não do nome do sultão da ilhota, quando Gama por lá passou.
 
A sua elevação a cidade remonta a 1818 e foi capital do Estado de Moçambique até 1898. Nesta data a capital de Moçambique passou para Lourenço Marques, que mais tarde também mudou de nome para Maputo, nome porque é conhecida a cidade da Baía da Lagoa na actualidade. Ainda hoje não percebo porque não foi mudado o nome do país, como o foi, o da cidade de Lourenço Marques. Seria mais lógico ter ficado a ilhota com o seu nome de Moçambique e o país mudar o nome para outro nome como Maputo por exemplo.
 
 
4.  Fontes
 
 
 
 
Em 1835, o então Capitão General Sebastião Xavier Botelho escreveu uma descrição pormenorizada e exaustiva sobre Moçambique, a que deu o nome de “Memória Estatística sobre os domínios portugueses na África Oriental”, e no qual referindo-se à ilhota afirmou:
“Jaz esta ilha em 15 graus e três minutos ao Sul, longitude de Greenwich 40 graus e 47 minutos. He terra baixa assente em rocha cerceada ao sul por aquele recife de penedia aonde o mar quando impelido dos ventos se enrola tanto e arrebenta com tamanha fúria, que não há tomar terra por este lado.
A maior estensão da ilha de hum cabo a outro he de um quarto de legoa e na maior largura que he de bazar ao forte de S.António, he ao muito meio quarto.
Os principais de Moçambique (ilha) erão homens baços de várias nações, que viviam de mercandejar para diversas partes… [13]
Os naturais eram negros, assim os da ilha como os de terra firme, vivendo em casas de taipa cobertas de palha…
Viviam na lei de mafoma, erão gente rica e bem apessoada, vestiam panos de algodão listrados e na cabeça traziam toucas com vivos de seda de fios de ouro e cingiam terçados mourisco com adaga nos braços. De condição são duros, falsários e vis.
Como Camões disse:
Na dura Moçambique em fim surgimos
De cuja falsidade e má vileza
Já serás sabedor e dos enganos
Dos povos de Mombaça pouco humanos.” [14]
 
No ano em que Sebastião Botelho escreveu a referida Memória, existiam na Ilha cerca de 5.000 escravos, isto um ano antes da abolição da escravatura em Portugal.
 
Consta de um Dicionário francês de 1880[15], que esta ilhota era “capital da Capitania General de Moçambique e que tinha sido abordada por Vasco da Gama em 1498, mas que tinha sido obrigado a fugir face á má recepção dos habitantes à sua armada”. Consta também que “só em 1508, Afonso de Albuquerque mandou construir um forte e estabelecer uma feitoria”. Dizia também “que a soberania de Portugal sobre esta capitania era quase nula, sendo os povos que as habitavam governados pelos seus próprios chefes (régulos). Que ainda há poucos anos aí se fazia um grande comércio de escravos (1880).”
 
Outra fonte, o Comandante Pedroso de Lima escrevia, em 1933[16], que “Desde o tempo dos descobrimentos que nos entregámos à ocupação do litoral até onde chegava a acção da marinha e daí não passávamos, não penetrando portanto para o interior, a não ser no Zambeze… Assim nos mantivemos durante quatro séculos ocupando apenas o litoral e às vezes quase só as ilhas, como sucedia em Moçambique e no Ibo, em que no continente fronteiro apenas púnhamos ligeiro pé no Mossuril, Cabaceira e na Quissanga… Ainda hoje (1933) na Ilha de Moçambique há mostras desses maus portugueses…” que, no meu entender, Pedroso de Lima queria dizer, não arredavam pé da ilhota.
 
Acrescenta Pedroso de Lima que, em 1902, “Era portanto (a escravatura) negócio garantido todos os anos e um grande negócio para o Régulo Nepuitá-Muno … pois foi apanhado com doze pangaios e próximo deles em terra as vítimas que já estavam condenadas; eram 150 indígenas da região, os quais estavam amarrados com uma forquilha de madeira no pescoço, presa com cavilhas. O régulo foi preso e outros grandes da região e enviados para a fortaleza de Moçambique.”
 
Como se pode ver, 22 anos depois do afirmado no Dicionário de História e Geografia, ainda havia escravatura em Moçambique.
 
 
5.  Contactos com a Ilhota
 
 
 
Decorria o ano de 1951 quando me foi facultada uma visita a Moçambique e, a bordo do navio do mesmo nome, da Companhia Nacional de Navegação, cheguei à vista do farol da Ilha de Goa e posteriormente depois de dobrado um dos baluartes da Fortaleza de S. Sebastião, avistámos a antiquíssima ponte cais da Alfândega cuja construção foi feita entre 1752 e 1758 pelo primeiro Capitão-general D. Francisco de Melo e Castro.
 
