Nº 2511 - Abril de 2011
Pessoa coletiva com estatuto de utilidade pública
Torres Vedras e a Guerra Peninsular nos Registos Paroquiais
Mestre
Célia Reis
Em Novembro de 1807, o exército francês, comandado por Junot, chegou a Portugal. Era a primeira das três invasões que até 1810 teriam lugar, duas das quais tornaram Torres Vedras um centro importante do cenário de guerra.
 
Com efeito, poucos dias depois da chegada a Lisboa, já uma força militar se instalava no espaço torriense, sob o comando do brigadeiro Charlot. Aqui se manteve durante meses como força invasora que alterou o quotidiano, entre obrigações de alojamento e alimentação, imposição da entrega de pratas religiosas e contribuição de guerra, alterações institucionais e dinheiro francês, entre, enfim, pessoas desconhecidas, alguns civis mas sobretudo militares usurpadores. Em Agosto de 1808, foi outrossim o concelho um lugar essencial ligado à batalha do Vimeiro. Era na vila o quartel-general de onde Junot partiu ao encontro do exército luso-britânico, a ela retornou depois do confronto, impedindo qualquer manifestação aos torrienses; aqui esperou, juntamente com os seus generais, a decisão dos ingleses, aqui também aceitou o acordo oferecido, no que a história veio a conhecer como a Convenção de Sintra[1]. Saídos os franceses, chegaram então os exércitos português e inglês, permitindo o júbilo da vitória nacionalista.
 
Depois destes acontecimentos iniciou-se em Torres Vedras a construção das Linhas defensivas, que por isso passaram à História com o seu nome. Wellington considerava, então, a maior probabilidade de ser a esta passagem que se dirigiria o exército francês quando invadisse o país pela terceira vez, mas as Linhas estenderam-se cruzando todo o concelho e prolongaram-se até ao Tejo, num esforço colossal de trabalho conjunto de gentes coagidas a, deste modo, conservarem a sua terra.
 
Não foi, todavia, para Torres Vedras que se dirigiu Massena com as suas tropas. Desconhecendo efectivamente as fortificações, veio por caminhos mais a leste, chegando ao Sobral de Monte Agraço. Vivia-se então um Outono extraordinariamente chuvoso, os campos alagados, os rios e ribeiras transbordando. A oeste da vila de Torres Vedras estes elementos naturais criavam uma barreira, dificultando a circulação. Deste modo, o concelho torriense, totalmente atravessado pela Linha defensiva, viu-se perante grande diferença de situações: enquanto algumas das suas freguesias, a norte e poente, foram ocupadas, a ocidente da vila não se sentiram os efeitos directos da presença francesa.
 
A nossa análise anterior sobre estas questões mostrou-nos uma importante fonte que revela incidências das invasões na vida das populações: os registos paroquiais[2]. Com efeito, para além da sua função específica de registar as ocorrências religiosas, o baptismo, o casamento e a morte «da vida deste mundo», estes documentos perspectivam-nos outras informações sobre os movimentos populacionais e a sua geografia, que alguns párocos quiseram deixar - apesar de se apresentarem diferenciadas conforme as características dos autores, alguns clérigos muito minuciosos nos seus assentamentos, outros parcos em anotações. É, pois, sobre eles que se dedica este artigo[3], complementar aos muitos estudos realizados, sobretudo aquando da comemoração do bicentenário destes acontecimentos.
 
Uma ressalva de impõe desde já: analisamos aqui o concelho de Torres Vedras considerando as suas fronteiras actuais, não as da época das invasões, quando o termo se alargava a um espaço muito mais vasto, abrangendo grande parte do actual município de Mafra.
 
A primeira invasão deixou poucos testemunhos nesta fonte. Estabelecidos na vila, os militares franceses organizaram o seu próprio hospital e, apesar de terem mandado que os padres de S. Pedro benzessem o espaço para cemitério, os seus mortos não ficaram nos livros de registo dos mesmos clérigos. Da mesma forma, a batalha do Vimeiro também não se encontra anotada nos livros da freguesia torriense que lhe ficava mais próxima.
 
Apesar da escassez, ainda se evidenciam alguns vestígios da passagem dos militares ou outros estrangeiros, vários dos quais relativos à sua deslocação em família. Neste caso, foram primeiro os franceses a deixarem essas marcas. No dia 14 de Março de 1808, na freguesia de S. Pedro, foi baptizada Leonor, filha de João Luiz Compain e Ana Maria, casados, que nesse momento viviam na vila de Torres Vedras, a qual nascera no dia 12. Os padrinhos eram igualmente franceses e residentes na vila[4]. Uma situação idêntica acorreu com o baptismo de outra criança em S. Miguel, em Abril[5].
 
Depois da batalha do Vimeiro encontramos britânicos. Daniel Sugdam e a sua esposa Ana, ingleses, encontravam-se na vila, em casa do dr. Manuel Tavares de Macedo, e aí nasceu o filho no dia 31 de Agosto de 1808, para ser baptizado passados poucos dias[6]. Nascida a 19 de Setembro, a filha do casal Guilherme e Ana Messen, irlandeses, recebeu o mesmo Sacramento três dias depois[7].
 
Tendo o exército francês partido no Verão de 1808, alguns dos seus soldados mantiveram-se na região, talvez porque as condições de saúde lhes tenham impedido o regresso. Conhecemo-los pela morte de alguns homens no Estio do ano seguinte: na casa do estalajadeiro do Turcifal faleceu um soldado italiano que viera na tropa francesa e fora ferido com uma bala no «choque que ouve junto a São Mamede da Arroliça»[8]; em Runa morreu um soldado do Piemonte[9].
 
Para além destes quadros, a primeira invasão ficou-nos ainda marcada por outro acontecimento trágico. Recuando depois do encontro da Roliça, a 17 de Agosto, os franceses concentraram-se em Torres Vedras, espalhando-se os corpos do exército pelos campos em redor. Na vila, sob ameaça de espionagem, mataram dois mendigos, quase fazendo o mesmo a outro. Estes «mortos pela tropa Franceza» eram desconhecidos e, por falta de tempo, apenas receberam o Sacramento da Penitência. Foram enterrados junto à igreja de S. João[10].
 
