Nº 2578 - Novembro de 2016
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
A situação de segurança na Europa do presente. A OTAN e a União Europeia
General
Luis Valença Pinto

O meu propósito é abordar o quadro de Segurança da Europa do presente, e a função que nele têm, e podem e devem ter, Atores tão importantes como a OTAN e a União Europeia (UE).*

Uma primeira constatação, que creio que dispensa demonstração, é que as sérias preocupações que decorrem da situação de Segurança que hoje se vive na Europa evidenciam como a Segurança é absolutamente central para as Relações Internacionais contemporâneas. No caso particular da Europa e provavelmente mais do que em qualquer outro espaço geopolítico, há poucos anos atrás, tudo poderia fazer supor que assim não seria. Mas a realidade está aí para nos fazer perceber como esse sentimento, correspondendo acima de tudo a um desejo, era sobretudo uma ilusão.

Infelizmente o entendimento da centralidade contemporânea da Segurança é, e em vários planos, negligenciado com muita frequência. Na esfera dos poderes públicos, na prioridade intelectual, cultural e científica, na percepção social. Perigosamente negligenciado. O que não significa que se deva ter como critério a adoção de uma doentia postura securitária. O que acima de tudo é necessário é dar aos fenómenos e às realidades da Segurança o cuidado de estudo e de reflexão, bem como a visibilidade, que precisamos de lhes atribuir.

E fazê-lo compreendendo a Segurança como algo que hoje, importando aos Estados e Coligações, importa também a uma miríade de outros Atores identicamente ativos na cena internacional: multinacionais, transnacionais, igrejas, ONG, grupos terroristas, organizações criminosas, etc.. Uns bons e outros maus.

Todos diferentes. E ainda que, a esses novos protagonistas, temos que crescentemente juntar as pessoas, o que nos obriga a perceber que no nosso tempo não é possível construir e assegurar Segurança sem as pessoas e, muito menos, contra as pessoas. Ou seja, que presentemente as pessoas ocupam um lugar central nos objetivos e nas preocupações da Segurança. Ao mesmo tempo que, mesmo individualmente, são também Atores de Segurança.

Seja qual for o entendimento que se perfilhe, não é preciso acentuar que a Segurança europeia não está hoje num bom momento. O que não deve constituir uma surpresa. Também porque poucas coisas vão bem no contexto europeu, e mesmo no espaço mais vasto do mundo Ocidental. Uma análise destas dificuldades, visando designadamente identificar os seus fundamentos, levar-nos-ia muito longe e não é esse o meu objetivo.

Vou então concentrar-me no domínio da Segurança.

São vários os fatores que contribuíram e contribuem para a situação que atualmente existe na Europa e para aquilo que parecem ser relevantes condicionalismo futuros.

Saliento dois. A alteração do envolvimento norte-americano e o complexo de ameaças e riscos que hoje impendem sobre o nosso continente.

No que se liga à crescente prioridade dada pelos Estados Unidos à região Ásia-Pacífico e ao consequente menor empenhamento no espaço euro-atlântico, justificam-se algumas considerações.

Neste momento concreto é bom ser cauteloso no que respeita ao posicionamento estratégico norte-americano. A mudança de administração que ali está perto de ocorrer justifica prudência.

Pode haver ajustamentos de ritmo e de modo de ação, mas essa alteração do principal foco de esforço geopolítico dos Estados Unidos vai continuar, independentemente do render da guarda dos responsáveis.

São fundamentalmente duas as razões que impelem este movimento. A mais importante é sem dúvida a extraordinária pujança económica e financeira da região da Ásia-Pacífico, o emaranhado de tensões e disputas que a percorrem (várias delas com uma dimensão nuclear), e o facto dos EUA sentirem necessidade de estarem mais próximos da China, acompanhando mais estreitamente a sua marcha ascensional, que percebem que fará da China a potência sua rival dentro de poucas décadas.

A segunda motivação decorre dos EUA manifestarem crescente indisponibilidade para continuarem a suportar uma fatia tão desproporcionada dos encargos com a Segurança e Defesa da Europa como aquela que hoje suportam. Tomando como uma referência o orçamento da OTAN, atente-se que os EUA, que há 15 anos eram responsáveis por cerca de 60% desse orçamento, o que já então tinham como excessivo, asseguram hoje sensivelmente 77%. E isto não porque tenham aumentado exponencialmente os encargos da Aliança, mas apenas porque os Aliados europeus se têm progressivamente demitido deste exercício de responsabilidades.