O certo é que o navio não acostou à ponte cais, mas ficámos bastante perto e em pequenos gasolinas deslocámo-nos a terra onde fomos recebidos principescamente. Pessoalmente, estive em Moçambique durante algum tempo: primeiro, em 1951, durante um mês; depois, entre 1957 e 1960, e ainda, entre 1963 e 1965, de regresso de Timor; uns dias em Lourenço Marques, em 1969; e, finalmente, entre 1972 e 1974.
 
Na Ilha propriamente falando, estive como disse, em 1951, com a viagem de finalistas do Colégio Militar e visitámos bem toda a zona. Voltei lá em 1965, com o Adido Militar Espanhol, Teniente Coronel Juan José Orosco, em visita a zonas operacionais, e tornei à Ilha em 1972 e 1973, em curtas férias possíveis a quem estava no mato em operações de contraguerrilha.
 
Durante todos estes anos não vi nem ouro, nem escravos, nem abusos sobre os autóctones, nem descriminações, (como tive de reconhecer na Cidade do Cabo quando lá passei; até nos Correios não me deixaram sentar em bancos para no europeans).
 
Pelo contrário, vi muito marfim e muito pau-preto em feiras, quer em Nampula quer noutras terras onde essas feiras tinham lugar. Julgo que ainda hoje, não obstante a ingenuidade da Europa em proibir a sua importação, continua a existir esse comércio que dá bastantes dividendos.
 
Era mesmo repousante no seu conjunto habitacional, e conjunto de praias que permitiam gozar um pouco de sossego, fora do desassossego vibrante das zonas operacionais e nas cidades de Nampula, Beira e Lourenço Marques.
 
 
 
 
O Ilhéu de S. Lourenço foi fortificado para defender a entrada sul do porto de Moçambique, embora tal entrada fosse muito assoreada e com fraca profundidade para as naus que entravam no porto. Na maré vazia pode-se ir ao ilhéu de S. Lourenço a pé e no trajecto colher-se belas e raras conchas (Fig.13).
 
 
 
 
O riquexó (figura 14) era um transporte muito utilizado na ilhota e era tripulado por um indígena, cuja constituição física tinha de ser robusta, embora este aparelho de transporte de pessoas, por vezes duas e mais, tinha um equilíbrio notável porque o peso dos transportados elevava o condutor e este por vezes parecia que voava suspenso nas hastes do riquexó. Os próprios condutores achavam-se de uma classe especial e quando uma vez, minha mulher, temendo que o homem se cansasse, lhe disse várias vezes se acaso estivesse cansado parasse, tendo o condutor retorquido:
“Minha senhora quando estiver cansado, vou para casa!”
 
E assim se deu por findo o milando.
 
 
6.  Excertos da sua história
 
 
 
 
Quando o Grande Zimbabué se repartiu e deu origem ao reino de Monomotapa, fundado no séc. XV, na orla setentrional do planalto central de Moçambique, este reino alargou-se até ao litoral. Aí interagiu com os portugueses, que tinham chegado à costa da África Oriental depois de dobrarem o Cabo em 1498.
 
Os mesmos portugueses destruíram, em 1505, Quíloa e Mombaça para favorecerem a sua fortaleza de Sofala, que foi destinada a concentrar todo o comércio do ouro. Em 1511, os portugueses chegaram à corte de Monomotapa e, em 1531, fundaram uma base interior no Zambeze, em Sena. Mas, em 1561, o missionário Gonçalo da Silveira que converteu o régulo do Monomotapa foi morto por indígenas tradicionalistas e mercadores muçulmanos. Uma expedição portuguesa, destinada a apoderar-se das minas de ouro, chacinou os comerciantes muçulmanos mas foi impedida de subir o planalto, optando por criar concentrações de escravos armados na margem sul do Zambeze.
 
Estes exércitos privados desestabilizaram o reino do Monomotapa, na década de 1620, permitindo que os portugueses impusessem uma dinastia clientelar, em grande parte controlada pelos mesmos, durante 60 anos.
 
No entanto, a situação dos portugueses na África Oriental enfraqueceu durante o séc. XVII. Entre 1693 e 1695, foram expulsos do planalto por Changamire, um vassalo do Monomotapa, por tropa de jovens brutalizados, inspirados nos chikunda [17].
 
De investigações feitas, pareceu-me possível concluir que, de toda a costa do Oceano Índico da actual República de Moçambique, só interessou aos portugueses, em 1502, a própria ilhota e seus arrabaldes, de forma a terem abrigo para os seus navios. Aí se fixaram, em 1507.
 