Em 1810 ocorreu a terceira invasão do exército francês em Portugal. Esperada que era, tinha-se preparado a defesa militar com as Linhas defensivas da capital e todos os seus elementos integrantes, materiais e humanos. Aprontou-se também o elemento civil, sob as ordens de Wellington ou por iniciativa própria. Assim, a aproximação dos gauleses levou à tomada de cuidados preparatórios para a defesa dos bens: em S. Domingos da Carmões, o respectivo pároco escondeu o cartório e paramentos num dos carneiros da igreja[11]; na paróquia de S. Tiago suspenderam-se os registos paroquiais nos respectivos livros «pelo inversível motivo de fazer conduzir os livros para Lisboa», para evitar descaminhos[12].
 
Também por vontade própria se realizaram migrações: muitos foram os torrienses que rumaram para a capital, deixando as suas casas - que, aliás, em muitos casos haveriam de ser ocupadas pelos soldados, aqui chegados na noite de 7 para 8 de Outubro, quando chovia copiosamente.
 
Outras foram as deslocações por determinação superior. Fazia parte do plano de defesa o estabelecimento do vazio nas terras por onde passaria o exército francês. Apesar de não ter sido cumprido em muitos lugares, para sul vieram numerosas pessoas, que por aqui passaram em busca de refúgio.
A aproximação gaulesa implicou igualmente o deslocamento obrigatório das pessoas da região do concelho que viria ocupada. O pároco de S. Domingos de Carmões, cuidadoso em se justificar, escreveu como tendo cumprido as «riais ordens»[13]. Foi, então, também necessário tomar as providências imediatas, mesmo no campo religioso. Baptizaram-se rapidamente os recém-nascidos, sacramentaram-se os que não podiam partir: assim fez o padre da Carvoeira a Quitéria Maria, de Almagra, porque estava entrevada na cama há anos[14].
 
As Linhas de Torres foram o marco da demarcação. Eram território militar, naturalmente, construídas para suster o avanço francês, por etapas sucessivas até à capital. Mas, mais do que isso, no aspecto que aqui nos interessa, elas corresponderam também à separação do espaço das populações, entre o permanecer no território «francês» ou a «zona de segurança», a sul das fortificações.
 
Foram muitas as pessoas que procuraram refúgio em zonas mais a sul, mas muitas também se concentraram no concelho de Torres Vedras, alargando-se por todo o seu espaço. Vejamos exemplos no quadro I.
Quadro I - Proveniência e destino dos refugiados
 
Proveniências
Freguesia ou localidade onde se instalaram
Torres Vedras
Aldeia Grande
Matacães15
Ermegeira
Quinta do Calvel16
Amial
Casal das Figueiras (A-dos-Cunhados)17, Matacães18
Freguesia do Ramalhal
Freguesia de A-dos-Cunhados19
Carvoeira
Torres Vedras20
Curvel
Torres Vedras21
Zibreira
Turcifal22
Matacães
Torres Vedras23
Ordasqueira
Torres Vedras24
Quinta da Arroteia, Dois Portos
Quinta da Chapuceira25
Casalinhos de Alfaiata
Turcifal26
Torres Vedras
Turcifal27
Alenquer
Paiol
Matacães28
Cabanas de Chão
Matacães29
Penedos (Ventosa)
Turcifal30
Labrugeira
Turcifal31
Cadaval
Peral
S. Maria do Castelo32, freguesia de S. Mamede da Ventosa33, Turcifal34
Vilar
Quinta da Portucheira35
Sobrena
Freguesia de S. Maria do Castelo136
Casalinhos (freg de S. Tomé de Lamas)37
Torres Vedras
S. Tomé de Lamas
Torres Vedras38
Óbidos
A-dos Francos
Casal de Barbas39
Roliça
Freiria40
Alcobaça
Alcobaça
Runa41
Cela
Casal de Barbas42, S. Pedro da Cadeira43
Maiorga
Cadriceira44
Cós
Turcifal45
Salir de Matos
Turcifal46
Porto de Mós
Alcaria
Runa47
Alvados
Ramalhal48, Casal de Barbas49
Cabeça das Pombas
Casal de Barbas50
Juncal
A-dos-Cunhados51
Minde
Matacães52
Termo de Porto de Mós em geral
Mugideira53, freguesia de S. Miguel54
Aljubarrota
Aljubarrota
Ramalhal55
Batalha
Freguesia de Batalha
A-dos-Cunhados56
Leiria
(designação
genérica
de termo,
bispado,
comarca)
Cravide
A-dos_Cunhados57, Matacães58, Torres Vedras59, Freiria60
Freguesia de Gaiola
Ramalhal61
Freguesia de N.. Sr.ª dos Milagres
Turcifal62
Porto de Lagoa
Turcifal63
Vieira
Turcifal64, Freixofeira65, Cadriceira66
Vale da Horta
A-dos-Cunhados67
Reguengo do Fétal
Orjariça68
Monte Real
Monte Redondo (de passagem?)69
Sanguinhal
Louriceira70
Leiria (genérico)
Casal de Barbas71, A-dos-Cunhados72, Ramalhal73, Torres Vedras74
???
Coimbram de Cima e Coimbram de Baixo
A-dos-Cunhados75
Coimbra (termo, bispado, etc.)
Coimbra
Torres Vedras76
Penacova
Turcifal77
Pombal
Turcifal78
Pombalinho
Freg. S. Pedro79
Marinha (Louriçal)
Casal do Casalinho, Turcifal80
Silveirinha
Turcifal81
Torrozelo
Turcifal82
Vila Nova de Anços
Turcifal83
Torres Novas
Ribeira
Orjariça84
Termo de Torres Novas em geral
Quinta do Calvel85
Tomar
Junceira
Casal de Barbas86
Arouca
Arouca
Turcifal87
Aguiar de Sousa
Freguesia de S. Miguel de Gandra
Mugideira88
Póvoa de Varzim
Póvoa de Varzim
Carvalhal89
Barcelos
S. Maria de Quintãs
Torres Vedras90
Lamego
S. Bartolomeu de Barqueiros
Turcifal91
 
 
 
 
Muitos dos que vinham em fuga pereceram. Logo no dia 8 de Outubro, ainda nem os franceses tinham chegado junto ao concelho, aqui faleceu um homem do Bombarral «vindo fugindo com os seos vizinhos»[92]. Indo de jornada, morreu na Freixofeira um homem proveniente de Alfeizerão[93]. Na Quinta do Calvel finou-se, também indo de jornada, uma viúva do Cadaval[94]. No Turcifal aconteceu o mesmo a uma menor, vindo de caminho com os pais desde Ventosa, Alenquer[95], entre outros casos[96].
 