E tudo se passa num contexto em que os norte-americanos identificam nos seus aliados europeus capacidades e recursos para contribuírem mais e melhor para o esforço comum. No que, mesmo atendendo à crise, têm inteira razão, pelo menos no plano material.

Em 2015, as despesas de defesa dos EUA situaram-se nos 618 mil milhões de USD e, no seu conjunto, as da Europa em 253 mil milhões de USD, ou seja em cerca de 40%, com agravante de, com a dificuldade de análise inerente a um tal cálculo, se avaliar o produto operacional europeu como ficando abaixo de 40% do americano. Ou seja, além de dispenderem menos, os europeus também retiram do seu investimento um rendimento proporcionalmente inferior.

O que os Estados Unidos têm vindo a dizer e dizem de forma mais vocal do que implícita, é que os europeus têm que fazer a sua parte e que não devem tomar como garantido que a América do Norte se deixará automaticamente arrastar para todo e qualquer problema de Segurança que se coloque no espaço europeu propriamente dito, ou para as situações que surjam no near abroad europeu, certamente no Norte de África e na região do Sahel e, ainda que mais limitadamente, no Médio Oriente.

Naturalmente que, com isto, os norte-americanos não se estão a excluir por completo do quadro da Segurança europeia. Desde logo permanecerão indubitavelmente fiéis ao espirito da Aliança Atlântica e ao preceito de Defesa Coletiva que está consubstanciado seu artigo 5º. Mas, independentemente disso, continuarão a estar presentes em tudo o que respeite ao nuclear e à Rússia e, relativamente ao Médio Oriente, pelo menos em tudo o que diretamente respeite ao problema israelo-palestiniano.

Ao mesmo tempo que manterão o princípio da sua disponibilidade para ajudar a suprir as carências europeias, em áreas como informações estratégicas, espaço, transporte estratégico por ar e mar e logística. No fundo, aos acordos Berlim Plus.

Creio que nos cabe, a nós europeus, reconhecer que os Estados Unidos têm razão na apreciação que fazem. E que estamos a fazer menos do que podemos e devemos. Reconhecer esse facto e agir em conformidade, é uma necessidade e é algo que serve os nossos interesses.

Certamente que temos que fazer mais em termos financeiros, mas talvez a primeira resposta europeia se deva inscrever no domínio das opções políticas e estratégicas. A falta de clareza e de vontade política e a ausência de determinação europeias estão em boa medida na base da crise, ou pelo menos da mutação, que percorre a relação transatlântica e a perturbar muito esse relacionamento.

Não oferece discussão que temos que gastar mais e seguramente melhor, com a Segurança e a Defesa. O indicador ligado à afetação de 2% do PIB para esse efeito é meramente uma referência. Por si só, o dinheiro não proporciona melhores capacidades. O que deve orientar as nossas opções é a necessidade de desenvolvermos de facto as nossas capacidades para agir. O caminho está mais em adequados investimentos do que em gastos globais com a Segurança e Defesa.

Por essa razão, a decisão tomada pelos estados membros da OTAN, em 2014, em Gales, de, num horizonte progressivo até 2020, se comprometerem com a aplicação de 2% do PIB para Segurança e Defesa, mas garantido que pelo menos 20% desses montantes se destinará a investimento, me parece uma boa decisão. Contudo e sem querer ser cético, falta verificar onde estará a vontade política para realmente honrar esses compromissos.

Tal como só com empenhada e esclarecida vontade política se poderá combater a desenfreada, injustificada e muito dispendiosa duplicação a que se assiste na Europa em matéria de fabricação de material militar. É aqui que radica o menor rendimento europeu a que antes aludi.

E também só com empenhada vontade política se podem materializar, nos melhores termos e dentro dos limites políticos que objetivamente têm, as preocupações de pooling and sharing da UE ou a equivalente smart defense da OTAN, numa palavra, os objetivos de partilha e estruturação conjunta de capacidades de Segurança e Defesa.

É tempo de abordar o que se refere às ameaças e riscos que a Europa hoje enfrenta e que são também causa da grave perturbação que se vive em matéria de Segurança Europeia.