Da mesma forma, os holandeses, quando se fixaram na Cidade do Cabo, tinham em mente a protecção dos seus navios na viagem para as ilhas das especiarias, na sua Companhia das Índias Orientais. (Verenigde Oost-Indische Compagnie - VOC[18]). Estes, os holandeses, que chegaram em 1652 pertenciam à VOC e tinham como objectivo impedir que qualquer outra potência europeia ocupasse a região estratégica do Cabo, e por outro lado construir uma fortaleza onde os barcos holandeses pudessem obter legumes, carne, água e medicamentos.[19]
 
 
 
Em 1658, os holandeses importaram a primeira grande quantidade de escravos da Índia e da Indonésia mas no final do sec. XVIII a maior fonte de importação de escravos era Moçambique.[20]
 
No entanto, o conhecimento do reino do Monomotapa, nos arredores de Sofala, onde existia ouro (desde o séc. X, que era conhecida a sua existência), além de marfim e outros artigos de interesse na Europa, levaram os novos senhores da costa Leste a não descurarem os seus interesses nalguns rios existentes na contra-costa, nome usado em oposição a Angola, que era a Costa de África. Assim, entre 1531 e 1534, o Capitão-mor, então chamado, de Moçambique e Rios de Sena, manda ocupar Sena e Quelimane.
 
 
 
 
Os prazos da Zambézia tiveram origem nestes domínios privados de escravos armados, chikunda, e que foram reconhecidos pela Coroa portuguesa, em 1629. Existiram até ao fim do séc. XIX[21].
 
Dado que só em 1752 Moçambique se separa administrativamente de Goa, até lá todos os lucros iam para a Índia, e Moçambique nada progredia. Esta mudança foi determinada pelo Marquês de Pombal que em 1761, elevou a praça a vila. Chamava-se então à povoação existente na ilhota, Praça de S. Sebastião.
 
O foral não delimitou o concelho, pois entregou à administração além da Ilha de Moçambique, toda a terra firme até onde fosse possível chegar com privilégio de aforamento, segundo o regime em vigor.
 
Em 1897, o Comissário Régio, Mouzinho de Albuquerque começa a mudança da capital para Lourenço Marques e, em 1935, outro golpe foi dado na cidade, a transferência da capital provincial do Niassa passa a ser Nampula.
 
A cidade-ilha foi perdendo importância e, em 1975, morreu mesmo, ficando, na minha opinião, em piores condições que as encontradas por Vasco da Gama em 1498.
 
Pela ilha de Moçambique, passaram ao longo dos anos, muitas figuras da História de Portugal, como Vasco da Gama, Afonso de Albuquerque, D. João de Castro, S. Francisco Xavier, Luís de Camões, Fernão de Magalhães, Pedro Álvares Cabral, Mouzinho de Albuquerque e Bocage entre outros portugueses de antanho. Constam ainda em histórias de pedra, lápides e pedras tumulares, a presença de outros portugueses menos conhecidos como Estêvão de Ataíde, Baltazar Pereira do Lago, Garcia de Sá, o Conde da Lousã, o primeiro Bispo do Japão Sebastião Morais, e o poeta Tomás António Gonzaga.[22]
 
 
 
 
O Palácio dos Capitães-generais, edifício principal da Ilhota, foi construído num terreno de Bartolomeu Lopes, que o doou para a construção do colégio dos jesuítas.
 
A ordem dos jesuítas era rica, pois na ilha, quase todas as casas de aluguer eram sua pertença e quando foi construído o palácio era a melhor construção da Ilha. Quando da extinção dos jesuítas, o palácio passou a bem da Coroa, foi destinado a residência dos Governadores Capitães-generais de Moçambique, supõe-se que em 1763. Mais tarde foi museu, e actualmente desconheço o que será.
 
  
 
Foi na fortaleza de S. Sebastião que D. Estêvão de Ataíde resistiu, até 1611, a diversos ataques de holandeses sendo a guarnição de apenas 150 homens. A uma oferta de parte dos holandeses de aceitar a rendição da Praça, mandando ao capitão português o texto por escrito, respondeu este que apenas acataria ordens d’El Rei de Portugal pois fora ele que o impusera no cargo de defensor daquela Fortaleza. O cerco da ilha durou dois meses e ao saírem os holandeses incendiaram toda a povoação que existia fora da fortaleza.
 
No entanto face ao contínuo envio de degredados do continente para Moçambique, a maioria para ser utilizados como tropas, a disciplina foi-se deteriorando. “O estado de indisciplina interna correspondia à frouxidão dos sucessivos governos nos últimos anos. Um exemplo: Em 1850, o governador de Lourenço Marques, saindo do presídio com alguns soldados”, como dissemos “degredados da metrópole, é roubado e preso por eles ao terceiro dia de marcha”. [23]
 
O maior problema logístico da ilhota era a falta de água, pelo que desde a mais remota idade, todas as casa dispunham de tectos que pudessem armazenar a água das chuvas em cisternas particulares. Da mesma forma o fornecimento de água aos navios que tocavam neste porto, necessitavam de se reabastecerem ou “fazerem a aguada”. Assim era responsabilidade da fortaleza fazer esse serviço, pelo que dispunham de três cisternas e ligações por canos à praia onde os navios encostavam.
 