Frequentemente deverá ter sido curta a distância percorrida. Assim, do Ramalhal terão, provavelmente, saído muitas pessoas para oeste, para A-dos-Cunhados, encontrando-se nos livros de registo daquela primeira paróquia vários eventos decorridos na igreja paroquial desta última[97]. O baptismo que se realizou a 27 de Dezembro de 1810 deixou mesmo a informação de que o evento ocorria neste último templo por impedimento que havia na do Ramalhal[98]. O próprio pároco desta freguesia se terá deslocado, sendo ele a celebrar e registar.
 
Mesmo em Torres Vedras, onde não chegaram as tropas francesas, se procuraram abrigos mais a sul, como se constata pelo quadro I. Alguns casos: um rapaz solteiro de Torres Vedras morreu na Quinta do Calvel, porque se «tinha refugiado na ditta Quinta no tempo da invazão do Inimigo». Estava, talvez, junto de familiares, pois era parente de um padre que tinha acabado de falecer também aí[99]. De Olheiros, a norte da vila de Torres Vedras, também se abrigaram na freguesia do Turcifal[100].
 
Esta partida dos habitantes das freguesias prestes a serem dominadas pelos franceses deve ter sido feita numa fase muito próxima à chegada daqueles. Assim, ainda no dia 6 de Outubro se realizou um enterramento na igreja de S. Domingos de Carmões[101]. Segundo o prior da Carvoeira, «No dia nono deste mez de Outubro de mil oittocentos e dez foi a minha fugida deste lugar da Carvoeira; dia em que todo o Povo da Freguezia abandonando suas casas e bens fugiu precipitadamente em consequência da proximidade da invasão das Tropas Inimigas que poucos dias depois entraram e saquearam esta e os outros lugares da Freguesia e os circunvisinhos, donde se retiraram aos 27 dias do mez de Novembro»[102]. A freguesia de Carmões foi invadida no dia 12 desse mês, tendo-se retirado os povos «para dentro das linhas fortificadas do Sobral e doutras terras fortificadas deixando todos suas casas, riquezas, fazendas entre muitas desordens, roubos e desacatos…»[103]. Apesar desta preparação, o pároco deixou várias alusões ao facto da incursão ter sido muito rápida[104]. Se podemos considerar que procurou afincadamente justificar o facto de nem todos terem podido partir e ele não ter ficado a prestar assistência a alguns paroquianos, também não deixamos de colocar a hipótese de este espaço não se encontrar, até aí, na primeira linha das previsões de ocupação, pois também Wellington esperava que os franceses se dirigissem à vila de Torres Vedras.
Mas nem todos se puderam deslocar para o refúgio das Linhas. Foi o caso dos entrevados, que permaneceram nas suas terras sem socorro. Atentemos nalguns casos que nos ficaram nos livros, recordando o quanto sofrimento e angústia se deve ter sentido.
 
No dia 23 de Outubro de 1810, morreu Maria Teresa. Era solteira e morava em S. Domingos de Carmões, «onde ficou intrevada sem que se podese conduzir para dentro da Linha, em rezam da invazam que fizeram os Francezes nesta Freguezia da qual e das mais fugiram todos os povos, em cujo poder faleseo a dita Defunta». D. Rosa Porfíria de Tovar também ficou pela mesma razão: estava viva quando o pároco regressou, mas pereceu pouco depois; igual foi o caso das viúvas Catarina da Conceição e Maria da Conceição. Na Carrasqueira permaneceu Angelina Roza[105] e em Almagra, na freguesia da Carvoeira, Quitéria Maria[106].
 
Não sendo entrevado, António Francisco Moita não se pode transportar «em rezam dos muitos annos»[107].
 
Outros faleceram porque não fugiram a tempo: Manuel Jorge, viúvo, de S. Domingos de Carmões, foi aprisionado pelos franceses «em tempo, que se hia recolhendo para dentro das fortificações»[108]. Foram, aliás, os sobreviventes que deram informações ao pároco da freguesia sobre as mortes dos entrevados quando ele não se encontrava aqui. Esse facto implica a possibilidade de mais pessoas terem aqui permanecido por vontade própria, o que foi mais nítido na Carvoeira: aí ficaram os três assassinados e pelo menos os filhos de um deles - que conseguiram enterrar o seu corpo[109].
 
Como já anotámos noutro local, nem todo o concelho foi afectado da mesma forma pela terceira invasão, tendo sido as freguesias a norte e leste que conheceram a presença militar francesa, na sua totalidade ou numa divisão do espaço paroquial. Assim aconteceu com Dois Portos, S. Domingos de Carmões e Carvoeira.
 
Muitos dos soldados aquartelaram nas igrejas, como sucedeu em S. Domingos de Carmões, apesar do seu pároco considerar que não foi das que mais padeceram, pois até ficou isenta de servir de cavalariça de bestas[110].
 
O resultado foi a destruição. Em Dois Portos foram destroçados os livros de registo paroquial «pela Invasão da Tropa Inimiga»[111] - obrigando a que, mais tarde, se tivessem de realizar alguns instrumentos justificativos[112]. Em S. Domingos de Carmões, apesar do cuidado do respectivo pároco, perderam-se alguns paramentos e desencaminharam-se alguns livros. Aliás, foi o medo que o seu sucessor pensasse que não tinha cuidado adequadamente do património que o levou a deixar todas as informações[113].
 
Mas, mais do que a destruição, esta deverá ter sido zona de medo, de interdição. Por razões que, infelizmente, desconhecemos, na Carvoeira foram assassinados três homens no dia 17 de Outubro: Francisco António, da Serra de S. Julião, António Francisco e António da Costa, ambos do Curvel. O primeiro ficou «exposto ao tempo pela barbaridade dos inimigos e não haver quem se animasse a dar-lhe sepultura eclesiástica». António Francisco também não pode ser inumado cristãmente na igreja, pelo receio de aparecer: foi enterrado furtivamente pelos filhos, na sua terra. O último permaneceu igualmente exposto, até que a evacuação dos franceses permitiu reunir o que ainda restava o corpo, de modo a ser enterrado igualmente no Curvel[114].
 
Muitos ficaram prisioneiros. Nada sabemos sobre a sua situação, apenas da sua existência por referências breves que foram feitas[115].
 
A linha de divisão mostrava-se muito demarcada. Logo a sul da mesma mantinha-se a vida nos seus aspectos quotidianos, embora modificada pela presença de numerosas pessoas. Encontrando-se a povoação de Runa muito próxima do espaço menos protegido pelas dificuldades provocadas pelo vale, continuaram a verificar-se regularmente os enterramentos na sua igreja[116]. Na vizinha freguesia de Matacães também se mantiveram as inumações na igreja[117], enquanto se encontravam refugiados na Quinta da Portucheira[118].
 