O clássico e eventualmente o esperado, é que a este propósito se enuncie uma longa lista de fatores externos. E que se faça a sua adequada análise. Mas, no meu entendimento, a maior ameaça que a Europa hoje enfrenta está dentro das suas portas. Tentando ser sintético, porventura excessivamente sintético e com isso perdendo rigor, do que falo é da crise da ideia de Europa, da perda de alma e de propósito, da ausência de uma visão acerca do papel da Europa do Mundo, da incompreensão do chamamento que os problemas do Mundo fazem às capacidades e às responsabilidades europeias, da falta de vontade política e da consequente inexistência de direção estratégica, de uma Europa que parece querer negar a sua tradição de mundividência, de inclusividade e de pluralidade, que se afasta de si mesma, refugiando-se quanto muito nas dimensões financeira e macroeconómica, numa Europa que presume poder ignorar as dinâmicas e as consequências da globalização.

Em suma, numa pobre e desgovernada Europa que parece ter desistido de si própria e em que emergem tendências fragmentárias e retornos aos nacionalismos.

Poucas coisas seriam mais nocivas à Paz e à estabilidade na Europa do que a renacionalização das políticas de Segurança e Defesa. Certamente pelos egoísmos, rivalidade e tensões que fariam ressurgir, mas também porque, quem presumisse seguir essa via, cedo descobriria que estaria totalmente ultrapassado pela escala e pela transnacionalidade dos fenómenos e dos problemas.

Deixo o aprofundamento destas múltiplas mas conexas questões para outra altura e, retomo de forma direta, o tema das ameaças e riscos.

No seu conjunto, essas ameaças e riscos estão a influenciar muito negativamente o quadro da segurança europeia. Tanto pela sua natureza e expressão, como também pela forma como são avaliadas pelos europeus e de que resulta um verdadeiro tumulto intraeuropeu.

Tentando caraterizar esse quadro de segurança é forçoso reconhecer que a Europa enfrenta, hoje e simultaneamente, duas situações significativamente difíceis.

Uma, a Leste, diretamente ligada com a agressividade que se identificam na postura e no comportamento da Rússia do presente, além do mais em ostensivo desrespeito pelo Direito Internacional.

A segunda, com uma relevância pelo menos equivalente, verifica-se no Sul e está associada às muitíssimas questões com origem no arco de instabilidade que se estende da Mauritânia ao Paquistão, percorrendo o Norte de África, o Médio Oriente e o Afeganistão, incluindo a região do Sahel e também com algumas preocupantes ramificações para a África subsariana.

Creio ser fácil de entender que, no presente, e diferentemente do que algumas interpretações forçadas e erradas querem afirmar, a segurança da Europa não se desenvolve numa “frente” a Leste, como zona de preocupação principal, e num ”flanco” a Sul, zona de preocupação secundária. Se se quiser persistir nessa retórica de frentes e flancos que atravessou a Guerra Fria, então aquilo a que a Europa faz face é a duas “frentes”.

Mas não vejo nenhum mérito em nos mantermos referenciados a modelos da Guerra Fria e, ainda menos, a tomá-los como fonte de inspiração. O Mundo é outro. A Guerra Fria terminou e é inteligente não a recriar. Quem venceu foram os ideais de liberdade e democracia que sempre foram os nossos. Não identifico nenhuma virtude ou vantagem em regressar aos dados e aos parâmetros da Guerra Fria ou na revitalização do seu modelo político e estratégico. Bem ao contrário, considero que isso seria artificial, errado, contraproducente e perigoso.

O Mundo da Guerra Fria era tristemente simples e marcado por rigidez estratégica (o que em si mesmo é uma contradição…). O Mundo de hoje é polifacetado e complexo, incompatível com rigidez, antes requerendo agilidade, iniciativa e flexibilidade. Pleno de desafios e pleno e oportunidades.

A boa compreensão do atual momento implica considerar alguns elementos particularmente importantes. Saliento dois: por um lado, as diferenças de percepção relativas à Segurança europeia que se verificam entre os europeus e, por outro lado, as diferenças de natureza entre o que se passa a Leste e o que se passa a Sul.

Apesar de tudo, tendo a considerar o primeiro destes dois aspetos como o mais determinante. As nações e os cidadãos da parte oriental da Europa têm dificuldades em reconhecer as ameaças e os riscos que se manifestam no Sul. E vice-versa.

Uma tal divergência, para que não encontro verdadeiro fundamento em diferenças culturais ou sociais ou em modelo político, evidentemente que prejudica a nossa comum segurança. Mas, é necessário compreender que, como exemplo, a Líbia é na realidade um problema para a Polónia. Tanto quanto a Rússia é um problema para a Espanha.

Enquanto não partilharmos uma abordagem comum teremos dificuldade em compreender e em gerir corretamente a situação.

Não a compreenderemos como dizendo respeito a todos e estaremos a prejudicar-nos mutuamente.