O campo de fuzilamento nas traseiras da Fortaleza de S. Sebastião foi, na minha opinião, um mal necessário porque a quase totalidade da tropa que servia na África Oriental Portuguesa era constituída por degredados e compelidos, muito pouco habituados a disciplina chegando a fazer revoluções na Ilha contra os governadores, e seus comandantes.
 
 
Muitos dos oficiais também estavam cumprindo penas e assim um dos castigos era mesmo o fuzilamento.
 
 
 
“Por documentos de 1796, verifica-se que sentavam praça na África Oriental, homens incorrigíveis atirados em levas das prisões do Reino, para os porões das naus, carregados de anos de degredo, de vícios e de crimes, sendo grande o problema quanto à sua disciplina.
 
Para esta ser mantida utilizavam-se os seguintes castigos militares:
- Pancada de espada ou chivata;
- Dobrar o trabalho diário;
- Multas de 1/3 do soldo do mês, para a caixa militar;
- Baixa de posto;
- Duas horas de gonilha (gravata, coleira de couro que os militares usavam) e duas horas de trave só até ao pescoço e metade do tempo de pé por oito dias sucessivos;
- Sem ser dado ao sal, de um mês de prisão sem ferros ou quinze dias com ferros;
- Retidos nas praças por tempo indeterminado;
- De calseta (grilheta, argola de perna do condenado) nos trabalhos de fortificação por dois meses...;
 
Também constam outros castigos como:
- Ferros nos pés no cabouco;
- Roda de pau;
- Tornilho (de apertar);
- Grilheta;
- Ferros de andar como os cafres”. [24]
 
 
7.  A escravatura
 
Na minha opinião, em virtude de os holandeses terem ocupado as costas de Angola e do Congo, e só por causa disso, é iniciado o comércio de exportação de escravos, de Moçambique para o Brasil. Essa actividade foi aumentando e chegou a ser determinado pelo Marquês de Pombal que esse envio teria exclusividade, sobre todos os outros países importadores de escravos.
 
 
 
 
“A economia do ouro transforma-se em economia de escravatura, porque o indígena extrai menos ouro e a sua captura é mais fácil e mais rendosa. Data de então a grande penetração económica nas terras firmes do continente fronteiro à Ilha, porque na zona de influência da capital o Mossuril é a base deste negócio. Ali se fazem as feiras, onde ainda se compra ouro e marfim, mas onde se adquirem negros para exportar. A ocupação do continente fronteiro encontra obstáculos impenetráveis na resistência de populações nativas islâmicas que aí habitam e impedem o avanço europeu. A imensa documentação do sec. XVIII, prova que a penetração portuguesa no continente fronteiro marginava uma linha dos seus dez quilómetros”. [25]
 
Outro facto negativo, no meu entender, foi, em 1686, a fundação da Companhia dos Baneanes de Diu, para o comércio entre Diu e Moçambique. Tal, permitiu a entrada em catadupa de comerciantes que tudo canalizavam para a Índia e dominaram completamente todo o comércio local. Ficaram conhecidos por monhés.
 
  
 
Com a abolição da escravatura, em 1836, e esta demorou mais de meio século a ser efectivada, desenvolveu-se uma enorme resistência por parte dos moradores da Ilha. Compreende-se que após séculos de conservação e desenvolvimento de um negócio rendoso, cómodo e sem riscos, em que apenas desempenhavam o papel de intermediários e tendo acumulado rendimentos enormes, não lhes convinha que tal acabasse.
 
“Alguns indivíduos eram verdadeiros potentados, tendo entendimentos com os mouros da Ilha e das terras firmes e como eram ao mesmo tempo funcionários grados do Estado, obstruíam a repressão do tráfego, denunciando as operações militares e a fiscalização naval e dificultando ao máximo a acção militar”. [26]
 