Logo a sul dos fortes da Serra da Archeira, as localidades de Orjariça, Mugideira, Casal de Barbas, Turcifal e a quinta do Calvel deverão ter-se tornado alguns dos locais das maiores concentrações de refugiados, considerando os números dos que aí faleceram. Também Matacães se mostrou um local de atracção mesmo para quem provinha de localidades próximas: aí morreram pessoas do Paiol, Amial, Aldeia Grande e Cabanas de Chão[119].
 
Mas, para além destes locais, é possível encontrar a presença de refugiados disseminados por quase todo o concelho, como se constata no quadro I.
Foi diferenciado o retorno aos lares. Alguns talvez tenham tentado regressar num espaço curto. Esse facto explica que mesmo em algumas das freguesias mais atingidas se encontrassem refugiados na época a seguir à evacuação dos franceses. Tomemos alguns exemplos de possíveis regressos: no Ramalhal, uma das freguesias de onde tanta gente saiu para outras vizinhas, já no dia 1 de Dezembro se realizaram enterramentos em S. Lourenço do Amial[120]; aliás, o homem que faleceu em Matacães, no dia 4 de Dezembro, pôde ser transportado para o Ramalhal, onde se encontrou o seu local de sepultura[121].‑A 8 de Janeiro começaram os enterramentos de refugiados: duas crianças, seguidas por outros membros da família nos dias seguintes, para além de outras pessoas das zonas de Aljubarrota, Porto de Mós e Leiria[122].
 
Mas nem todos regressaram imediatamente aos seus lares. O padre da Carvoeira só recolheu à sua paróquia no dia de S. Vicente, 22 de Janeiro de 1811[123]. O seu congénere de S. Domingos de Carmões deixou-nos a informação: ele regressara mais cedo, mas a maior parte dos povos demorou-se dentro das Linhas até ao S. João de 1811, receando que o inimigo tornasse a recuar e invadir[124].
 
Com efeito, os registos mostram-nos a permanência por um espaço de tempo alargado. Por exemplo, em Matacães, no final de Janeiro faleceu uma pessoa do Amial, em Março outra da Aldeia Grande; em Abril, o falecido era de Cabanas de Chão[125]. Em Maio estava no concelho uma viúva de Minde[126]. Neste último mês também se achavam pessoas do bispado de Leiria na freguesia de A-dos-Cunhados[127].
 
Alguns podem ter permanecido por um espaço mais alongado por razões familiares: talvez tenha sido devido à proximidade dos nascimentos dos filhos que dois casais, respectivamente de Cravide (Leiria) e Roliça se mantiveram na Freiria: as crianças nasceram, respectivamente, nos dias 29 de Março e 4 de Junho[128]. No dia 10 de Fevereiro ainda se encontrava no Turcifal um casal da região de Pombal: aqui baptizou o filho nascido em Almeirinhos[129]. Aliás, sendo Turcifal uma das freguesias com maior concentração de refugiados, aqui receberam este Sacramento-várias crianças neste mês de Fevereiro[130].
 
Além da presença de refugiados, o espaço a sul das linhas correspondia igualmente ao do exército luso-britânico. Aquartelaram também nos espaços disponíveis, de onde sobressaíam os templos. Assim aconteceu na freguesia de Dois Portos, onde, pela «Invazaon da Tropa»[131], a capela do Divino Espírito Santo da Ribaldeira serviu muito tempo como paroquial. Só a partir de 6 de Outubro de 1811 se alterou a situação, quando se voltou a baptizar em S. Pedro[132]. No entanto, mesmo nesse tempo continuaram a fazer-se enterramentos na igreja da paróquia[133], a par dos que se faziam em muitas das capelas da freguesia.
 
Na vila, o único templo que manteve o culto foi o da Santa Casa, servindo todas as igrejas paroquiais de quartéis. Como se encontra num dos registos de Baptismo da freguesia de S. Pedro, o sacramento tinha sido recebido na igreja da Misericórdia «por se achar esta Igreja occupada com a tropa»[134]. Da mesma forma, a de S. Tiago ficou impedida «por se achar invadida pelas nossas Tropas para os uzos que as destinarão tudo nesta villa»[135]; ou, noutra versão, «por impedimento que tinha a freguesia por servir de Quartel aos soldados por invasão das Tropas»[136].
 
S. Pedro foi a primeira a regressar às suas funções, passando a acumular aí o cerimonial das outras paróquias da vila: aí «então somente se administravão sacramentos. Por as outras freguezias se acharem occupadas pela Tropa»[137].
 
Gradualmente a situação regressou à normalidade. No dia 26 de Fevereiro já aí eram sepultados falecidos em S. Maria do Castelo[138], mas S. Tiago só passou a ser usado depois de 26 de Maio[139].
 
A interdição das igrejas implicou igualmente a modificação nos enterramentos, que deixaram de poder ser realizados nos espaços dos templos paroquiais. Para além dos respectivos adros, muitos mortos tiveram de ser inumados no cemitério da Misericórdia[140]. Alguns dos falecidos na Quinta do Calvel encontraram o seu último local terreno no convento arrábido do Barro[141]. Noutros muitos casos recorria-se às capelas locais (Orjariça, Fonte Grada…), ou mesmo a freguesias vizinhas. Deste modo, paroquianos de S. Maria do Castelo foram enterrados em S. Pedro da Cadeira[142] e na-igreja velha de S. Lourenço do Ramalhal[143].
Também fora da vila se encontraram situações semelhantes de interdições de templos, levando à procura de espaços alternativos para inumações. No Turcifal, um falecido na Quinta da Chapuceira foi sepultado da ermida dessa quinta «em atenção a esta nesta igreja aquartelada a tropa»[144]. Aliás, para além de casos excepcionais como este e um enterramento no convento do Barro, as inumações passaram a ser feitas no adro até 21 de Março[145]. Tal como nas freguesias urbanas, recorreu-se muito às capelas das localidades mais próximas.
 