Naturalmente que seria uma abstração irrealista esperar que as sociedades do Báltico tenham sobre a Síria o mesmo olhar que têm os italianos ou os gregos. Ou que os espanhóis e os franceses percebam a Rússia, tal como hoje ela é vista no lado oriental do nosso continente comum.

Penso que não exagero se observar que, em Portugal e de uma forma geral na Europa Ocidental, a Rússia não é percebida como uma ameaça às nossas independências e soberanias. E isso apesar da forte e unânime condenação que é feita, que tem que ser feita, em relação ao inaceitável comportamento russo na Geórgia, na Crimeia e na Ucrânia. E também na Síria.

Tenho a convicção que, a nós europeus, nos é indispensável um acordo sobre um elenco comum de ameaças e riscos, aceitando com realismo diferentes avaliações e perspetivas nacionais para cada um desses desafios. Mas acima de tudo reconhecendo que, mais uma vez como exemplo, a Rússia e a Síria são problemas comuns a todas as nações da Europa.

Enquanto não for possível dispor desse nível de comum entendimento e de mútuo respeito, não existirá um sentimento de comunidade e não será viável desenvolver uma Política Comum de Segurança e Defesa no seio da UE, nem uma cooperação coordenada e virtuosa no quadro da Aliança Atlântica.

Desenganem-se os que pensam (e às vezes parecem desejar…) que as divergências intra-europeias são apenas perniciosas para a UE. No domínio da Segurança elas são também nocivas para a OTAN.

Um outro aspeto, que carece de ser atendido, tem que ver com a necessidade de identificar corretamente as diferenças essenciais na natureza dos problemas que se colocam no Leste e no Sul.

Sendo sintético e porventura um pouco simplista, pode dizer-se que, no Leste, a Rússia está a conduzir uma política externa intoleravelmente agressiva que em larga medida visa suportar e manter, no plano doméstico, um regime pouco democrático e que enfrenta severas contrariedades económicas. Ao mesmo tempo que igualmente pretende dividir a UE, com a implicação de com isso também dividir ou pelo menos afetar a relação transatlântica.

Sem prejuízo de outras dimensões, de que destaco as questões culturais e sociais referentes à observância dos direitos das minorias, os problemas que a Rússia está a originar no Leste europeu precisam de ser respondidos sobretudo nas dimensões política, diplomática e militar da ação estratégica. Para tal o contributo da OTAN é precioso, mas não o é menos o da UE, uma vez que a via militar não pode por si só levar solução ao que se vive e que as dimensões diplomática e política da Aliança têm uma expressão muito limitada.

Nessa resposta à Rússia há três parâmetros essenciais.

O primeiro e absolutamente basilar, é que não podemos aceitar que a Rússia pretenda determinar ou abusivamente condicionar as nossas escolhas livres, ou seja, não podemos reconhecer à Rússia nenhum poder ou droit de regard sobre as nossas decisões, nacionais ou coletivas. É uma questão de legitimidade e de Direito.

E é escusado frisar que em matéria de legitimidade e de Direito não pode haver cedências.

O segundo, tem que ver com a necessidade de estar atento e empenhado em evitar escalada ou confrontações desnecessárias e gratuitas com a Rússia, designadamente no domínio militar. Tão errada como a atual atitude russa de provocação e de criação de factos consumados, seria uma postura de despropositada confrontação, que muito provavelmente geraria um exercício infantil, cego e perigoso, próximo de um jogo chicken que, sendo mau para adolescentes, é inaceitável para Atores do Sistema Internacional. Por definição, a firmeza, e nós precisamos de ser firmes na relação com a Rússia, tem que se basear em pensamento sábio, cuidadoso e bem calculado.

Consequentemente, o seu correspondente processo de decisão tem que excluir a possibilidade de quaisquer atitudes irrefletidas e precipitadas; o terceiro parâmetro liga-se ao reconhecimento que, por mais que haja fatores de constância no substrato geopolítica, a Rússia é uma coisa e que a “Rússia de Putin” é outra; e que, mais cedo ou mais tarde, antagonismos políticos, tensões económicas e, se nada disso ocorrer, a fatal marcha da biologia, transformarão Put in em Put out, sendo que a realidade é que a Rússia é um parceiro indispensável na regulação de dossiers de Segurança fundamentais, no plano continental e global; exemplos são a proliferação nuclear, o terrorismo, o islamismo extremista, os tráficos ilegais, o crime organizado, a segurança energética ou o ambiente. Foi este o espírito e o racional que suportaram as estratégias de cooperação com a Rússia que tanto a UE como a OTAN desenvolveram na passada década, e que a Rússia então igualmente subscreveu. Esse racional persiste, mesmo se o consequente espírito não está hoje presente.