No entanto bem se tentou abolir este estado de coisas.
“Se há nação que tenha tratado com mais persistência da extinção do tráfego de escravos, essa nação foi Portugal e a título de curiosidade transcrevem-se algumas notas sobre o assunto:
- 20 de Março de 1580 - Lei procurando abolir a escravatura;
- 11 de Novembro de 1595 - idem;
- 30 de Junho de 1609 - Nova lei tendente à abolição;
- 19 de Setembro de 1761 - idem, idem;
- 16 de Janeiro de 1773 - idem.
No Séc. XVIII, de acordo com outras nações se tomaram mais as seguintes medidas:
- Tratado de 19 de Fevereiro de 1810 - Portugal compromete-se a não permitir a continuação do comércio de escravatura em qualquer lugar da costa de África, fora dos seus domínios;
- Tratado de 22 de Janeiro de 1815 - Proibição do comércio de escravos em qualquer parte da costa de África ao norte do Equador;
- Decreto de 10 de Dezembro de 1836 - Abolido o comércio de escravos em todos os domínios portugueses;
- Tratado de 03 de Julho de 1842 - entre Portugal e Inglaterra proibindo uma vez mais a escravatura;
- Decreto de 25 de Julho de 1842 - Declarando que seja considerado como pirataria o comércio de escravos e aplicando penas severíssimas aos traficantes;
- Decreto de 22 de Outubro de 1842 - reforçando o decreto anterior no respeitante às penas a aplicar;
- Decreto de 14 de Dezembro de 1854 - Libertação dos escravos do Estado em todas as províncias ultramarinas;
- Decreto de 27 de Fevereiro de 1855 - Proibindo que se deixasse sair indígenas para as ilhas francesas de Reunião e Maurícias, sob qualquer pretexto. Deu origem ao aprisionamento da Barca francesa “Charles y George”;
- Carta de lei de 30 de Junho de 1856 - Ampliando as disposições do decreto antecedente, extensivo aos escravos das câmaras e Misericórdias;
- Carta de lei de 05 de Julho de 1856 - Providenciando sobre a aplicação das leis antecedentes de 1851 e 1856, para a abolição da escravatura nas colónias (Ambriz, Cabinda e Molembo);
- Carta de Lei de 24 de Julho de 1856 - Declarando livres os filhos de mulheres escravas;
- Carta de lei de 25 de Julho de 1856 - Estendendo aos escravos das igrejas as disposições do decreto de 14DEZ1854;
- Carta de lei de 18 de Agosto de 1856 - declarando livres todos os escravos que entrassem nos portos do reino e das ilhas adjacentes, nos estados da Índia e Macau;
- Decreto de 29 de Abril de 1858 - Fixando um prazo de 20 anos (até 1878) a extinção total do estado de escravidão em todo o território português;
- Decreto de 25 de Fevereiro de 1869 - Abolido o estado de escravidão em todo o reino de Portugal e nos seus domínios. Passam a libertos mas até 1878 deviam serviço aos seus antigos senhores.” [27]
 
Parece não haver dúvida quanto à boa vontade dos governantes portugueses. Comparando com os ingleses que até 01 de Janeiro de 1928 ainda mantinham a escravatura algures na Costa de Guiné, explicitamente na Serra Leoa.
Na África Oriental Alemã só em 24 de Dezembro de 1904 a abolição da escravatura entrou em vigor, mas unicamente para os filhos dos escravos nascidos depois de 31 de Dezembro de 1905.
 
Só Mouzinho de Albuquerque, em 1895, conseguiu terminar com este estado de coisas, pois mandou varar à bala os que vendessem pólvoras e armas aos caçadores de escravos, e que se revoltavam com as operações militares que os impediam de obter os grandes lucros de antigamente.
 
 
8.  Relíquias históricas
 
Toda a Ilhota é história e por todo o lado há sinais, como por exemplo as pedras funerárias que a seguir se apresentam nas figuras 27 a 35.
 
A capela do Baluarte, junto á fortaleza de S. Sebastião, é a mais antiga igreja construída por portugueses em todo o Oriente e antes da construção da fortaleza também era utilizada como pequeno fortim defendendo a entrada da barra da baía do Mossuril. Na figura 27, pode ver-se, não muito bem, ao fundo, a Ilha de Goa com o seu farol, Era nesta capela que os Capitães-generais tomavam posse do seu comando com a entrega de um bastão pelas autoridades da Ilha em cerimónia muito faustosa.
 
 
 
 
É desnorteante a quantidade de governantes da Ilhota que não conseguiram sair dela vivos ou pelo menos com honra e com fama de honestidade:
- O primeiro Governador de Moçambique, Sofala, Rios de Cuama e Monomotapa nomeado, em 1609, foi Nuno Álvares Pereira[28], no trono, em Portugal, estava Filipe II;
- O mesmo D. Estêvão de Ataíde, herói da defesa contra os holandeses em 1607 ”começou no trato de enriquecer, sendo substituído” [29];
 
  
 
- Diogo Simões Madeira, mentiu para Lisboa, enviando prata como sendo da Chicova, e não era. Foi processado pelo mesmo desembargador que tinha processado D. Estêvão de Ataíde. Foi condenado;
- Rui de Melo Sampaio, sofreu tentativa para ser processado pelo mesmo desembargador, mas este fugiu;
- Em 1618, Nuno Álvares Pereira, governou pela segunda vez, e tentou encontrar prata; em 1622 foi mandado regressar a Goa;
- Nuno da Cunha, em 1622, continua a sonhar com a prata da Chicova, já reinava em Portugal Filipe III;
- Em 1624, Diogo Sousa Menezes acabou a construção da fortaleza;
- Nuno Alvares Pereira é governador pela terceira vez e, finalmente, venceu o Monomotapa, em1627;
- Em 1632, Diogo Sousa Menezes é, pela segunda vez governador, mas processado pelo desembargador Paulo Rebelo, foi preso, tendo-lhe sido sequestrados os bens em Goa; fugiu da prisão;
 