Mas a presença do exército aliado significou ainda muita destruição. Para além de outras referências que já têm sido feitas, alguns exemplos ficaram-nos memorizados nos registos paroquiais. Em Monte Redondo, o livro de óbitos terminou abruptamente com a justificação: «No anno de mil oitocentos e onze annos se acabou este livro dos assentos dos defuntos desta fregª do Espirito Santo do lugar de Monte Redondo porque as tropas auxiliares Britanicas, e Espanholas que chegaram estiverão e se demorarão no sobre dito lugar e freg.ª não so a este livro mas a outras mais tirarão o papel que se achava em branco, e outros levarão-nos». A continuação da informação remete o acontecimento para 11 ou 12 de Outubro de 1810[146]. Em S. Maria do Castelo ficou incompleto o último registo de baptismo do livro 4 (realizado em Setembro de 1810). Não há explicações, mas o facto de se encontrarem várias justificações (recuperações dos registos a partir de testemunhos) mais tardias (a partir de 1838[147]) indicia a possibilidade de ter havido destruição.
 
Os registos proporcionam-nos igualmente aspectos humanos do exército, como a deslocação dos militares com as suas famílias. Junto deles mantinham as suas vidas, viam os filhos nascer ou crescer, assistiam à morte. Anotemos alguns exemplos.
 
Ainda antes da invasão, no final de Julho de 1810, foi baptizada Josefa, filha de um soldado artilheiro e de Francisca Inácia[148]. No dia 15 de Dezembro de 1810, em Matacães, recebeu o Sacramento o filho de um soldado granadeiro do regimento de Cascais[149]; alguns dias foi a vez de uma criança que já nascera na mesma freguesia: a mãe era de Maiorca e, segundo diziam, apesar de casada, coabitava no momento com um soldado do regimento e cabo de tambores[150]. Encontrando-se um regimento em Varatojo, aí moravam também os familiares de diversos soldados, pelo que os filhos de dois deles foram baptizados em S. Pedro[151]. No Turcifal, baptizaram-se igualmente algumas crianças nas mesmas circunstâncias[152].
 
Frequentemente estes baptizados de familiares de membros do exército tinham outros militares como padrinhos.
 
Num espaço de múltiplos encontros, entre gente da terra, refugiados e militares, era natural o contacto e a aproximação. Deste modo, no dia 12 de Maio de 1811, em Santa Maria, casou-se uma rapariga natural de A-dos-Cunhados com um soldado de milícias, viúvo originário do termo de Óbidos, ficando o casal a viver no Bairro da Costa, na vila[153]. No ano seguinte, matrimoniaram-se um soldado algarvio e outra rapariga do concelho[154].
 
Igualmente os óbitos deixaram marcas nestas famílias: Rosa, mulher de um soldado, morreu na Mugideira[155], o mesmo sucedendo ao filho do Comissário de Brigada[156]. Por vezes eram os próprios militares que aqui faleciam: assim sucedeu com vários soldados, sobretudo na freguesia do Turcifal[157], e com o almocreve do batalhão de Caçadores[158].
 
Houve aspectos da vida militar, como a morte de um soldado em viagem: no dia 21 de Dezembro de 1821, em Matacães foi sepultado um soldado que perecera em frente dessa igreja paroquial, quando vinha do Hospital de Lisboa para o seu quartel de Torres Vedras[159].
 
Diferente foi o sucedido com o soldado Adão Polónio: foi «espingardado» pelo seu regimento no dia 19 de Dezembro, junto à Ordasqueira. Encomendado pelo pároco, foi sepultado na igreja de Matacães[160].
 
Este foi o tempo da desorganização do quotidiano. Num espaço diferentemente ocupado, entre partidas e chegadas, entre soldados aquartelados e inimigos próximos, entre dificuldades de abastecimentos e destruições, também os registos paroquiais nos testemunham, desde logo, a interrupção das funções habituais. Em Matacães não se realizaram baptismos durante o tempo da presença francesa[161].
 
Nas freguesias ocupadas pelos gauleses, frequentemente adiavam-se estes sacramentos, que noutras circunstâncias se realizariam pouco tempo depois do nascimento. No Maxial só a 17 de Janeiro de 1811 foi baptizada uma criança que já tinha nascido em Setembro; alguns dias depois, foi a vez de outra nascida em Novembro; a 24 de Fevereiro realizou-se o do que tinha vindo ao mundo a 4 de Outubro[162]. Só em Abril foram solenemente postos aos Santos Óleos a uma criança que tinha sido baptizada em casa, por necessidade, a 5 de Setembro[163]. Em S. Domingos de Carmões, a criança nascida no dia 6 de Setembro foi baptizada em perigo de vida a 7 de Outubro por um conventual do convento da Merceana, mas permaneceu sem os Santos Óleos até 11 de Abril, devido à «emigraçam que fizeram todos os Povos para dentro das fortificações»[164]. Não foi a única: outra criança, igualmente nascida a Setembro, esteve nas mesmas circunstâncias até Junho de 1811[165].
 
Vários são igualmente os casos de maior distância temporal entre o nascimento e o baptismo ocorridos na Carvoeira. Um dos mais espaçados terá sido o da criança que, nascida a 4 de Outubro de 1810, foi baptizada pelo prior no dia 9, «quasi na acção da fugida dos Inimigos»; só em 25 de Agosto do ano seguinte foi terminado o cerimonial[166]. Noutro caso, a criança cuja nascença ocorreu-no dia 8 de Outubro foi baptizada de urgência por um sacerdote «que hia fugindo dos Inmigos»; só recebeu os Santos Óleos em Julho[167].
 
Parece que, no entanto, terá sido a morte a manter alguma normalidade: em Matacães, apesar da proximidade dos franceses, no dia 12 de Novembro houve um enterramento com acompanhamento de dois padres e da Irmandade do Santíssimo e Almas, indo o falecido amortalhado no hábito de S. Francisco[168].
 
Outro aspecto que poderá certamente relacionar-se com os efeitos da invasão é o que nos traz a realidade dos expostos. Fruto das dificuldades, das carências, ou talvez de relacionamentos cujas consequências não se pretendiam, o momento das invasões correspondeu ao aumento do número de crianças expostas e apresentadas pelas rodeiras para serem baptizadas na freguesia de S. Pedro. A evolução nesta paróquia, tomada como exemplo, verifica-se no quadro II.
 
Quadro II - Expostos baptizados em S. Pedro (1802-1814)
 
Ano
Número
1802
2
1803
1
1804
1
1805
1
1806
 
1807
2
1808
1
1809
7
1810
1
1811
11
1812
1
1813
 
1814
 
 
 
O ano de 1809 marcou já um acréscimo muito grande relativamente ao que se tinha verificado nos anos anteriores. No ano de 1811 aumentaram ainda estes números, distanciando-se muito da situação anterior às invasões.
 