Tenhamos esperança que regresse. Olhando agora para o Sul, o que imediatamente ressalta é que, na sua natureza, as ameaças e os riscos que estão presentes são muito diferentes dos do Leste.

No Sul, as ameaças e riscos estão basicamente relacionadas com quadros de exclusão política, social e económica. Com estados falhados, situações de vazio de poder, disputas étnicas e extremismos de alegada inspiração religiosa.

A sua resposta continua a implicar ação política, diplomática e militar. Mas é completamente inviável dar-lhes resposta positiva sem também envolver outras dimensões da ação estratégica, em particular as dimensões económica, social e cultural. E sem reforçar muito consideravelmente a atenção e a perspetiva políticas.

A consequência óbvia é que, agindo sozinha, a OTAN não é capaz de garantir segurança e estabilidade à parte Sul do nosso continente. Estes objetivos só podem ser alcançados mediante uma cooperação positiva e construtiva entre a OTAN e a UE. Tendo presente que, mesmo no atual registo de crise, a UE, sendo muito mais fraca do que a OTAN no plano militar, é de longe muito mais forte em todas as outras áreas da segurança contemporânea: política, diplomática, económica, financeira, social e cultural. Mas não é despiciendo frisar que uma forte cooperação dentro da UE e um efetivo empenhamento da União, são condições primárias de viabilidade para o sucesso dessa abordagem partilhada com a OTAN. No que têm lugar destacado as Políticas de Vizinhança da União, em particular no contexto da bacia do Mediterrâneo.

Também neste contexto, nós, europeus, podemos e devemos identificar outra forte razão para encontramos um terreno comum no que toca às nossas perspetivas e desenvolvermos uma visão comum sobre as ameaças e riscos que afetam as nossas sociedades. Dado esse passo fundador será mais fácil o progresso na construção de uma Política Comum de Segurança e Defesa.

É certamente difícil, mas em minha opinião é indispensável. Levará o seu tempo, mas é bom que se tenha presente que já estamos atrasados.

Só tendo sucesso nesse exercício podemos por travão às divisões que vão surgindo na Europa e na busca e identificação das respostas que a nossa segurança requer e que, em absoluto, carecem de ser comuns para serem politica e estrategicamente relevantes e eficazes.

Em suma, penso que, no presente, a agenda fundamental para a segurança europeia se deve basear numa tripla necessidade: 1) a de salvaguardar e desenvolver uma real harmonização de pontos de vista e de tendências entre as nações europeias, nomeadamente entre as do Leste e as do Sul da Europa; 2) a de reforçar e estruturar uma efetiva e útil complementaridade e cooperação entre a UE e a OTAN; percebendo que, evitando riscos de competição ou duplicação, ambas são necessárias e úteis e também que é mais fácil a UE desenvolver a capacidade militar que hoje não tem, do que a OTAN desenvolver todas as muitas capacidades de que não dispõe; ou seja de que a UE é um parceiro indispensável e que para os países europeus a melhor receita para serem bons aliados na OTAN é serem bons europeus; 3) a de preservar as condições e os instrumentos que possam permitir a reativação de um diálogo construtivo e de uma política de cooperação com a Rússia, quando a situação em Moscovo for mais consentânea com os ideais de Primado da Lei, de Paz e de Democracia.

 

* Conferência proferida no Centro de Investigação em Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa (CIEP), em 9 de novembro de 2016.

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2017-06-05
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Luis Valença Pinto

Nasceu em Lisboa, em 7 de fevereiro de 1946, ingressou na Academia Militar em 14 de outubro de 1963 e passou à situação de Reforma em 7 de fevereiro de 2011, perfazendo mais de 47 anos de serviço efetivo nas Forças Armadas.

Foi promovido ao posto de General em 6 de Agosto de 2003, quando assumiu as funções de Chefe do Estado-Maior do Exército, que exerceu até 5 de Dezembro de 2006, data em que assumiu as funções de Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, responsabilidade que deteve até à passagem à Reforma.

Presentemente, é Professor Catedrático Convidado no Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa e no Departamento de Relações Internacionais da Universidade Autónoma de Lisboa, sendo investigador em ambas as instituições.

REVISTA MILITAR @ 2024
by CMG Armando Dias Correia