 
 
 
 
 
- Pela Bula de Paulo V, D. Domingo Torrado foi nomeado Bispo de Salé, mas não pôs o pé em Moçambique;
- D. Diogo de Vasconcelos foi nomeado, em 1639, mas morreu em 1640; Nomeado Francisco de Sotomaior, não foi aceite por ser muito jovem; D. João IV é o novo rei de Portugal;
 
  
 
- Em 1641, após a Restauração de Portugal, foi nomeado António de Brito Pacheco;
- Neste ano, foi leiloado o cargo de Governador e ganhou Francisco da Silveira que ofereceu 30.000 pardaus; apenas esteve um ano no cargo;
- Júlio Moniz da Silva apoiou o envio de escravos para o Brasil, por Angola estar ocupada pelos holandeses;
- Em 1648, Álvaro de Sousa Távora apoiou os ingleses e, em 1652, D. Francisco de Mascarenhas processou-o, embora o Távora tivesse morrido pobre;
- Em 1654, D. Francisco de Lima repeliu os ingleses, estando já os franceses em Madagáscar; em 1656, D. Afonso VI sobe ao trono e, em 1683, sucede-lhe D. Pedro II;
- Em 1686, com D. Miguel de Almeida chegaram os Baneanes; Em 1 de Novembro de 1687 é criado um corpo de Zuavos Reais constituído por indígenas libertos, um batalhão com quatro companhias. Este batalhão é extinto em 22 de Setembro de 1868 por causa do grande número de baixas nas campanhas contra o Bonga;
- Em 1692, Tomé de Sousa Correia foi rendido por haver muitas queixas contra ele;
- Em 1696, o Governador D. Francisco da Costa morreu ao chegar a Moçambique;
- Em 1714, D. Francisco Mascarenhas bateu-se com Changamira;
- D. Francisco de Sotomaior fez a paz com Changamira, em 1716;
- Em 1736/39, o governador Nicolau Tolentino de Almeida foi preso e processado;
- D. Francisco de Melo e Castro, já no período pombalino, em 1750, libertou o comércio, construiu um hospital e determinou que os funcionários deixassem de comerciar e fossem pagos em moeda corrente;
 
 
 
 
 
 
- Em 1752, Moçambique foi separado administrativamente de Goa;
- Desde 01 de Abril de 1757, os funcionários civis e militares passaram a ser pagos em moeda corrente e sendo-lhes proibido todo o comércio;
- D. João Manuel de Melo suicidou-se após 21 dias de governo em 1758;
 
 
 
 
- O Brigadeiro David Mendes Pereira foi preso, em 1758;
- Calisto Rangel Pereira de Sá morreu na viagem para a Ilha, e não tomou posse; em 03 de Setembro de 1759 são confiscados todos os bens dos jesuítas;
- Baltazar Pereira do Lago governou Moçambique de 1763 a 1779, com agrado, os últimos dois anos já no reinado de D. Maria I;
- Pedro Saldanha e Albuquerque tomou posse em 1779 e morreu em 1782;
- Em 1786/93, governou António de Melo e Castro; em 17 de Setembro de 1818 a Ilhota é vila;
- Em 1819/21, João da Costa Brito Sanches, apanhou a Revolução de 1820, no continente europeu e, consequentemente, foi substituído por uma junta governativa;
- Do Brasil veio nomeado para Governador o Tenente-general João Manuel da Silva que, chegado à Ilhota, não foi aceite, mas conseguiu acalmar o pessoal da ilha e nomear uma junta; na ilha só aceitavam nomeações de Lisboa; só em 1823 tomou posse de governador;
- Entre 1824 e 1828, esteve como governador Sebastião Xavier Botelho que escreveu uma Memória Estatística sobre a África Oriental Portuguesa que ainda hoje é importante (ver nota de rodapé nº 11);
- Em 04 de Junho de 1833, os Capitães-generais passam a Governadores Gerais; D. Maria II sobe ao trono de Portugal; Revolta e contra-revolta na ilhota, com mudança de governação;
- Em 12 de Março de 1837, toma posse o novo Governador Geral, Major António José de Melo;
- Em 1838, por carta régia, foi nomeado João Carlos Augusto de Oaynhansen, marquês de Acaraty, como Governador Geral de Moçambique[31]; como a escravatura foi abolida, em 1836, já estava em execução na colónia, mas este governador suspendeu a sua execução para agradar aos comerciantes; faleceu nesse ano;
- O novo governador Joaquim Pereira Marinho, em 1840, ao chegar encontrou dois barcos de guerra ingleses que exigiram o cumprimento da lei de abolição (10 de Dezembro de 1836); Determinou contra o decidido pelo marquês de Acaraty e pôs a lei em vigor. Teve contra ele todos os negreiros de Moçambique; Em 25 de Abril de 1844 são criados os corpos de milícias (2ª linha); Em 1853, sobe ao trono de Portugal D. Pedro V; Em 14 de Dezembro de 1854 um decreto determina que todos os escravos fossem libertados; Chega à ilhota a primeira remessa de soldados deportados, incorporados em Depósito Disciplinar e colocados na Companhia Disciplinar, cujo quartel é a Praça de S. Sebastião; D. Luís sobe ao trono em 1861; Em 1876 o presídio de Lourenço Marques é elevado a vila. e em 10 de Novembro de 1887 é cidade; Em 1888 a 5ª expedição contra Bonga teve finalmente êxito; A Companhia Majestática de Moçambique é formada em 11 de Fevereiro de 1891;
 