Desorganização também entre os que permaneceram, os que acolheram, os que receberam em suas casas muitos dos que aqui chegavam vindos de tantos lados. Na casa de João Carneiro, do Turcifal, morreu um expatriado chamado Luís, de quem nem se sabia o sobrenome nem a naturalidade[169]. Deixa-nos a ideia de que se acolhia quem vinha, quem precisava. Como? No seio da boa fraternidade cristã ou a troco de pagamento material?
 
Por outro lado, o refazer da vida quando tal era possível. Vindas da região de Leiria, «pella invazão dos Francezes se refugiarão no lugar da Mongideira» um casal matrimoniou-se aqui, consentido pelo Bispo de Leiria[170].
 
A Terceira invasão foi simultânea de uma doença contagiosa alargada a várias regiões do país. De imediato os registos dos clérigos mais esclarecedores dão conta dos que faleceram sem Sacramentos porque a doença não deu tempo[171]. A análise numérica dos óbitos do concelho, observada numa evolução de vinte anos, também nos revela uma crise de mortalidade nesta fase.
 
Releve-se, primeiramente, a possibilidade de muitos registos terem deixado de ser feitos: alguns párocos não dispunham, no momento, do respectivo livro, guardado para sua maior segurança, destruído ou ainda não aberto por razões burocráticas; outros, pela ausência, só puderam assentar mais tarde, muitas vezes de forma incompleta ou for a de ordem[172].‑Além disso importa também assinalar alguns casos específicos, que poderão condicionar a sua leitura. S. Tiago correspondia a uma situação excepcional pela integração do hospital da Santa Casa da Misericórdia na sua área geográfica, o que levava à contabilização de elevado número de óbitos na primeira destas décadas. Todavia, na fase das invasões verificou-se uma alteração, passando a integrar apenas os mortos da freguesia, o não revela suficientemente o acréscimo em 1810-11. Também em Dois Portos há que realçar o facto de ter desaparecido o livro anterior ao final de 1810, impedindo-nos a percepção da evolução desde o início do século.
 
Algumas das reduções verificadas entre 1809 e 1810 poderão dever-se, talvez, ao facto de muitas pessoas terem procurado paragens mais seguras quando se adivinhava a aproximação dos franceses. Os anos seguintes, porém, foram de muito maiores alterações.
 
 
Quadro III - Número de óbitos em várias freguesias de concelho (1800-1820)
 
 
É notório o aumento da mortalidade entre 1810-1811 na maior parte das freguesias. No Turcifal, onde no primeiro destes anos já se registaram mais 25 mortes do que em 1809, teve grande crise de mortalidade em 1811, quando se contaram mais 110 casos do que em 1810. Depois disso os números voltaram a diminuir para valores não muito distantes dos que se verificavam antes das invasões. Em S. Pedro, onde também aconteceu uma subida considerável no número de mortes, esses aumentos foram, respectivamente, de 6 e 105; no Ramalhal, 15 e 56; em S. Pedro da Cadeira, 4 e 47, etc.
 
Ponte do Rol pode ser considerada um caso à parte. Freguesia muito pequena, deveria também ser das mais inatingíveis nas condições meteorológicas já descritas. Assim, consideramos a hipótese de a redução do número de mortos nestes anos se ter ficado a dever à conjugação do número de pessoas que daqui saíram com a falta de procura da mesma pelos refugiados.
 
Mas uma análise mais apurada, como nos permite o quadro IV, revela-nos uma grande diferença na distribuição ao longo dos dois anos.
 
Constata-se que foi no terceiro trimestre de 1810 e primeiro semestre de 1811 que ocorreu esta alteração substancial. No Turcifal, onde se contabilizaram enterramentos ao longo de todos os meses de 1810, estes aumentaram a partir de Outubro, num crescendo até Fevereiro. Apesar de, a partir daí, o número diminuir gradualmente, continuaram a verificar-se números consideráveis de falecimentos nos meses seguintes. Pela concentração de refugiados, como já foi verificado, começou por ser uma das mais atingidas.
 
Mas em quase todas as freguesias se fez sentir o aumento da mortalidade nesta época, embora em fases diferentes. A maior incidência ocorreu em Janeiro nas freguesias imediatamente ligadas ao Turcifal, como S. Maria e S. Tiago. De imediato se estenderam a Runa, Dois Portos, a seguir S. Pedro, S. Pedro da Cadeira, A-dos-Cunhados, para continuar nos meses seguintes. É nítido que, para além do aumento geral da mortalidade, se assiste a uma progressão geográfica de sul para norte, pela transmissão contagiosa e, provavelmente também, com o regresso de muitas pessoas aos seus lares, aqui no concelho ou bem mais a norte, como se verificou atrás. Em prováveis alojamentos precários, em condições alimentares talvez difíceis, tornavam-se bons transmissores da doença.
 
Com efeito, muitos dos falecidos nestas freguesias provinham de longe. Em A-dos-Cunhados, por exemplo, entre 16 e 28 de Março registaram-se quatro óbitos de Leiria, um de Porto de Mós, vários de Coimbrã.
 
Quadro IV - Número de óbitos em várias freguesias de concelho em 1810 e 1811 - distribuição por meses
 
 
 
Para além dos números, observa-se em muitos casos uma coincidência de óbitos no seio da mesma família. Vejamos alguns.
 
Em Matacães, nos dias 16 e 21 de Fevereiro morreram uma mãe mãe e o filho provenientes de Cravide[173]. No dia 28 de Fevereiro foi sepultado, em A-dos-Cunhados, Manuel de Brito, da mesma terra, e no dia seguinte a sua filha[174]; em Março pereceu uma mulher de Coimbrã de Cima e dois dias depois a sua filha[175]; um casal em 12 e 19 Fevereiro; as crianças filhas de uma mulher que morrera a 5 de Fevereiro faleceram depois, uma no dia 14 desse mês, outra a 1 Março[176]. Em Runa feneceram dois irmãos em dois dias seguidos[177]; depois, um homem e o seu filho no espaço de poucos dias[178].‑Em A-dos-Cunhados, entre 8 e 11 de Janeiro, morreram a mãe e quatro filhos[179].
Para além da proximidade da família, a contiguidade da relação de vizinhança deve ter-se mantido aqui. Muitos dos finados em datas muito próximas eram da mesma proveniência geográfica.
 
Espaço de encontro e desencontro, as invasões foram época de desorganização e angústia: a destruição, o medo do inimigo, o receio da doença. A fuga e o regresso; as presenças e os novos encontros. Foi isso que procurámos ao analisar esta fonte complementar dos muitos estudos feitos.
 
 

 


*      Licenciada em História pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e Mestre em História do Século XX pela mesma instituição. Professora da Escola Secundária com 3.º Ciclo Henriques Nogueira. Publicou diversos artigos/capítulos de livros e apresentou diversas comunicações em reuniões científicas, destacando-se os temas relacionados o período do final da Monarquia à Ditadura Militar. Entre estes salientam-se os que se referem a questões coloniais, particularmente Macau. Outro dos elementos preponderantes das suas investigações é a história de Torres Vedras. Integra o Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa.
 
 
[1] A designação com que passou à história - Convenção de Sintra, deve-se ao local da sua confirmação. Mas algumas vozes defendem que deveria chamar-se Convenção de Torres Vedras. Veja-se, entre outros, André Filipe Vítor Melícias (2008), As linhas de Torres Vedras: construção e impacto locais, Torres Vedras, Câmara Municipal, Livraria Livrododia, A.F.V.M.
[2] Célia Reis (2009) «Torres Vedras e as guerras peninsulares: alguns aspectos», Turres Veteras XI: A Guerra Peninsular, Torres Vedras, Edições Colibri, Câmara Municipal de Torres Vedras, Instituto Alexandre Herculano, pp.169-188.
[3] Os registos paroquiais de Torres Vedras encontram-se no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Arquivo Distrital de Lisboa,, e foram consultados on-line na sua quase totalidade (referência PT/ADLSB/PRQ/PTVD). Para abreviar a apresentação, indicamos apenas o nome da freguesia e respectivo livro.
[4] S. Pedro, Baptizados, B8, fl. 1.
[5] S. Miguel, Baptizados, livro B5, fl. 75v.
[6] S. Pedro, Baptizados, B8, fl. 7.
[7] S. Pedro, Baptizados, B8, fl. 7v.
[8] Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 169.
[9] Runa, Óbitos, livro O3, fl. 28v.
[10]  S. Pedro, Óbitos, livro O4, fl. 128v.
[11]  Carmões, Baptismos, livro B4, fl. 1.
[12]  S. Tiago, Baptismos, livro B5, fl. 39v. A mesma situação em S. Tiago, Óbitos, livro O4, fl. 179v.
[13]  Carmões, Óbitos, livro O2, fl. 87.
[14]  Carvoeira, Óbitos, livro O4, fl. 87.
[15]  Matacães, Óbitos, O3, fls. 81v, 87.
[16]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fl. 78v.
[17]  Ramalhal, Óbitos, livro O2, fl. 65.
[18]  Matacães, Óbitos, O3, fl.85, Ramalhal, Óbitos, livro O2, fl. 64v.
[19]  Por exemplo, Ramalhal, Óbitos, livro O2, fl. 65.
[20]  S. Pedro, Baptismos, B8, fl. 31v.
[21]  S. Pedro, Óbitos, livro O4, fl.  143.
[22]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 186.
[23]  S. Pedro, Baptismos, B8, fl. 31v.
[24]  S. Pedro, Baptismos, B8, fl. 32.
[25]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 186v.
[26]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 191.
[27]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 185.
[28]  Matacães, Óbitos, O3, fl. 83.
[29]  Matacães, Óbitos, O3, fl. 88.
[30]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 183.
[31]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 188v.
 