 
 
- Em 1896, cria-se o distrito de Moçambique, com governador privativo, pois o Governador Geral passava seis meses na ilha e outros seis meses em Lourenço Marques;
- O próprio Joaquim Mouzinho de Albuquerque, Governador Geral, de 1896 a 1897, e Comissário Régio, de 1897 a 1898, acabou por se suicidar depois de regressar ao reino;
- Em 1898, tendo passado a capital para Lourenço Marques, no sul da colónia, a Ilhota quase deixou de ter história.
 
O príncipe D. Luís Filipe visitou a Ilha, em Julho de 1907, tendo sido dado o nome de Beira a um pequeno povoado na foz do rio Pungué, em honra dele, então Príncipe da Beira.
 
 
 
 
Entre 1898 e 1916, após a ocupação do norte de Moçambique, as estadias dos Governadores Gerais passaram a ser mais calmas e frutuosas, no referente a facilidade de governação.
 
Foram passando pelo governo do Estado cerca de 15 Governadores Gerais sem ligação concreta com a ilhota.
 
Entre 1916 e 1918, decorreu a 1ª Grande Guerra com a invasão alemã no norte da colónia, mas sem grande influência na ilhota.
 
Entre 1918 e 1964, o período foi sem guerras nem guerrilhas de grande importância.
 
De 1964 até 1975, desenvolveu-se uma actividade de guerrilhas, primeiro nos Macondes, depois em Tete e finalmente na Zambézia.
 
Em 1975 Portugal concedeu a independência à República Popular de Moçambique.
 
 
 
 
Na parte sudoeste da ilha (canto inferior esquerdo) pode ver-se, ainda que mal, o inicio da ponte que desde 1956 a liga ao continente (Terra Firme).
 
A população da ilhota caracteriza-se por ter sofrido decréscimos dos seus habitantes, de 12.000, em 1962, para 8.200, em 1968, e para 6.837, em 1980.
 
Mas em 1991, já voltaram a contar-se 11.988. Admite-se que, entre 1994 e 1997, a população da ilhota tenha estabilizado, entre 12.000 e 13.000 habitantes.
 
Considerando que a área da ilha é de cerca de 1 km², está-se perante uma densidade populacional de uma zona costeira bem elevada. Considerando ainda que a maior parte da população vive na zona do Macuti (Palmeiras) que corresponde a um terço da ilha, dado que os naturais não se habituam a viver em casas de pedra e continuam a ocupar as palhotas as quais são mais fáceis de remendar que as casas que foram construídas por europeus, essa densidade populacional sobe em flecha para 28.000 habitantes por km², o que em teoria está certo.
 
Além de descer de categoria ao longo da história, de capital de estado para capital de distrito, e depois unicamente para cidade, também sofreu com a construção em 1951 do porto de Nacala, deixando de ser o porto de referência no norte do estado.
 
Em 1991, a ilhota foi proclamada, pela UNESCO, Património Mundial, mas parece que nada ganhou com essa proclamação. Agravando o seu estado em 1994 o ciclone Nádia, destrói grande parte da sua estrutura física sobrevivente e cerca de dois terços da cobertura vegetal da ilha, essencialmente arbórea é derrubada.
 
Parece que actualmente a ilhota dispõe de sistemas de fornecimento de água potável e de energia eléctrica, que os sistemas de drenagem e de latrinas públicas foram reabilitados e que se encontram a ser beneficiados edifícios e espaços comuns, podendo perspectivar o alívio do número de habitantes e um turismo real.[33]
 
Que Deus, Alá ou outra qualquer divindade proteja esta ilhota, pois na sua elevada idade já merece um pouco de descanso. Mereceria sim, uma conservação adequada e um bom aproveitamento dos apoios da UNESCO, para finalmente poder ser beijada e não pisada, como se refere no início deste texto.
 