[32]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3.
[33]  S. Mamede da Ventosa, Baptismos, livro B9, fl. 18.
[34]  Turcifal, Baptismos, B9, fls. 115-115v.
[35]  Matacães, Óbitos, O3, fl. 79.
[36]  S. Maria do Castelo Óbitos, livro O3, fl. 78v.
[37]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fl. 79.
[38]  S. Maria do Castelo Óbitos, livro O3, fl. 78v.
[39]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 189.
[40]  Freiria, Baptismos, B5, fl. 151v.
[41]  Runa, Óbitos, O, fl. 36.
[42]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 191.
[43]  São Pedro  da Cadeira, Baptismos, livro B8, fl. 134v.
[44]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fls. 185-185v.
[45]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fls. 186, 188v.
[46]  Turcifal, Baptismos, B9, fl. 115.
[47]  Runa, Óbitos, O, fls. 34v, 35v- 36v.
[48]  Ramalhal, Óbitos, livro O2, fls. 67v, 69.
[49]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 189v.
[50]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 189.
[51]  A-dos-Cunhados, Óbitos, livro O2, fl. 57v.
[52]  Matacães, Óbitos, O3, fl. 88.
[53]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 186v.
[54]  S. Miguel, Óbitos, livro O3, fl. 26.
[55]  Ramalhal, Óbitos, livro O2, fls. 67- 67v.
[56]  A-dos-Cunhados, Óbitos, livro O2, fl. 61v.
[57]  A-dos-Cunhados, Óbitos, livro O2, fl. 57v.
[58]  Matacães, Baptismos, B6, fls. 71v, 84v.
[59]  S. Maria do Castelo Óbitos, livro O3, fl. 79v.
[60]  Freiria, Baptismos, B5, fl. 150v.
[61]  Ramalhal, Óbitos, livro O2, fl. 67v.
[62]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 183.
[63]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 187v.
[64]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 189.
[65]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fls. 189, 190.
[66]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fls.189v, 190v, Turcifal, Baptismos, B9, fl. 122v.
[67]  A-dos-Cunhados, Óbitos, livro O2, fl. 63.
[68]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fl. 81.
[69]  Monte Redondo, Óbitos, O1, fl. 42v.
[70]  S. Pedro, Óbitos, livro O4, fl. 143v.
[71]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 188.
[72]  A-dos-Cunhados, Óbitos, livro O2, fls. 58, 60v.
[73]  Ramalhal, Óbitos, livro O2, fl. 68.
[74]  S. Pedro, Baptismos, B8, fl. 36.
[75]  A-dos-Cunhados, Óbitos, livro O2, fls. 58v, 59, entre outras
[76]  S. Pedro, Óbitos, livro O4, fl. 143v.
[77]  Turcifal, Baptismos, B9, fl. 119v.
[78]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 187v.
[79]  S. Pedro, Óbitos, livro O4, fl. 154v.
[80]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 189v.
[81]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 187v.
[82]  Turcifal, Baptismos, B9, fl. 120.
[83]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 187v, Turcifal, Baptismos, B9, fl. 118v.
[84]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fl. 80v.
[85]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fls. 80, 82.
[86]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 190.
[87]  Turcifal, Baptismos, B9, fl. 119v.
[88]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 181v.
[89]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 186.
[90]  S. Pedro, Baptismos, B8, fl. 32v.
[91]  Turcifal, Baptismos, B9, fl. 120.
[92]  Monte Redondo, Óbitos, O1, fl. 41v.
[93]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 180v.
[94]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 181.
[95]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 182.
[96]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fls. 182, 185v.
[97]  Por exemplo, Ramalhal, Óbitos, livro O2, fl. 65, Baptismos, B4, s/ fl. (primeiras folhas)
[98]  Ramalhal, Baptismos, livro B4, s/ fl.
[99]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fl. 81.
[100]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 181.
[101]  Carmões, Óbitos, livro O2, fl. 86v.
[102]  Carvoeira, Baptismos, livro B6, fl. 86.
[103]  Carmões, Baptismos, livro B4, fl. 1.
[104]  Entre outros, Carmões, Óbitos, livro O2, fls. 86v- 87, 88.
[105]  Carmões, Óbitos, livro O2, fls. 86v-87,
[106]  Carvoeira, Óbitos, livro O4, fl. 87.
[107]  Carmões, Óbitos, livro O2, fl. 88.
[108]  Carmões, Óbitos, livro O2, fl. 87v.
[109]  Carvoeira, Óbitos, livro O4, fls. 86-86v.
[110]  Carmões, Baptismos, livro B4, fl. 1.
[111]  Dois Portos, Mistos, livro M1, fl. 2v.
[112]  Dois Portos, Mistos, M1, fl. 2v.
[113]  Carmões, Baptismos, livro B4, fl. 1.
[114]  Carvoeira, Óbitos, livro O4, fl. 86v.
[115]  Por exemplo, Carmões, Óbitos, livro O2, fl. 87v.
[116]  Runa, Óbitos, livro O3, fls. 30-32.
[117]  Matacães, Óbitos, O3, fl. 79.
[118]  Matacães, Óbitos, O3, fl. 79.
[119]  Matacães, Óbitos, O3, fls. 83, 85, 87 e 88.
[120]  Ramalhal, Óbitos, livro O2, fl. 64v.
[121]  Ramalhal, Óbitos, livro O2, fl. 64v.
[122]  Ramalhal, Óbitos, livro O2, fls. 67-68.
[123]  Carvoeira, Baptismos, livro B6, fl.86.
[124]  S. Domingos de Carmões, Baptismos, livro B4, fl. 2.
[125]  Matacães, Óbitos, O3, fls. 83, 85, 87 e 88.
[126]  Matacães, Óbitos, O3, fl. 88.
[127]  A-dos-Cunhados, Óbitos, livro O2, fl. 63.
[128]  Freiria, Baptismos, B5, fls. 150v-151v.
[129]  Turcifal, Baptismos, B9, fl. 118.
[130]  Turcifal, Baptismos, B9, fls. 119-119v.
[131]  Dois Portos, Baptismos, B4, fls. 5v., entre outros.
[132]  Dois Portos, Baptismos, livro B4, fl. 5v.
[133]  Dois Portos, Óbitos, O3, vários fls.
[134]  S. Pedro, Baptismos, livro B8, fl. 31v.
[135]  S. Tiago, Baptismos, livro B5, fl. 41.
[136]  S. Tiago, Óbitos, livro O4, fl. 181v.
[137]  S. Miguel, Baptismos, livro B5, fl. 102.
[138]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fl. 80.
[139]  S. Tiago, Baptismos, livro B6, fl. 2.
[140]  Em S. Maria do Castelo aconteceu após 5 de Novembro. S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fl. 78v.
[141]  Por exemplo, S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fl. 80.
[142]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fl. 80.
[143]  S. Maria do Castelo, Óbitos, livro O3, fls. 80, 83v.
[144]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 186v.
[145]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 189v.
[146]  Monte Redondo, Óbitos, O1, fl. 43v.
[147]  S. Maria do Castelo, Baptismos, B4, fls. 169 e seg.
[148]  S. Miguel, Baptizados, livro B5, fl. 99v.
[149]  Matacães, Baptismos, B6, fl. 69.
[150]  Matacães, Baptismos, B6, fl. 69v.
[151]  S. Pedro, Baptismos, B8, fls. 34v-35.
[152]  Turcifal, Baptismos, B9, fl. 115v.
[153]  S. Maria do Castelo do Castelo, Casamentos, C2, fl. 86.
[154]  S. Pedro, Casamentos, livro C4, fl. 32.
[155]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 181v.
[156]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fls. 182v-183.
[157]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fls.183v, 186-187v.
[158]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 187.
[159]  Matacães, Óbitos, O3, fl.81v.
[160]  Matacães, Óbitos, O3, fl. 80v.
[161]  Baptismos, B6, fls. 69v-69.
[162]  Maxial, Baptismos, B1, fl. 194v.
[163]  Maxial, Baptismos, B1, fl. 195.
[164]  Carmões, Baptismos, livro B4, fl. 2v.
[165]  Carmões, Baptismos, livro B4, fl. S/ind.
[166]  Carvoeira, Baptismos, livro B6, fl. 88v.
[167]  Carvoeira, Baptismos, livro B6, fl. 88.
[168]  Matacães, Óbitos, O3, fl. 79.
[169]  Turcifal, Óbitos, livro O6, fl. 185.
[170]  Turcifal, Casamentos, C6, fl. 8.
[171]  Por exemplo, S. Maria do Castelo Óbitos, livro O3, fl. 78v.
[172]  Alguns exemplos: Maxial, Baptismos, B1, fl. 194v, S. Maria do Castelo Óbitos, livro O3, fls.83v-84. S. Tiago, Baptismos, livro B6, fl. 1v, Carvoeira, Óbitos, livro O5, fl. 2.
[173]  Matacães, Óbitos, O3, fls. 84v- 85.
[174]  A-dos-Cunhados, Óbitos, livro O2, fl. 57v.
[175]  A-dos-Cunhados, Óbitos, livro O2, fls. 58v-59.
[176]  Runa, Óbitos, livro O3, fls. 34-35v.
[177]  Runa, Óbitos, O, fls. 36-36v
[178]  Runa, Óbitos, O, fs. 36v-37.
[179]  Ramalhal, Óbitos, livro O2, fls. 67-67v.
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by CMG Armando Dias Correia