* Tenente-coronel de Artilharia. Professor Efectivo de Topografia e Geodesia da Academia Militar, Lisboa; Professor e Criador do Curso de Engenharia Topográfica no Instituto Politécnico de Beja, Professor de Topografia e Desenho Topográfico da Escola de Formação e Aperfeiçoamento do Instituto Geográfico e Cadastral em Lisboa, Professor Convidado da Universidade dos Açores para as cadeiras de Topografia e Desenho Topográfico, em Ponta Delgada, e Professor de Topografia da Universidade Lusófona em Lisboa.
**     Do livro “A Ilha de Moçambique” - Alexandre Lobato - 1945 - Guião da Cidade.
 1 Segundo afirmação do Cardeal Patriarca de Lisboa na década de 40.
[2] Roteiros portugueses inéditos da Carreira da Índia do Séc.XVI - Fontoura da Costa, 1940.
[3] África Austral - Brian Fagan, 1965.
[4] Roteiros - Fontoura da Costa, 1940.
[5] Biblioteca do Convento de Mafra.
[6] Moçambique - Major J. Mouzinho de Albuquerque, 1899.
[7] Monografia da Ilha de Moçambique - Alexandre Lobato, 1945.
[8] Monografia da Ilha de Moçambique - Alexandre Lobato, 1945.
[9] Era suposto a existência de um lago central em África, de onde irradiavam o Nilo, o Niger e o Zambeze.
[10]  Brian Fagan - África Austral, 1965
[11]  Roteiro de Lisboa à Índia, de D. João de Castro, 1538.
[12]  Roteiro de Lisboa a Goa - D. João de Castro, 1538.
[13]  Dicionário Universal de História e Geografia - M. N. Buillet, 1880.
[14]  Sebastião Xavier Botelho, par do reino em 1835, doutor em leis pela Universidade de Coimbra, desempenhou diversos cargos de responsabilidade no Reino, no Brasil, foi capitão general na Madeira, nos Açores, em Angola e em Moçambique. Publicou a referida “Memória estatística”, a qual mereceu de Alexandre Herculano o seguinte comentário: É o mais bem escrito livro de prosa que há vinte anos se tem escrito em Portugal. A quadra de Camões referida, é dos Lusíadas.
[15]  Dicionário Universal de História e Geografia - M. N. Buillet, 1880.
[16]  “8000 quilómetros através de Moçambique” - Pedroso de Lima - Boletim da Agencia Geral das Colónias Nº118, 1933.
[17]  Os Africanos - John Iliffe, 1995.
[18]  O Livro dos Hereges, Aydano Roriz, 2006.
[19]  Os Africanos - John Iliffe, 1995.
[20]  Idem. Idem.
[21]  Os Africanos - John Iliffe, 1995.
[22]  A Ilha de Moçambique, Alexandre Lobato, 1945.
[23]  Como fizeram os portugueses em Moçambique - Tenente Mário Costa, 1928.
[24]  História do Presídio de Lourenço Marques II. - Alexandre Lobato, 1960
[25]  Monografia - A Ilha de Moçambique - Alexandre Lobato, 1945.
[26]  Monografia - A Ilha de Moçambique - Alexandre Lobato, 1945.
[27]  Como os portugueses fizeram em Moçambique - Tenente Mário Costa, 1928.
[28]  De 1501 a 1569 governaram 24 Capitães Mores e de 1569 a 1609, 14 Capitães Generais.
[29]  História das Colónias Portuguesas - Rocha Martins, 1933.
[30]  Pormenor incluído numa carta de Moçambique de 1909, de autoria de Gomes da Costa.
[31]  Desde 1838 passou Moçambique a dispor de Governadores Gerais.
[32]  Pormenor de uma de duas folhas de Moçambique, desenhadas por Gomes da Costa, ainda na monarquia.
[33]  Proposta de gestão para o Estudo do Ambiente Marítimo e Costeiro da Ilha de Moçambique - Governo de Moçambique - 2009 (da internet).
 
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2011-02-23
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Tenente-coronel

João José de Sousa Cruz

Tenente-coronel de Artilharia. Professor Efectivo de Topografia e Geodesia da Academia Militar, Lisboa; Professor e Criador do Curso de Engenharia Topográfica no Instituto Politécnico de Beja, Professor de Topografia e Desenho Topográfico da Escola de Formação e Aperfeiçoamento do Instituto Geográfico e Cadastral em Lisboa, Professor Convidado da Universidade dos Açores para as cadeiras de Topografia e Desenho Topográfico, em Ponta Delgada, e Professor de Topografia da Universidade Lusófona em Lisboa.

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